
Financiamento é o grande assunto para acompanhar em 2025
Há mais de 20 anos o WRI realiza o Stories to Watch, que reúne as grandes histórias do ano para acompanhar na agenda de clima e desenvolvimento. Selecionamos os grandes momentos, questões e decisões do ano que acreditamos que irão definir a trajetória do mundo. No passado, destacamos diversos temas como o calor extremo nas cidades, as eleições importantes e os seus efeitos na geopolítica, a reforma dos sistemas alimentares e muitos outros.
Este ano foi diferente. Não são histórias para acompanhar em 2025. É apenas uma, que afeta tudo, desde a ação climática à conservação da natureza e aos direitos humanos. É uma história que muitas vezes passa despercebida, apesar das vastas implicações para o futuro da vida como conhecemos.
Stories to Watch 2025
O grande assunto para acompanhar em 2025 é o financiamento climático – este ano será um termômetro para a capacidade do mundo de entregar na escala necessária.
2025 é o ano para nos preocuparmos com o financiamento do clima e da natureza
Na 29ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP29) os países ricos concordaram, pela primeira vez em 15 anos, em aumentar o montante de dinheiro que disponibilizam para a mitigação e adaptação às mudanças climáticas nos países em desenvolvimento. A nova meta – US$ 300 bilhões de dólares por ano até 2035 – é melhor do que a anterior de US$ 100 bilhões até 2020. Só que isso ainda é muito distante do necessário. É por isso que os países também concordaram que todos devem trabalhar em conjunto para mobilizar US$ 1,3 trilhão por ano até 2035.
No US$ 1,3 trilhão está incluída a diferença entre o que os países em desenvolvimento podem realisticamente mobilizar internamente para a transição da economia e o que será necessário a partir de fontes externas. Será extremamente difícil assegurar o US$ 1,3 trilhão. Mas não se engane: nós temos que fazer.
Sabemos o que acontecerá sem financiamento climático adequado: as comunidades com menos recursos sofrerão mais com secas, inundações, incêndios florestais e ondas de calor cada vez mais devastadores, apesar de serem as que menos contribuíram para causar o problema. É por isso que alcançar o US$ 1,3 trilhão não é apenas sobre finanças – trata-se de justiça.
Também sabemos que, sem reduções significativas das emissões de todos os países — ricos e em desenvolvimento igualmente — o mundo não atingirá suas metas de descarbonização, expondo todos à crise existencial das mudanças climáticas. O financiamento dos países mais ricos para os países em desenvolvimento não é caridade; é um investimento em um mundo mais seguro.
Por fim, ambição e financiamento são duas faces da mesma moeda. Não se pode implementar políticas climáticas e ambientais ambiciosas sem os recursos financeiros necessários para executá-las. Financiamento e ambição formam um ciclo virtuoso — e este é o ano para destravar ambos.
Portanto, vamos explorar o que é necessário para alcançar a meta de US$ 1,3 trilhão e o que acompanhar ao longo do ano para avaliar se isso está avançando.
1) Para que servirá o dinheiro?
Em resumo, os US$ 1,3 trilhão devem apoiar dois objetivos: aumentar a resiliência dos países em desenvolvimento e garantir seu crescimento de baixo carbono.
Os impactos das mudanças climáticas estão se tornando cada vez mais caros e perigosos, mas os riscos não são distribuídos de maneira uniforme. As nações mais vulneráveis — aquelas com menos recursos para responder — deverão enfrentar mais de meio trilhão de dólares em danos climáticos a cada ano a partir de 2030. Enquanto isso, o financiamento para adaptação continua insuficiente, com um déficit de US$ 360 bilhões anuais entre o necessário e o disponível. Do financiamento para adaptação que está ocorrendo, menos de um quinto chega às comunidades que mais precisam.

Isso precisa mudar.
Ao mesmo tempo, tanto os países de baixa renda quanto os emergentes precisam de apoio para deixar pra trás os combustíveis fósseis enquanto criam empregos e melhoram a qualidade de vida. As transições para uma economia de baixo carbono trazem benefícios significativos, como ar mais limpo e segurança energética. No entanto, será necessário financiamento para garantir que essas mudanças ocorram na velocidade e escala necessárias, beneficiando a todos — inclusive aqueles que hoje trabalham na indústria fóssil. Segundo a Agência Internacional de Energia, os investimentos no setor de energia limpa nos países em desenvolvimento precisam aumentar cerca de sete vezes até 2035.
Algumas questões para acompanhar durante o ano permitirão avaliar se o mundo está alcançando esses dois objetivos do financiamento climático:
- Na COP30, os países se comprometerão a pelo menos dobrar a financiamento para adaptação de US$ 40 bilhões para US$ 80 bilhões por ano?
