Infraestrutura natural e sustentável pode evitar desastres como as enchentes de Minas Gerais
As enchentes em Belo Horizonte e em outras cidades mineiras assustaram a população. Vídeos mostrando a força das águas arrastando carros e derrubando estruturas impressionaram todo o país. Até o momento em que este texto é redigido, 57 pessoas morreram, 45 mil estão desalojadas e 8 mil, desabrigadas. A chuva arrefeceu no fim de semana, mas a Defesa Civil segue em alerta máximo.
O estado de alerta não se resumiu a Minas Gerais. Grande parte do Sudeste enfrentou fortes chuvas, provocando grandes transtornos. No Espírito Santo, por exemplo, mais de 5 mil pessoas tiveram que deixar suas casas, e São Paulo entrou em estado de atenção por alagamentos. Enquanto isso, no Rio, uma situação envolvendo algas nos mananciais provocou o contrário: crise de água causada pela qualidade da água que chegava à torneira das pessoas.
Esses acontecimentos deste começo de ano mostram o quanto as principais cidades do Brasil estão pouco preparadas para lidar com eventos climáticos extremos relacionados à água. O Brasil precisa de nova infraestrutura, tanto para as nossas cidades estarem mais bem adaptadas a chuvas, quanto para nosso sistema de abastecimento poder funcionar com mais eficiência.
Porém, os casos recentes mostram que apenas instalar nova infraestrutura não é o suficiente. O Brasil precisa de infraestrutura eficiente, sustentável e verde. Isso pode salvar vidas.
Investimentos inteligentes para adaptar as cidades
As chuvas do Sudeste geram uma grande oportunidade para pensarmos como será construída a infraestrutura no futuro. Hoje, nossas cidades claramente não estão adaptadas para enfrentar os desafios climáticos que um mundo mais quente exige. Por exemplo, mais da metade dos municípios brasileiros decretaram Situações de Emergência ou Estados de Calamidade Pública entre 2013 e 2017. As causas foram secas, inundações e inundações repentinas ou deslizamentos de terra.
A boa notícia é que há como fazer diferente. Um relatório da Global Commission on the Economy and Climate estimou, com base em dados da Agência Internacional de Energia (AIE) e da Organização pela Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que o mundo precisará investir US$ 89 trilhões em infraestrutura até 2030. O Brasil pode ter uma oportunidade de ouro para tornar mais sustentável sua infraestrutura convencional e complementá-la com a infraestrutura natural.
Telhados verdes podem captar água da chuva, diminuindo risco de inundações e alagamentos nas ruas das cidades. Foto: DJANDYW.COM/Flickr
Infraestrutura também pode ser natural
A infraestrutura do futuro precisa unir o que há de mais moderno em obras convencionais, usando materiais e sistemas que limitam emissões de gases de efeito estufa, por exemplo, com a infraestrutura natural.
Infraestrutura natural é a conservação, manejo ou restauração de ecossistemas que reabilita a paisagem a fornecer serviços essenciais para a sociedade, sendo uma solução baseada na natureza. Ela auxilia a infraestrutura convencional especialmente na gestão dos recursos hídricos (quantidade e qualidade da água para consumo) e no planejamento urbano (as enchentes e deslizamentos). Ou seja, justamente no que mais provoca situações de emergência nas cidades brasileiras.
Mas como áreas naturais poderiam ajudar em casos de enchentes devastadoras como as que estão acontecendo no Sudeste? Um estudo do WRI analisando exemplos de uso de infraestrutura natural em vários países, como EUA e Polônia, mostra que as florestas podem ajudar absorvendo, filtrando e desacelerando o escoamento da água de tempestades, mitigando as enchentes urbanas. Estratégias como telhados verdes, pavimentos permeáveis e áreas de biorretenção (uma espécie de jardim que coleta água da chuva) podem reduzir entre 75% até 90% do volume de água que escorre pelas ruas, limitando inundações.
Além disso, a infraestrutura natural tem um papel importante para a qualidade da água de abastecimento. O caso do Rio de Janeiro, que enfrenta dificuldades com a qualidade da água que chega nas torneiras, é um exemplo. Um estudo do WRI Brasil mostrou que plantar florestas na bacia do Guandu “filtra” as águas que chegam na estação de tratamento, resultando numa água de melhor qualidade entrando no sistema de abastecimento.
Área restaurada nas proximidades da Estação de Tratamento Guandu, no Rio de Janeiro. Plantar florestas em áreas prioritárias da bacia pode filtrar a água que chega às estações de tratamento. Foto: Marizilda Cruppe/ WRI Brasil
Oportunidades econômicas
Além de ajudar a fazer a transição a uma economia de baixo carbono, a infraestrutura natural também faz sentido do ponto de vista econômico. O estudo feito no Rio mostra que a restauração de 3 mil hectares de florestas na bacia do Guandu pode reter parte do sedimento, fazendo com que a água chegue mais limpa na estação de tratamento. O resultado é uma economia de R$ 156 milhões em 30 anos, com um retorno de investimento de 13% – um resultado econômico compatível com os investimentos no setor de abastecimento de água. Uma análise feita para a bacia da Cantareira, em São Paulo, encontrou resultados similares, e no Espírito Santo, estudos de avaliação de oportunidades de restauração e o trabalho do programa Reflorestar mostram que o plantio de florestas é crucial para um melhor uso da água no estado.
No caso das enchentes, a infraestrutura natural tem um enorme potencial para reduzir prejuízos. Estima-se que as cidades brasileiras afetadas por inundações entre 1995 e 2017 gastaram R$ 180 bilhões em atividades de resposta e recuperação de danos. Uma infraestrutura mais inteligente, eficiente e natural pode ajudar o país a fazer a transição para uma economia de baixo carbono, evitar prejuízos e, mais importante de tudo, salvar vidas.