Países do G20 têm ferramentas para a retomada verde, mas ainda não as colocaram em prática
Em meio à pandemia de Covid-19 e as oscilações econômicas que a acompanharam, as 20 principais economias do mundo foram atingidas por ondas de calor, enchentes, incêndios, secas e ciclones – todos lembretes da necessidade urgente de combatermos a mudança climática. Os países do G20 responderam com pacotes robustos para recuperação econômica e do vírus, mas ignoraram amplamente a crise do clima ao focar nas soluções intensivas em carbono do cenário usual (business as usual), investindo US$ 262 bilhões em combustíveis fósseis e apenas US$ 67 bilhões em energia limpa.
Esses mesmos países se comprometeram com as metas de longo prazo do Acordo de Paris para adaptação, financiamento e limite de aumento da temperatura. O fracasso em tornar ambientalmente sustentáveis os gastos com a retomada econômica manteria os piores impactos das mudanças climáticas. Mas o G20 ainda tem o tempo e as ferramentas necessárias para promover uma recuperação de melhor qualidade.
Que ferramentas os governos possuem para promover a ação climática?
Embora haja extensa literatura sobre as políticas e ferramentas que os governos precisam implementar para atingir esses objetivos, menos foi escrito sobre como os pacotes de recuperação e resposta à Covid-19 podem ser estruturados para atingir os objetivos do Acordo de Paris. Uma nova pesquisa do WRI propõe uma tipologia de políticas e intervenções alinhadas ao Acordo que os governos podem usar em pacotes de recuperação futuros ou na formulação de políticas econômicas.
A pesquisa analisou a literatura existente sobre o que é necessário para alcançar o alinhamento com o Acordo de Pais, considerando as alavancas, políticas e intervenções à disposição dos governos a fim de verificar quais medidas alinham os fluxos financeiros com as metas de Paris e quais são consistentes com nossa atual economia intensiva em carbono. Descobrimos que os governos dispõem de cinco alavancas para definir a política climática: política monetária; políticas e regulações financeiras e de economia real; política fiscal e incentivos orçamentários; financiamento público; e instrumentos informativos (como divulgação voluntária).
Cinco tipos de alavancas que os governos podem usar para promover o alinhamento com o Acordo de Paris
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Política monetária: com cada vez mais frequência, bancos centrais e outras autoridades do setor usam suas ferramentas para fornecer indicadores e incentivos de preço apropriados para alinhar os fluxos financeiros com as metas climáticas. A política monetária trata das taxas de juros e da oferta de dinheiro em circulação. Essas ferramentas provavelmente se tornarão mais importantes à medida que os esforços de alinhamento avançarem.
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Políticas e regulações financeiras e de economia real: essa alavanca, quando obrigatória e aplicada, influencia o comportamento por meio da lei. Abrange os requisitos ou padrões legais no setor financeiro e na economia real (por exemplo, os setores de energia, transporte, agricultura ou água). Na maioria dos países do G20, as políticas e regulações da economia real (ou seja, setoriais) são essenciais para as decisões de investimento.
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Política fiscal e incentivos orçamentários: os governos podem usar essa alavanca para influenciar o comportamento ao alterar os indicadores de preço. Isso pode ser feito por meio de impostos, subsídios, suporte ou controle de preços ou mesmo por meio de alocações e despesas orçamentárias diretas.
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Financiamento público: essa alavanca influencia o comportamento ao alterar os riscos financeiros e é mantida por fundos de pensão públicos, fundos soberanos e instituições financeiras públicas nacionais e internacionais (como bancos de desenvolvimento nacionais). Inclui instrumentos como subsídios, empréstimos, participações acionárias ou garantias.
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Instrumentos informativos: o objetivo dessa alavanca é influenciar o comportamento ao aumentar a conscientização. Exemplos incluem recomendações não vinculativas ou processos de certificação, iniciativas de transparência, estratégias, planos ou estruturas corporativas ou nacionais.
Fonte: autores do WRI, adaptado de Whitley et al. (2018)
Tipologia das intervenções alinhadas ao Acordo de Paris
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Nota: Essa tipologia é baseada em uma extensa revisão da literatura e pretende ser um indicativo, mas não um guia completo, das ferramentas disponíveis para os formuladores de políticas. Essas alavancas podem ser aplicadas em todos os setores. A revisão de literatura e os mecanismos de acompanhamento cobriram agricultura, edifícios, gestão de risco de desastres, energia, finanças, saúde, indústria, tecnologias de comunicação e da informação, natureza, sistemas de proteção social, transporte, áreas urbanas e gestão de água e resíduos.
Fontes: Autores, com base em Whitley et al. (2018); Vivid Economics (2020); Buckle et al. (2020); Larsen et al. (2020); Hepburn et al. (2020); Allan et al. (2020); e Network for Greening the Financial System (2020, 2021).
Testamos essa tipologia usando cinco mecanismos de acompanhamento de recuperação econômica e da Covid-19 de outras organizações. Avaliamos as políticas e intervenções domésticas e internacionais decretadas pelos países do G20 entre 1º de março de 2020 e 31 de janeiro de 2021. Esses testes nos permitiram identificar tendências – e lacunas – de como os pacotes de resgate e recuperação da economia estavam ou não alinhados com as metas do Acordo de Paris. Nossa tipologia oferece um conjunto de ferramentas políticas que pode ser aplicado em todos os setores relevantes para alinhar os fluxos financeiros com o Acordo de Paris.
