João Alfredo, Cidade Baixa. Um dos três principais eixos do bairro mais boêmio de Porto Alegre. Uma rua marcada pela dualidade e alvo de polêmicas devido à movimentação noturna. Que a João Alfredo seja uma rua mais atrativa e vibrante durante o dia, onde as pessoas possam circular com segurança, e que, à noite, a ocupação do espaço se dê de forma segura e harmoniosa foram duas das preocupações manifestadas pelos moradores, comerciantes e frequentadores do bairro que na última quarta-feira (2) reuniram-se para debater a transformação da via em uma Rua Completa.

Porto Alegre é uma das cidades da Rede Nacional para a Mobilidade de Baixo Carbono e conta com o apoio do WRI Brasil para desenvolver seu projeto de Rua Completa, que será implementado na João Alfredo. A escolha da via se deu em virtude de algumas características-chave que desestimulam o transporte ativo e, consequentemente, tornam a rua pouco atrativa para as pessoas durante o dia: calçadas estreitas, poucas faixas de segurança, sinalização precária e a largura da rua (duas faixas de estacionamento e duas de tráfego). “Qualquer mudança que promova uma melhor forma de transitar – ciclovias, faixas se segurança, acessibilidade, arborização –, tudo isso qualifica o espaço para todos os usuários”, comenta Ronaldo, morador do bairro há 20 anos.

<p>João Alfredo: muito espaço para os carros, poucas oportunidades de travessia e calçadas estreitas afastam as pessoas da rua durante o dia</p>

João Alfredo: muito espaço para os carros, poucas oportunidades de travessia e calçadas estreitas afastam as pessoas da rua durante o dia (Foto: Daniel Hunter/WRI Brasil)

A oficina de participação social organizada pelo WRI Brasil e pela Prefeitura de Porto Alegre foi a primeira oportunidade de ouvir os diferentes públicos da rua sobre suas necessidades, quais consideram os principais problemas da João Alfredo hoje, possíveis soluções e elementos que gostariam de ver contemplados no projeto. “O grande desafio é equalizar os interesses de todo mundo que está nesse espaço da João Alfredo: os moradores, os frequentadores e os comerciantes/donos de bares. Precisamos encontrar um caminho de harmonizar a convivência entre esses grupos e a utilização da rua”, avalia Kátia Azambuja, sócia de um bar na João Alfredo.

Os participantes da oficina também manifestaram preocupações em relação a problemas estruturais, como as condições de acessibilidade, segurança viária, limpeza urbana e sinalização. Rodrigo Corradi, diretor de Articulação Institucional e Resiliência da Prefeitura de Porto Alegre, reforçou o caráter fundamental da participação popular para o sucesso do projeto: “Já realizamos uma série de atividades técnicas, mas o debate e a validação desse planejamento junto à população é essencial. Queremos que o projeto esteja de acordo com o que as pessoas desejam para a João Alfredo e a Cidade Baixa”.

Cerca de 50 pessoas acompanharam a oficina (Foto: Daniel Hunter/WRI Brasil)

Paula Manoela dos Santos, Ariadne Samios e Bruno Batista, da equipe de Mobilidade Ativa do WRI Brasil, conduziram a oficina, apresentando o conceito de Ruas Completas e mostrando como esse modelo de rua pode ajudar a tornar a João Alfredo uma via mais atrativa e segura. “O objetivo de uma rua completa é promover uma distribuição democrática do espaço entre pedestres, ciclistas, motoristas e transporte coletivo. Mas não há uma receita: cada rua completa será diferente porque será adaptada às necessidades daquele local”, ressaltou Ariadne.

O diagnóstico realizado pela Empresa Pública de Transporte e Circulação de Porto Alegre (EPTC) mostrou que, apenas no cruzamento da João Alfredo com a Rua da República, circulam 317 pedestres a cada hora, número considerado alto. Apesar disso – e de o limite de velocidade na via ser de 40 km/h – a velocidade média registrada (46 km/h) fica acima do permitido. Consequentemente, é o ponto da rua onde acontecem mais acidentes, incluindo um alto número de atropelamentos à noite, quando mais pessoas circulam no local. A requalificação da rua conforme o conceito de Ruas Completas pode melhorar as condições de acessibilidade e segurança apontadas pelos moradores. São as pessoas que “dão vida” a uma rua, mas para isso é preciso que essa rua seja um local atrativo para as pessoas. “Quanto mais pessoas circulando em uma rua, melhor para o comércio e para a segurança”, afirmou Ana Paula Bonini, arquiteta da equipe de projetos viários da EPTC.

Cerca de 50 pessoas acompanharam a oficina e opinaram sobre o que consideram os principais problemas da João Alfredo hoje e quais as medidas que poderiam ajudar a solucioná-los. Entre os problemas, os participantes apontaram a falta de fiscalização, sinalização precária, condições e largura das calçadas, ocupação irregular do espaço, segurança pública, falta de acessibilidade e a limpeza da rua. As soluções e demandas incluem aumentar a fiscalização, reduzir áreas de estacionamento na via e o limite de velocidade, planejar o espaço para pedestres e ciclistas, criar mais momentos de participação social e melhorar as condições de acessibilidade.

Os desejos e necessidades apontados pelos participantes servirão de subsídio para o desenvolvimento de uma primeira versão do projeto, que então será debatido com a população em um novo encontro. A expectativa da Prefeitura é de que uma intervenção temporária seja implementada ainda em 2018.

<p>Participantes da oficina elencam soluções para o projeto de rua completa da João Alfredo</p>

Participantes da oficina elencam soluções para o projeto de rua completa da João Alfredo (Foto: Daniel Hunter/WRI Brasil)

Ruas Completas

Com a proposta de estimular projetos-piloto de ruas mais seguras e inclusivas, o projeto, desenvolvido pelo WRI Brasil em parceria com a Frente Nacional de Prefeitos (FNP), propõe que o município escolha uma via para aplicar o conceito. O objetivo é garantir acesso a todos os usuários, sejam eles pedestres, motoristas, ciclistas ou usuários de transporte coletivo. Iniciado em 2017, no IV Encontro dos Municípios com o Desenvolvimento Sustentável (EMDS), o projeto apoia o desenvolvimento de Ruas Completas em dez municípios e o Distrito Federal, integrantes da Rede Nacional para a Mobilidade de Baixo Carbono.