O acesso a espaços públicos é fundamental para a vitalidade urbana. Ao oferecerem condições para a convivência, a mobilidade, o lazer e até mesmo atividades econômicas, espaços públicos de qualidade podem gerar inclusão e qualidade de vida em territórios vulneráveis.

É nesse contexto que o projeto Alianças para Transformação Urbana (TUC) atua desde 2021 na Comunidade do Pilar, no centro de Recife (PE), e no Residencial Edgar Gayoso, na periferia de Teresina (PI). A iniciativa seguiu a abordagem de laboratórios urbanos, unindo representantes de diferentes setores, incluindo moradores, para construírem juntos soluções urbanas inovadoras e sustentáveis, adequadas ao contexto local e valorizando as vocações da comunidade.

Quatro anos após o início do projeto, de que forma as mudanças trazidas pela aliança contribuíram para a melhoria da qualidade de vida e até mesmo para a geração de renda nessas comunidades? Foi o que o WRI Brasil, em parceria com a Fundação Grupo Volkswagen (FGVW), procurou entender por meio de dinâmicas de grupo e pesquisas com mulheres envolvidas em iniciativas nos dois territórios.

Benefícios socioeconômicos

A vulnerabilidade econômica sempre foi um desafio latente nas discussões das Alianças para Transformação Urbana em Recife e Teresina. Por isso, no plano de ação de cada laboratório, foram incluídas iniciativas de geração de emprego e renda, com um foco especial nas mulheres, que representam a maioria das chefes de família nos territórios.

Teresina: praça catalisou feira comunitária

Em Teresina, a transformação de um canteiro central em praça mudou a dinâmica do bairro, criando um ponto de encontro e convivência que estreitou laços entre os moradores.

“Quando a praça não existia, nós éramos cada um na sua casa. Quando a praça começou a existir, nós começamos a participar uma da vida da outra e a nos conhecer mais”, contou uma moradora. Outra relatou: “Começamos a entender que a gente ia conseguir, e que se a gente se unisse, a gente tinha como, com o passar do tempo, melhorar e colocar a feira lá”.  

A feira em questão foi criada e organizada por moradores do residencial em 2023, quando um grupo de moradoras se uniu para vender artesanatos, lanches e outros produtos na nova praça. Algumas mulheres já exerciam a atividade, outras viram na praça uma oportunidade de gerar uma nova fonte de renda, transformando hobbies como cuidado com plantas e tricô em produtos vendáveis. Ao longo de dois anos, a feira de mulheres do Residencial Edgar Gayoso se consolidou em um evento semanal.

Nas conversas promovidas por WRI Brasil e FGVW, as moradoras relataram que a oportunidade de gerar renda perto de casa, conseguir mais clientes, trabalhar em grupo e ter um espaço para se distrair e encontrar outras pessoas foram fatores decisivos para iniciar a feira. Além de aumentar a renda das famílias, a feira fortaleceu os laços e criou uma rede de apoio. Apesar de desafios como a insegurança pública, que levou a uma pausa na feira, as participantes relataram se sentir mais motivadas a buscar outras oportunidades, e a maioria pretende continuar vendendo no futuro. Há uma vontade unânime de retomar a feira do residencial.

Recife: capacitação em artesanato alimentou desejo de crescer

Muitas moradoras da Comunidade do Pilar, em Recife, já trabalhavam com a coleta de materiais recicláveis. Em 2022, a Aliança pelo Centro do Recife enxergou nessa vocação uma oportunidade. Trinta mulheres foram capacitadas em técnicas de artesanato com papel machê. Formou-se, assim, o grupo, que iniciou a produção conjunta de peças como colares e itens de decoração que passaram a vender em feiras da cidade. Parte das peças foram expostas em São Paulo e Porto Alegre e levadas à COP28, em Dubai, como exemplo de ação sustentável com comunidade vulnerável.

As participantes concordam que a venda das peças contribuiu para a geração de renda. Atualmente o projeto está pausado, mas as entrevistadas relataram que a experiência as deixou mais confiantes para buscar outras oportunidades de trabalho ou renda, e a maioria manifestou interesse em seguir se capacitando profissionalmente.

Transformações do território às pessoas

Iniciado com o intuito de gerar transformações sustentáveis nos territórios, o trabalho das Alianças para Transformação Urbana revelou também o potencial das transformações nas pessoas.

As dinâmicas promovidas com as moradoras revelam a sensação de confiança e empoderamento que se desenvolveu dentro delas após essa vivência. Surgiu ali um interesse geral em continuar se capacitando e se desenvolvendo pessoalmente, de modo a conseguir conquistar mais novas oportunidades. Para além da renda, a experiência permitiu às mulheres estreitar laços, criar um espaço de convívio e trocas e até mesmo lidar com a ansiedade.

"Quando as mulheres se reconhecem como parte da mudança no território, elas também se autorizam a transformar a si mesmas. Isso é tão poderoso quanto qualquer obra física", afirmou Paula Santos, gerente de Mobilidade Urbana do WRI Brasil.

A transformação efetiva das realidades é uma mudança de longo prazo, que atravessa gerações. Mas os incentivos e resultados iniciais nessas comunidades são um exemplo do potencial transformador do acesso a oportunidades, da construção colaborativa e da criação de capacidades.