- O fundo de Perdas e Danos estabelecido em 2023 começará a distribuir os recursos?
- Como parte do Acordo de Paris, os países se comprometeram a submeter novos planos climáticos nacionais (NDCs, na sigla em inglês) em 2025. Esses planos terão metas ambiciosas de mitigação e adaptação? E vão incluir planos claros de investimento?
2) De onde virá o dinheiro?
US$ 1,3 trilhão pode parecer muito, mas quando colocado em perspectiva, não é tanto assim: considerando a taxa média de crescimento anual do PIB global de 2,8% (segundo o FMI), esse valor representa menos de 1% do PIB projetado para 2035.
A meta de US$ 300 bilhões para o financiamento climático pode ser alcançada de três maneiras: bilateralmente, quando países doadores fornecem recursos diretamente aos países beneficiários; multilateralmente, por meio de bancos multilaterais de desenvolvimento (BMDs) como o Banco Mundial e fundos climáticos multilaterais, como o Fundo Verde para o Clima; e por meio de mobilização de financiamento privado. É essencial que uma parte significativa desse financiamento seja concedida na forma de subsídios, financiamento concessional e empréstimos de baixo custo, para não aumentar a dívida das nações vulneráveis, muitas das quais já enfrentam dificuldades financeiras. A reestruturação da dívida e o perdão da dívida também são fundamentais para que os US$ 300 bilhões anuais tenham o máximo impacto.
Sair de US$ 300 bilhões para US$ 1,3 trilhão será muito mais difícil, mas é possível se várias peças do quebra-cabeça se encaixarem. O aumento de capital dos BMDs, que são muito eficazes em transformar US$ 1 de dinheiro público em US$ 4 a US$ 10, é um bom primeiro passo. Além disso, taxações sobre setores poluentes, como aviação, transporte marítimo e petróleo, poderiam adicionar mais de US$ 200 bilhões. Fontes inovadoras de financiamento, como trocas de dívida por natureza ou mercados de carbono, serão desafiadoras, mas essenciais. E pelo menos metade dos US$ 1,3 trilhão precisará vir do setor privado.

O progresso neste ano será medido por alguns fatores:
- Os países membros aumentarão seu financiamento para os bancos em desenvolvimento, apesar dos desafios políticos?
- O conceito de taxações internacionais ganhará força? A Organização Marítima Internacional está considerando uma taxa de carbono sobre o transporte marítimo, enquanto países como Quênia, Barbados, França e Brasil criaram uma força-tarefa para analisar possíveis taxações internacionais.
- Os líderes aproveitarão a Conferência sobre Financiamento para o Desenvolvimento, em junho, para avançar na reforma financeira global e integrar os financiamentos para o clima, a natureza e o desenvolvimento?
- O novo congelamento do governo dos EUA sobre quase toda a assistência externa, incluindo todo o financiamento climático, será de fato implementado? E quais serão as repercussões?
3) Como mobilizar o capital privado?
Mesmo que especialistas concordem que metade dos US$ 1,3 trilhão precisa vir de capital privado, será difícil direcionar esse montante para os lugares certos. Investimentos de baixo carbono em países em desenvolvimento ainda são considerados arriscados e caros. Por exemplo, um projeto solar na Alemanha exigiria um retorno sobre o capital próprio de 8%, enquanto o mesmo projeto na Zâmbia exigiria 51%. Embora instituições como o Banco Mundial utilizem instrumentos financeiros, como garantias, para “reduzir o risco” desses investimentos, elas simplesmente não podem ser aplicadas a um volume de mais de US$ 700 bilhões por ano em financiamento climático privado até 2035.
A chave, portanto, é utilizar políticas públicas inteligentes para destravar os níveis necessários de investimento privado.
Já vimos alguns exemplos disso, como a política industrial verde da China, a Lei de Redução da Inflação dos EUA e a expansão da energia limpa na Índia. A Índia estabeleceu metas ambiciosas para energias renováveis e um roteiro claro, subsidiou o transporte elétrico e a infraestrutura de recarga, investiu recursos públicos significativos em energia renovável e desenvolveu instrumentos financeiros inovadores, como títulos verdes – tudo isso aumentando a confiança do setor privado nos investimentos de baixo carbono. Esse tipo de medida, assim como parcerias público-privadas, é essencial para reduzir riscos e atrair capital privado.
Sinais para acompanhar este ano incluem:
- Veremos o surgimento de mais “plataformas nacionais”, iniciativas lideradas pelos países que buscam alinhar capital público e privado em torno de investimentos prioritários para o clima e a natureza? A Colômbia foi o mais recente país a lançar uma plataforma desse tipo — outras nações seguirão esse caminho?
