Vencer o desafio climático só será possível com as florestas em pé
A Conferência Mundial sobre Restauração Ecológica, organizada pela Society of Ecological Restoration (SER), é um evento bienal destacado como o mais importante no mundo para as discussões sobre recuperação de ecossistemas degradados, danificados ou destruídos. A atual edição acontece pela primeira vez no Brasil e na América do Sul. O WRI Brasil é uma das organizações patrocinadoras. Acompanhe o nosso calendário de eventos e as atualizações no blog.
Os participantes da VII Conferência Mundial sobre Restauração Ecológica (SER2017) debatem, a partir desta segunda-feira (28), como a restauração das paisagens florestais degradadas, danificadas ou destruídas aliada à conservação das florestas remanescentes permitirá à humanidade garantir a temperatura média da Terra abaixo de 1,5 ºC até 2100.
Ao todo, 1.080 pessoas inscritas de 66 países – entre pesquisadores e cientistas, profissionais dos setores público e privado, organizações não-governamentais e estudantes – formam o pelotão científico reunido em Foz do Iguaçu (PR). De acordo com o Atlas de Oportunidades de Restauração de Florestas e Paisagens, há um passivo florestal de dois bilhões de hectares no planeta, uma área mais extensa do que o território da América do Sul.
A presidente da conferência em 2017, Vera Lex Engel, docente da Universidade Estadual Paulista (UNESP), reforça a mensagem de que o Brasil tem um papel de liderança para desempenhar entre os países latino-americanos e também no mundo.
“Ainda que enfrentemos barreiras e a insanidade de governantes mundo afora, devemos usar a ciência, a experiência prática e todas as ferramentas que dispomos para enfrentar os céticos da mudança do clima e projetar um mundo melhor para nós e as futuras gerações”, afirma Vera.
A SER2017 é uma oportunidade para reforçar às lideranças políticas os objetivos ambiciosos assumidos para a restauração de paisagens degradadas. O Desafio de Bonn, de 2011, definiu a meta de restauração de 150 milhões de paisagens florestais até 2020. Em 2014, os países adotaram a Declaração de Nova York sobre Florestas e acrescentaram à meta mais 200 milhões de hectares até 2030. A Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) do Brasil prevê a restauração e o reflorestamento de 12 milhões de hectares até 2030.
O diretor de Florestas do WRI Brasil, Miguel Calmon, destaca as razões que justificam a restauração. “As florestas em pé mantêm a biodiversidade, que é fundamental para a nossa sobrevivência como espécie. Se não conseguirmos restaurar esses milhões de hectares – e não adianta só restaurar se estivermos perdendo biodiversidade pelo desmatamento –, a possibilidade da temperatura do planeta ultrapassar 2ºC é muito grande”, diz.
As florestas são biodiversas pela quantidade de vida que abrigam. Especialmente entre os trópicos, as florestas são berço de infinitas espécies da fauna e da flora – muitas delas, inclusive, ainda não descobertas pela ciência. As florestas tropicais recebem grande incidência de luz solar e calor e, em função da evapotranspiração das árvores, que cobrem vastos territórios, experimentam abundância de chuvas, água no solo e biomassa.
“A importância da restauração está em manter as paisagens florestais com a sua biodiversidade. Isso permite que a floresta ofereça os seus produtos, como madeira, frutas e sementes, serviços ambientais, como a qualidade e abundância do fornecimento de água, regule o clima e gere benefícios socioeconômicos, como empregos”, afirma o gerente de Florestas, Aurelio Padovezi.
A questão agora é: como implementar a restauração e o reflorestamento com espécies nativas dessa enorme quantidade de paisagens degradadas e desmatadas?
O WRI Brasil entende que a abordagem central passa por mostrar ao produtor rural, empresário e investidor que restaurar paisagens florestais pode ser rentável do ponto de vista econômico.
O Código Florestal, de 2012, modificou a legislação que regulava as florestas privadas desde a década de 1960. O código exige que propriedades rurais presentes nos seis biomas do país cumpram os passivos de Áreas de Preservação Permanente (APP) e Reserva Legal (RL), e que um mínimo de espécies nativas sejam usadas nessas áreas. “Pela via legal, vimos que isso não funcionou. Temos que ir além das exigências legais e mostrar que a restauração e o reflorestamento com espécies nativas é um negócio”, afirma o analista de investimentos do WRI Brasil, Alan Batista.
Além de fazer a restauração em áreas com passivo ambiental, o WRI Brasil analisa a viabilidade de implantação em lugares que têm baixa aptidão agrícola. "Se mostrarmos que fazer restauração nessas áreas pode garantir o cumprimento da exigência da lei e, ao mesmo tempo, reduzir custo e gerar renda de curto, médio e longo prazos, estaremos no caminho”, diz Miguel.
A diversificação de produtos da floresta – madeireiros e não-madeireiros – e serviços ambientais é a chave nesse sentido. O custo da restauração varia de região para região e de propriedade para propriedade. Assim como investir em commodities (gado ou grãos, por exemplo), investir em florestas não está isento de risco. “Ninguém pode prever qual será o preço da madeira em 20 anos”, pontua Batista.
As descobertas no campo da restauração e reflorestamento com nativas em universidades e centros de pesquisa ajudarão a encontrar as respostas para potencializar esse ramo científico. Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) em parceria com o setor industrial privado e o estabelecimento de marco regulatório para o setor pelo poder público são outros pontos para desenvolver a economia e elevar as chances de rentabilidade.
Entre os principais assuntos que serão debatidos na SER2017 estão a oferta de sementes para a restauração, o desenvolvimento genético de espécies, a relevância da boa governança para o sucesso de um projeto e espaços de troca de experiências entre diferentes países.
Depois do Brasil, a maior delegação de pesquisadores vem da China, com 39 inscritos.
A SER2017 teve cerimônia oficial de abertura na noite deste domingo (27). A conferência termina nesta sexta-feira (1).