O Brasil tem um grave problema de pastagens degradadas. As estimativas variam, mas até 100 milhões de hectares possuem o solo desgastado, pouco produtivo e sem função ecológica em todo o país. Em Minas Gerais (MG), na bacia do rio Doce, essa já era uma realidade antes mesmo do rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, lançar rejeitos no meio ambiente.

A boa notícia é que há soluções disponíveis para reverter essa degradação. Uma série de tecnologias agropecuárias para produzir melhor respeitando o meio ambiente estão sendo aplicadas, ainda em forma experimental, em propriedades que foram afetadas pelos rejeitos de mineração. Elas têm como objetivo não só restaurar uma paisagem para a forma como era anteriormente, quando já existia uma degradação histórica, mas ir além, renovando a paisagem e preparando a produção agropecuária para um presente e futuro sustentáveis.

O WRI Brasil, em parceira com a Fundação Renova – organização responsável pela recuperação do ambiente em Mariana (MG), e em conjunto com a Fazenda Ecológica e o Centro Internacional de Pesquisa Agroflorestal (Icraf), estão trabalhando junto com os produtores locais na criação de 25 Unidades Demonstrativas que servirão de exemplo para a recuperação da degradação e renovação da paisagem em Minas Gerais e no país.

Este texto é o primeiro de uma série de três artigos que mostrarão quais tecnologias agropecuárias são essas, como funcionam e como podem fazer com que o produtor rural da bacia do rio Doce produza com qualidade, quantidade e respeito ao meio ambiente. E para começar a série, nada melhor do que falar sobre o manejo de pastagem ecológica, uma forma de tornar a produção agropecuária mais sustentável e produtiva.

O pecuarista é um semeador de pasto

A bacia do rio Doce é muito relacionada com a pecuária leiteira. É uma região de alta declividade e solo rochoso, o que limita a atividade agrícola e faz com que, em toda a região, mais de 65% da área seja tomada por pasto. Desta forma, uma boa tecnologia para trazer sustentabilidade para a região precisa atender a atividade pecuária, melhorando a qualidade do pasto e produzindo com sustentabilidade. A ideia é aumentar a produção, melhorar o manejo e trazer o bem-estar para todo o ambiente.

A experiência do professor Jurandir Melado e sua Fazenda Ecológica se mostra ideal para atender a região. O professor Jurandir adaptou para o Brasil as técnicas do pecuarista francês André Marcel Voisin, conhecidas como Método de Pastoreio Racional ou “Método Voisin” (lê-se: voazan).

Nesse método, o produtor faz um mapa de seu pasto e o divide em núcleos, setores ou piquetes. Ele cuidará desse pasto dividido em piquetes por meio da rotação dos animais, seguindo as quatro “leis” elaboradas por André Voisin:

  • Lei do Repouso: é o princípio que diz que o pasto precisa de tempo suficiente de descanso entre os cortes ou alimentações dos animais, para que a vegetação se recupere;

  • Lei da Ocupação: o período de permanência dos animais na pastagem deve ser curto, para que ele não coma uma planta que está começando a se recuperar;

  • Lei da Ajuda: os animais que precisam de mais nutrientes devem ser “ajudados”. São eles que comerão primeiro em uma área, para que possam ter acesso aos alimentos mais nutritivos;

  • Lei dos Rendimentos Regulares: para que os animais possam ter o máximo rendimento, eles não devem ficar mais que um dia na mesma parcela, para evitar que se alimentem de uma vegetação de pior qualidade.

O princípio desse método é que, antes de se tornar um bom produtor de carne ou leite, o pecuarista precisa ser um bom produtor de capim. Cuidando do pasto, ele terá animais mais bem alimentados e um produto de melhor qualidade.

Para cuidar do pasto, é feita a rotação racional do gado através da construção de vários piquetes, que são quadras onde o gado fica confinado em uma determinada área por um certo tempo. Os piquetes são cercados com 3 e 2 fios de arame eletrificados, tendo como fonte elétrica um conversor de energia solar. A cerca possui vários dispositivos que são construídos artesanalmente pelo próprio produtor, previamente capacitado para isso, o que garante um piqueteamento de baixíssimo custo e dá independência ao proprietário para realizar a própria manutenção nas cercas.

Colocar árvore no pasto

Outro componente crucial no manejo de pastagem ecológica é a presença de árvores no pasto. Na pecuária tradicional, mais predatória, uma área que vai servir de pasto é completamente desmatada, muitas vezes com uso de fogo. Na pecuária ecológica, não se usa o fogo e mantém-se ou planta-se árvores em meio ao pasto.

Introduzir árvores no pasto gera inúmeros benefícios. O capim torna-se melhor e mais nutritivo, diminuindo a compra de farelos. O gado passa a ter melhor bem-estar térmico, já que pode se esconder nas sombras das árvores no momento de sol intenso (e o produtor também). Sem precisar gastar muita energia para manter a temperatura do corpo, o animal melhora a sua produção.

Legado de produtividade

Isso sem falar nos claros benefícios ecológicos, como uma maior retenção de água no solo, menor erosão, sequestro de carbono e o aumento da biodiversidade. Tudo isso resulta em um aumento de produtividade tanto do pasto como na produção de leite e carne, a médio e longo prazo, mantendo a paisagem renovada e a pecuária sustentável.

Na bacia do rio Doce, a Fazenda Ecológica e o WRI Brasil estão implantando 15 unidades demonstrativas de manejo de pastagem ecológica, somando aproximadamente 150 hectares. A expectativa é deixar um legado de pecuária que respeite as leis da natureza, de forma que a paisagem seja renovada com ganhos para o meio ambiente e para o produtor rural.

 

Saiba mais na página do projeto Renovando Paisagem.