- A reação contra iniciativas ESG, como a Net-Zero Banking Alliance, desacelerará os investimentos climáticos, ou o aumento do número de metas nacionais de emissões líquidas zero e de exigências de divulgação de riscos climáticos para empresas impulsionará os investimentos verdes?
- Veremos avanços em conferências futuras, como a Finance for Development e a Finance in Common Summit? Resultados positivos incluiriam uma reavaliação de como os riscos de investimento são calculados, além de bancos de desenvolvimento adotando investimentos relacionados ao clima e à natureza como sua missão central.
4) O que financiará o futuro da natureza?
Não podemos combater as mudanças climáticas sem proteger a natureza. Árvores, solos saudáveis e oceanos sequestram grandes quantidades de dióxido de carbono. Florestas preservadas regulam as chuvas, reduzem a erosão, fornecem água limpa e sustentam muitos outros serviços ecossistêmicos. Algumas estimativas indicam que impressionantes 55% do PIB global dependem da natureza.
No entanto, os incentivos econômicos continuam impulsionando a destruição dos ecossistemas. De acordo com o Global Forest Watch, do WRI, o mundo perde o equivalente a 10 campos de futebol de floresta tropical primária a cada minuto.
É aqui que a inovação financeira mencionada anteriormente pode desempenhar um papel crucial.
Sim, as economias atualmente valorizam mais a destruição da natureza do que sua preservação. Mas a criatividade financeira pode mudar isso. Por exemplo, a proposta do Fundo Global Florestas Tropicais para Sempre (FFTS) pagaria aos países US$ 4 por cada hectare de floresta preservado, enquanto os taxaria em US$ 400 por cada hectare destruído. Idealizada pelo governo brasileiro e pelo Banco Mundial, a iniciativa utilizaria um investimento inicial de US$ 25 bilhões de países ricos e fundações filantrópicas para atrair mais US$ 100 bilhões em financiamento privado. Todos os investidores teriam um retorno após 20 anos, que seria ligeiramente superior ao de um título do governo.
E esse é apenas um exemplo. Inovações como bancos de terras, trocas de dívida por natureza, mercados de carbono — todas acompanhadas de melhores políticas, padrões e regulamentações — podem direcionar os recursos financeiros necessários para a conservação da natureza, o que é benéfico para as pessoas e para o clima.
Áreas a serem observadas neste ano:
- A iniciativa FFTS passará de ideia à realidade?
- Os líderes dos países retornarão à conferência da ONU sobre biodiversidade em fevereiro e irão negociar um acordo global de financiamento para a natureza?
- Novos padrões de integridade e o aumento do apoio governamental fortalecerão a confiança dos investidores em mercados de carbono de alta qualidade?
- As trocas de dívida por natureza, onde países ricos e instituições perdoam a dívida de países em troca de conservação, se tornarão mais comuns? O Equador está utilizando uma medida desse tipo para proteger o Parque Nacional Galápagos, prometendo gastar US$ 17 milhões em conservação nos próximos 18 anos em troca do perdão da dívida.
- Mais governos irão redirecionar subsídios agrícolas prejudiciais para práticas que favoreçam a natureza, como recentemente fizeram Dinamarca e Reino Unido?
Mobilizando o Financiamento para o Clima e a Natureza
Espero que tenha ficado claro por que é essencial mobilizar US$ 1,3 trilhão para a ação climática em países em desenvolvimento. Mas isso certamente não é algo garantido. Embora cada um dos elementos dos US$ 1,3 trilhão possa alavancar e mobilizar outro, hoje, as diferentes partes são regidas por regimes completamente diferentes. Conseguir que elas se unam como um quebra-cabeça coeso será difícil.
Por isso, a maior questão a ser observada em 2025 é como o mundo reunirá todos esses componentes — especialmente em fóruns chave como a cúpula climática da ONU e as reuniões do G20. Para alcançar a máxima alavancagem e eficiência, precisamos utilizar todas as fontes de financiamento e fazer com que elas trabalhem juntas como um sistema. Isso exigirá o envolvimento profundo dos ministros da Fazenda — e até mesmo dos chefes de Estado — de países ao redor do mundo.
Ao entrarmos em 2025, está claro que nossos sistemas financeiros devem ser reimaginados para enfrentar as mudanças climáticas, proteger a natureza e melhorar a vida das pessoas. Essa transformação não será fácil, mas existem muitas ferramentas para nos levar até lá. Ao exigir passos ousados de nossos líderes, alavancar recursos para gerar o máximo impacto e aproveitar a inovação, temos o poder de desbloquear fluxos financeiros para alguns dos desafios mais urgentes do mundo.
Veremos o começo dessa transformação neste ano? Eu, pelo menos, estarei acompanhando.
Este artigo foi publicado originalmente no Insights.