Entrevista com Erik Cisneros: quatro perguntas para entender o urbanismo tático
As cidades e a população urbana estão crescendo. Em um contexto de crise, em que o financiamento aparece como um desafio cada vez mais presente, os recursos existentes precisam ser empregados com a máxima garantia de eficiência. É onde entra o urbanismo tático.
O urbanismo tático permite testar mudanças de desenho urbano antes de implementá-las de forma permanente. A abordagem confere novos sentidos e muda a dinâmica dos lugares a partir de alterações rápidas, reversíveis e de baixo custo, com o objetivo de tornar as ruas mais seguras e amigáveis para as pessoas.
Estamos falando de mudanças como as feitas na Rua Joel Carlos Borges e no bairro Santana, em São Paulo, e na Cidade 2000, em Fortaleza. Com pinturas e mobiliário simples, as alterações incentivam as pessoas a repensarem seus hábitos de deslocamento e mostram que garantir a segurança dos pedestres nem sempre exige grandes mudanças estruturais. É possível tornar as ruas mais seguras com intervenções simples.
O mesmo movimento também pode ser observado na Cidade do México. Projetos conduzidos pela administração municipal mostram os benefícios que esse tipo de iniciativa pode trazer. O programa Pasos Seguros é parte da estratégia de segurança viária da cidade e contempla a realização de intervenções rápidas e de alto impacto em mais de 50 cruzamentos identificados como de alto risco para pedestres. Veja no vídeo abaixo o exemplo de uma dessas intervenções:
Conversamos com Erik Cisneros, urbanista e consultor de projetos de urbanismo tático na capital mexicana, para entender melhor os benefícios que o urbanismo tático pode trazer às cidades. Erik esteve no Brasil para a 74ª Reunião Geral da Frente Nacional de Prefeitos e falou aos representantes das cidades da Rede Nacional para a Mobilidade de Baixo Carbono sobre a experiência mexicana com esse tipo de projeto (assista aqui).
Erik Cisneros, na Cidade do México (Foto: Priscila Pacheco/WRI Brasil)
Por que as cidades devem usar o urbanismo tático? Fale um pouco sobre a abordagem.
Entendendo as cidades como uma conjunção de governo e cidadãos, acredito que devem utilizar essa abordagem em seus projetos para mostrar que as ruas podem ser espaços melhores para a população. As mudanças feitas por meio do urbanismo tático têm o poder de tornar as ruas mais seguras e mais alegres. E isso pode ser feito com baixo custo, alto impacto e de forma rápida. Baixo custo, porque são intervenções que muitas vezes utilizam materiais baratos, como tintas, e alto impacto porque através desses testes é possível observar as mudanças na segurança, na acessibilidade, no conforto para as pessoas. Nossas cidades estão crescendo, são cidades grandes, e é preciso agir de forma a acompanhar e controlar esse crescimento, por isso a importância de realizar intervenções desse tipo.
Quais os efeitos do ambiente urbano no comportamento das pessoas? Como intervenções de urbanismo tático atuam nesse sentido?
O mais importante é que o urbanismo tático tem o potencial de mudar a visão das pessoas – acabar com preconceitos e ideias antigas ainda enraizadas culturalmente. Às vezes, alguém pode pensar “não, isso não pode ser feito aqui”. É quando o urbanismo tático entra em ação para mostrar que sim, essa mudança pode ser feita. E pode dar certo. Em segundo lugar, o urbanismo tático cria laços e comunidades. Isso porque há participação – todos trabalham juntos nas intervenções. E quando isso acontece, se as pessoas fazem um trabalho conjunto para melhorar sua rua, todos acabarão satisfeitos e cuidarão dessa rua no futuro. Desde as crianças até os mais velhos e mesmo turistas e visitantes.
Pintura no chão e mobiliário urbano criam espaço de convivência para as pessoas (Foto: Priscila Pacheco/WRI Brasil)
No urbanismo tático, a participação da população é parte fundamental do projeto. Como mostrar os benefícios dessa mudança de perspectiva tanto para a população quanto para os governos?
A participação tem um papel fundamental no processo. Se, de nosso lado, temos as soluções técnicas para o problema de uma rua, não podemos esquecer de reconhecer o conhecimento dos especialistas dessa rua: as pessoas que vivem nela. Quando realizamos intervenções de urbanismo tático, é preciso ter em conta a visão das pessoas que serão impactadas, inclusive – e principalmente – se são contrárias à mudança. É preciso mostrar a essas pessoas os benefícios que a intervenção vai trazer. E depois, em conjunto, implementar a intervenção e mostrar ao governo: é assim que gostaríamos que nossas ruas fossem, mais seguras e mais humanas. Tudo deve ser feito em conjunto, de forma participativa.
O que as cidades brasileiras podem aprender com a experiência da Cidade do México?
Falando pela minha experiência com os projetos em que já me envolvi na Cidade do México, posso dizer que gostaríamos de compartilhar com vocês os erros que cometemos no processo – para que as cidades brasileiras não os repitam. Porque nunca estamos livres de cometê-los. É preciso sempre socializar os projetos – apresenta-los à população para que possa opinar e participar das decisões. É preciso sempre realizar um diagnóstico sólido para desenvolver e executar um projeto. E avaliar. Avaliar sempre. Medir os impactos. Avaliar para melhorar. Porque os projetos têm uma vida útil, e precisamos aprender a modificá-los conforme for necessário, ao longo do tempo, para sermos resilientes. Já disse, mas vou repetir: nossas cidades estão crescendo. Nem sempre temos recursos para fazer as adaptações necessárias, de forma que precisamos utilizar cada peso, cada real de forma cuidadosa, eficiente e correta. Testar mudanças através do urbanismo tático é uma forma de fazer isso.