Os países do G20 não estão fazendo tudo que podem para tornar a retomada mais verde
Ao avaliar como os pacotes de resgate econômico e recuperação da Covid-19 estão alinhados com o Acordo de Paris, identificamos as seguintes tendências:
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Os países estão usando apenas uma pequena parte das alavancas políticas e intervenções disponíveis alinhadas ao Acordo de Paris. Em seus pacotes de recuperação da Covid-19, por exemplo, foram poucos os países do G20 que tornaram obrigatória a divulgação de riscos climáticos, implementaram mecanismos de precificação de carbono, evitaram fundos públicos com participações intensivas em emissões, reduziram subsídios para combustíveis fósseis ou investiram em readaptar a mão de obra.
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Os países optaram por intervenções de curto prazo dentro do cenário usual, em conformidade com as políticas fiscais e alavancas de incentivo orçamentário. Essas intervenções em geral incluíram assistência de liquidez sem condicionantes climáticos para indústrias intensivas em carbono, pequenas e médias empresas e intermediários financeiros ou investimentos em infraestrutura atual ou tradicional. Essas preferências sugerem uma inércia sistêmica significativa.
Segundo dia da cúpula do G20 em Roma, na Itália, em outubro de 2021. Embora tenha havido algum avanço na Cúpula dos Líderes de Roma, ainda é preciso fazer muito mais. (Foto: Andrew Parsons/Nº 10 Downing Street)
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A maioria das intervenções – sejam positivas para o clima ou dentro do cenário usual – teve como foco o setor de energia, seguido pelo setor de transportes e de construção. Os governos usaram políticas e regulações de economia real para aumentar o apoio à energia renovável, mas também congelaram ou evitaram regulações climáticas e ambientais existentes. Por meio de incentivos fiscais, subsídios e apoio orçamentário direto, os países avançam na geração de energia renovável, reformando prédios públicos e residências privadas e acelerando a transição para sistemas de transporte de baixo carbono. Em paralelo, porém, os governos direcionaram a assistência de liquidez para indústrias intensivas em carbono a fim de aliviar suas pressões financeiras. Essas medidas foram amplamente aprovadas sem condicionantes climáticos ou de descarbonização, indicando novamente a preferência dos governos pela inércia sistêmica.
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Quase todos os países estão perdendo oportunidades de investir em adaptação e resiliência e nenhum considera de forma sistemática a resiliência climática em todos os investimentos. Apenas quatro países incluíram de forma explícita adaptação ou resiliência em seus pacotes de recuperação da Covid-19. As medidas de adaptação que receberam apoio foram nos setores de agricultura, água e gestão de riscos de desastres.
Quais são as implicações para formuladores de políticas e como virar o jogo nos gastos
O fracasso contínuo em mudar os gastos de recuperação da Covid-19 e todas as outras despesas do governo para caminhos compatíveis com o Acordo de Paris está tornando todos os objetivos do Acordo inatingíveis. Embora alguns países do G20 tenham incluído considerações climáticas em seus pacotes de recuperação, estas foram superadas por intervenções usuais, do cenário business as usual. Uma vez que precisamos cortar as emissões pela metade até 2030 para manter o aumento da temperatura global dentro do limite de 1,5°C em relação aos níveis pré-industriais, esse perfil de gastos coloca as metas de Paris fora de alcance.
Os países do G20 precisam começar a usar todas as ferramentas disponíveis para apoiar a transformação alinhada ao Acordo de Paris. Essa tipologia pode ser um ponto de partida.
Mais especificamente, os países do G20 podem seguir estas etapas:
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Alinhar as operações financeiras ao Acordo de Paris: os países precisam desenvolver e implementar um entendimento operacional de como devem ser os fluxos financeiros alinhados ao Acordo de Paris (incluindo fundos soberanos, fundos públicos de pensão e bancos de desenvolvimento nacionais), seguir o Grupo dos Sete (G7) exigindo divulgações climáticas alinhadas com a Força-Tarefa para Divulgações Financeiras Relacionadas ao Clima e reportar os avanços de forma transparente. Os países devem colaborar com o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional e outros atores estratégicos para assegurar que todas as nações tenham acesso a dados climáticos de qualidade.
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Preparar-se para riscos e impactos: os governos devem assegurar que todos os investimentos considerem futuros riscos climáticos físicos e adaptar de forma proativa sua infraestrutura, sistemas e comunidades. Existe uma lacuna alarmante nas considerações de adaptação e resiliência nos pacotes de recuperação. Manter essa tendência compromete a longevidade, a credibilidade e o valor de qualquer investimento. Os governos devem usar ferramentas de triagem de forma sistemática para considerar os impactos físicos e sociais dos riscos climáticos atuais e futuros de seus investimentos e programas.
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Liderança internacional: os países do G20 devem usar sua vontade política e influência institucional para encorajar seus pares a seguir e reivindicar investimentos alinhados ao Acordo de Paris. Isso pode incluir a promulgação de políticas internas alinhadas às metas do Acordo, a defesa de mais ambição climática por parte dos bancos multilaterais de desenvolvimento ou o comprometimento com processos inclusivos e justos no âmbito das negociações internacionais sobre o clima.
A janela da ação climática está se fechando rapidamente. Embora tenha havido algum avanço na Cúpula dos Líderes de Roma, ainda é preciso fazer muito mais. É o momento de os países do G20 usarem todas as cinco alavancas de formulação de políticas para implementar ferramentas e intervenções alinhadas ao Acordo de Paris e assumir a liderança da economia de baixo carbono e resiliente do futuro.
Artigo publicado originalmente no WRI Insights.