Alan Batista é um engenheiro florestal que sabe traduzir economia e finanças no setor de florestas plantadas. No WRI Brasil, atua como analista de investimentos para o Projeto VERENA — de Valorização Econômica do Reflorestamento com Espécies Nativas.

Diversos países estão comprometidos em restaurar 350 milhões de hectares de florestas até 2030. O Brasil definiu que contribuirá com a restauração e reflorestamento de 12 milhões de hectares no período. A questão é: como fazer isso?

Alan diz que a resposta está no desenvolvimento de uma nova economia florestal baseada no reflorestamento com espécies arbóreas nativas e sistemas agroflorestais (SAFs). Além de bom negócio do ponto de vista financeiro, manter a floresta em pé e aumentar a área plantada com espécies arbóreas nativas é a maneira mais efetiva e competitiva, em termos de custo, de mitigar o aquecimento global e gerar benefícios para o planeta e a vida das pessoas.

O VERENA atua nesse sentido. O projeto completa dois anos em evento na quinta-feira (14), quando serão publicadas as análises sobre a viabilidade técnica e econômica do reflorestamento com espécies nativas.

O evento, que acontece em São Paulo (SP), apresentará a ferramenta de investimento VERENA, que ficará disponível publicamente para qualquer pessoa interessada.

Por que trabalhar com florestas no WRI Brasil?

Alan Batista — A história começa com meu pai, que é agrônomo e fez carreira como pesquisador. Ele disse um dia para que fizesse Engenharia Florestal. "O futuro do Brasil é florestal, Alan". A frase colou em minha cabeça. Passei na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP), em Piracicaba (SP), e mirei minha carreira na iniciativa privada. No último ano, fui trabalhar na indústria de celulose na área de Pesquisa & Desenvolvimento (P&D). Depois, parti para um mestrado na Europa. Os países (Finlândia, Alemanha e França) em que estive têm, como o Brasil, um imenso território com cobertura florestal. Mas sentia que não estava fazendo a diferença. Gostaria de fazer algo diferente para o mundo, algo maior e que tivesse um impacto positivo no planeta. Queria voltar para o meu país e fazer a diferença no Brasil.

O que aprendeu na Europa?

A experiência abriu meus olhos para aliar o conhecimento florestal com a área econômica. De espécies arbóreas exóticas, que fornecem a matéria-prima para a produção de celulose, parti para o estudo das espécies nativas. Minha dissertação partiu de uma abordagem econômica para analisar a viabilidade econômica das concessões florestais na Amazônia, as limitações do processo de concessão e o uso de ferramentas de otimização e programação linear como suporte de gestão no manejo florestal. Em 2016, o estudo foi premiado pelo Serviço Florestal Brasileiro (SFB). Os anos no mestrado ajudam o meu trabalho hoje.

Como foi o retorno para o Brasil?

Logo que retornei, voltei para o setor industrial. Lá, eu reparei que existem poucos estudos e poucos empresários, gestores públicos ou lideranças da sociedade civil que despertaram para a silvicultura com espécies nativas como um negócio. Entendo que somente provando a viabilidade é que teremos a escala que buscamos. E isso é essencial para mitigar o aquecimento global e fazer a transição para sistemas produtivos mais resilientes. Trabalhamos isso no Projeto VERENA. Hoje, estamos começando quase do zero a contar a história do potencial econômico e ecológico do reflorestamento com nativas. O retrato atual é de muita paisagem degradada, que não gera retorno ambiental, social ou econômico. Tudo indica que o futuro será de mais paisagens florestais restauradas.

Alan Batista na United Nation Foundation, em Nova York (Foto: Claudio Pontes)

Por que o Brasil precisa fomentar o reflorestamento com espécies arbóreas nativas?

Porque a floresta é fundamental do ponto de vista climático e da manutenção da biodiversidade, que é a diversidade biológica de um ecossistema. E não falo aqui apenas sobre reflorestamento e restauração com fins econômicos, mas também de restauração ecológica e intensificação da área produtiva. Sabemos muito pouco e tem muito ainda para ser descoberto apesar das espécies de árvores nativas brasileiras existirem há milhares de anos. Temos um grande desafio.

