Este post foi escrito por Kelly Levin e Dennis Tirpak e publicado originalmente no WRI Insights.


Todos os meses, cientistas fazem novas descobertas que avançam nossa compreensão sobre as causas e os impactos das mudanças climáticas. As pesquisas nos dão uma noção mais clara das ameaças que já enfrentamos e apontam o que ainda está por vir se não reduzirmos as emissões em um ritmo mais rápido.

A série “Este mês na ciência climática”, do WRI, faz um resumo das pesquisas mais significativas de cada mês, compiladas de publicações científicas reconhecidas. Nesta edição são explorados alguns dos estudos publicados em julho de 2019. (Para receber esse conteúdo diretamente em seu e-mail, em inglês, cadastre-se na newsletter “Hot Science”, do WRI.)

Eventos extremos recentes

Os últimos meses trouxeram sinais alarmantes das mudanças no clima, muitos dos quais estão alinhados com projeções de um mundo em aquecimento:

  • As temperaturas médias globais de julho foram as mais altas desde o início dos registros, que começaram em 1880, 0,95°C acima da média do século 20. Isso faz de julho de 2019 o mês mais quente já registrado na história.

  • Uma onda de calor atingiu a Europa, quebrando recordes de temperatura na Alemanha, Holanda, Reino Unido, Bélgica e França. Paris viu as temperaturas chegarem a 42,7°C. O projeto World Weather Attribution concluiu que as ondas de calor na França e na Holanda tinham “pouquíssima chance” de ocorrer não fossem as emissões causadas pelo homem.

  • O Met Office do Reino Unido anunciou que os 10 anos mais quentes da região desde o início dos registros, em 1884, ocorreram desde 2002. Ligado a isso, os cinco verões mais quentes da Europa nos últimos 500 anos aconteceram nos últimos 15 anos.

  • A onda de calor europeia também acelerou o derretimento da Groenlândia.

  • A extensão do gelo do mar Ártico em julho alcançou níveis baixos recordes, caindo 80 mil quilômetros quadrados abaixo do recorde anterior batido em 2012 e 1,88 milhão de quilômetros quadrados abaixo da média de 1981 a 2010.

  • Grande parte do Oceano Ártico era pelo menos 3°C mais quente que a média de julho de 1981-2010.

  • Em um censo anual de renas selvagens em Svalbard, cientistas encontraram carcaças de cerca de 200 animais que morreram de fome durante o inverno. Eles atribuíram as mortes à maior ocorrência de chuva em vez de neve. Quando a chuva congela, torna as plantas inacessíveis para o pastoreio.

  • Anchorage, no Alasca, superou seus recordes de temperatura anteriores em impressionantes -15°C. Longos períodos de calor extremo criaram as condições perfeitas para incêndios florestais, com um milhão de acres queimando desde o início de julho. Enormes incêndios também ocorreram na Groenlândia e na Rússia, com várias áreas na Sibéria declarando estado de emergência.

Clima extremo

  • Aquecimento alimenta incêndios florestais na Califórnia: um estudo mostra que, de 1972 a 2018, a Califórnia registrou um aumento de cinco vezes na quantidade de áreas queimadas anualmente e um aumento de oito vezes na extensão de seus incêndios no verão. Os cientistas concluíram que o aquecimento global induzido pelo homem está aumentando o potencial de tais incêndios florestais.

  • Mais calor extremo nos EUA: os cientistas estimaram que o número anual de dias com temperaturas superiores a 38°C e 41°C nos Estados Unidos dobrará e triplicará em meados do século, em comparação com 1971- 2000.

  • Riscos de inundação na costa leste dos EUA: levantamento da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos EUA (NOAA) mostra um aumento significativo dos eventos de inundação da maré alta em mais de 40 locais. A média nacional atual para inundações na maré alta é de cinco dias por ano; os cientistas estimam que a frequência atinja de sete a 15 dias até 2030 e de 25 a 75 dias até 2050 (o intervalo depende do nível de emissões futuras), com taxas muito mais altas em diversos locais.

  • Condições climáticas extremas atingem a costa da Austrália: os cientistas documentaram eventos extremos como ondas de calor marinhas e altas chuvas ao longo da costa da Austrália entre 2011 e 2017. Eles descobriram que em mais de 45% da costa houve uma mortalidade abrupta e extensa de espécies marinhas importantes, como corais, manguezais, ervas marinhas e florestas de algas. Os autores observaram que a frequência e a intensidade ampliadas de eventos extremos foram associadas às mudanças climáticas.

Aquecimento

  • O período mais quente em 2 mil anos: pesquisadores estabeleceram que o período mais quente dos últimos dois milênios aconteceu durante o século 20, afetando mais de 98% do globo. Eles concluíram que tanto a temperatura quanto a extensão do aquecimento são sem precedentes e induzidas pelo homem.