Quais são as oportunidades econômicas e socioambientais da floresta?

Analisemos o benefício ambiental em primeiro lugar. O cenário previsto é de aumento de eventos climáticos extremos. A falta de chuva por exemplo. Em grande parte, ela é responsável por quebras de safra. Em um cenário no qual estiagens acontecem com mais frequência, as florestas são alternativas capazes de tornar uma paisagem mais resiliente ao risco climático. As florestas também guardam novos produtos da economia. O VERENA traz um dado muito interessante nesse sentido. Com os produtos da economia real — os produtos tangíveis, como a madeira serrada, a castanha, entre outras — conseguimos demonstrar a viabilidade econômica do reflorestamento com nativas e sistemas agroflorestais (SAFs). Você tem ainda o aspecto do melhoramento genético (pesquisa) e do ganho de produtividade. Hoje, as árvores nativas são ditas “selvagens”. Não foram domesticadas. O conhecimento que elas guardam está na própria natureza das plantas. E a possibilidade de ganho é enorme. Você vê isso no setor agropecuário brasileiro. Em 40 anos, culturas como a do eucalipto, da cana de açúcar e do milho tiveram ganhos enormes. O mesmo pode acontecer com a silvicultura com espécies arbóreas nativas. A terceira oportunidade está nos serviços do capital natural. Eles não integram hoje a economia real. No VERENA, entendemos que o capital natural é elemento importante num cenário de economia de baixo carbono. Há possíveis novos mercados. O do carbono, da venda de créditos. O de pagamento por serviços ambientais de água, que já existe em algumas bacias hidrográficas no Brasil. A valorização da floresta em pé, que são as Cotas de Reserva Ambiental (CRA) previstas no novo Código Florestal (lei federal 12.651 de 2012). Se preservo mais do que existe em lei, posso fazer servidão dessa área. E um quarto elemento, que é a utilização econômica da Reserva Legal (RL). Quando pensamos na área de uma propriedade privada, não temos um aproveitamento de 100% da terra para uso produtivo. Parte da área é para Área de Proteção Permanente (APP) e outra parte é RL, segundo o novo Código Florestal. Quando falamos sobre fazer uso econômico da RL, falamos em aumentar a produtividade. Posso fazer uso econômico que tenha componentes de biodiversidade, social e ambiental.

Viveiro de mudas na Symbiosis Investimentos, em Porto Seguro (BA) (Foto: Aurelio Padovezi)

O Projeto VERENA completa dois anos. O que apresenta de novo?

O Projeto VERENA é uma iniciativa inédita como o primeiro levantamento no setor privado brasileiro para mostrar a viabilidade econômica do reflorestamento com espécies nativas. O que a gente faz é construir uma classe de ativos da restauração para o público interessado (representantes de instituições financeiras e bancos, investidores e produtores rurais) ter informações com transparência e, assim, diminuir o risco na hora de decidir investir no negócio da silvicultura com espécies nativas. Assim, você aumenta a viabilidade dos projetos e permite o ganho de escala. Em dois anos, analisamos e documentamos 12 business cases que exploram comercialmente cerca de 30 espécies de árvores nativas. Essas propriedades rurais possuem SAFs e reflorestamento com monoculturas ou múltiplas espécies nativas. Comparamos com 9 culturas tradicionais da silvicultura e da agricultura. No Brasil de hoje, o monocultivo é o que consegue grande escala. Diria que os casos estudados pelo VERENA necessitam de maior investimento por hectare e tempo para recuperar o retorno do investimento, se comparados ao setor agropecuário e florestas plantadas. No caso do payback, o tempo maior se deve ao maior ciclo de colheita das espécies arbóreas nativas. Se diversificado, é possível mitigar riscos ambientais (estiagens, secas) e de variação de preços. Cada modelo de negócio tem um risco diferente. Cada modelo de negócio precisa responder à pergunta do quanto de capital será necessário para colocar uma floresta em pé para produzir. Por isso, deixamos para uso público uma ferramenta de investimento VERENA que permite modelar monocultivos e modelos complexos compostos por mais de 10 espécies arbóreas nativas e que considerem a variação do capital natural. O Projeto VERENA mostra que existe viabilidade econômica na silvicultura com espécies nativas.