Impactos

  • Mudanças climáticas alteram floresta japonesa: um novo estudo baseado em quase 40 anos de dados revelou que o aquecimento e a maior quantidade de chuva no norte do Japão reduziu a taxa de crescimento de coníferas e aumentou a de espécies de árvores de folhas largas. Essa mudança na composição das espécies pode impactar os serviços que florestas fornecem, incluindo o armazenamento de carbono e a provisão de habitat.

  • Guaxinins prosperando em meio às mudanças climáticas: um novo estudo descobriu que a região adequada para a vida dos guaxinins irá expandir mais para o norte. Com espécies se espalhando, os guaxinins podem eventualmente superar espécies nativas.

  • Salmão em risco: cientistas descobriram que diversas espécies de salmão na costa oeste dos Estados Unidos são muito vulneráveis ao aquecimento e à acidificação do oceano. Além disso, outros fatores de estresse como barragens e outras barreiras de migração vêm reduzindo a habilidade das espécies se adaptarem a temperaturas mais altas.

  • Conexão do clima com doenças fúngicas: um fungo resistente a medicamentos, a Candida auris, que pode causar infecções, surgiu em três continentes. Cientistas afirmam que pode ser a primeira doença fúngica suscitada devido às mudanças climáticas, dada sua tolerância térmica.

  • Espécies em movimento no Reino Unido: pesquisadores analisaram uma década de informações de 2008 a 2018 e descobriram que pelo menos 55 espécies mudaram sua área de alcance devido às mudanças climáticas. Essas alterações têm implicações na composição do ecossistema, como por exemplo a competição entre espécies nativas e danos às colheitas.

  • Mudanças climáticas dificultam o crescimento de nutrientes: espera-se que a disponibilidade global de nutrientes como ferro e zinco aumente devido a avanços tecnológicos, fertilização com dióxido de carbono (aumento da fotossíntese com níveis mais altos de dióxido de carbono) e reações do mercado. No entanto, os modeladores descobriram que níveis aumentados de dióxido de carbono diminuirão o crescimento de nutrientes; os pesquisadores avaliam uma queda de 20% em proteínas, 14,4% de ferro e 14,6% de zinco em relação ao esperado devido a ganhos tecnológicos e de mercado até 2050. De um quarto a um terço da população global já é deficiente em pelo menos um micro nutriente.

  • O clima mais quente conduz a mais tartarugas fêmeas: os cientistas descobriram que 84% dos filhotes de tartarugas cabeçudas em Cabo Verde são fêmeas. Até o final do século, eles prevêem que a proporção entre sexo pode ser superior a 99% de mulheres, com três ilhas que não produzem machos. Eles também observam que até 2050, mais de 90% dos ninhos de tartarugas de Cabo Verde estarão expostos a temperaturas letalmente altas.

  • Corais se redistribuindo: Explorando dados de 1974 a 2012, os pesquisadores descobriram uma redução de 85% no recrutamento de corais (quando as larvas de corais se assentam e se tornam parte de uma população adulta) nos trópicos, enquanto houve um aumento nos sub-trópicos. Os corais podem estar mudando para os pólos, que, segundo os autores, podem não ser capazes de suportar a mesma diversidade de espécies dos trópicos.

  • Boas notícias para o siri-azul: cientistas projetam que invernos mais quentes permitirão que o siri-azul de Chesapeake Bay, uma espécie ecologicamente e economicamente valiosa, tenha estações mais longas e produtivas.

  • As árvores não podem mudar de lugar: está bem estabelecido que o aquecimento levará espécies a se mudarem para climas mais hospitaleiros. Os pesquisadores descobriram agora que 62% da área de floresta tropical (aproximadamente 10 milhões de quilômetros quadrados) não poderão mudar para uma outra faixa climática, em parte devido ao extenso desmatamento. Os autores sugerem que será importante não apenas limitar a perda futura de florestas, mas também concentrar esforços na criação de “corredores climáticos” para melhorar a resiliência das florestas tropicais.

  • Peixes de água doce morrem: os cientistas analisaram um banco de dados de 502 mortes de peixes de água doce e descobriram que elas ocorreram durante períodos de calor extremo e em lagos com temperaturas mais altas que a média. Eles esperam que a morte de peixes possa dobrar em meados do século para os lagos temperados do norte e aumentar em quatro vezes até o final do século, especialmente nas latitudes do sul.

Gelo

  • Geoengenharia da camada de gelo da Antártica: se a camada de gelo da Antártica Ocidental se desintegrar, os mares subirão mais de 3 metros, inundando cidades costeiras como Calcutá, Xangai, Nova York e Tóquio. Os cientistas afirmaram que bombear água do oceano sobre a camada de gelo em uma área do tamanho da Costa Rica – na forma de líquido ou neve – poderia melhorar sua estabilidade. Eles apontaram, porém, que suas simulações de modelo negligenciaram vários mecanismos e reações que poderiam comprometer a estabilidade da camada de gelo, e há incerteza significativa e obstáculos logísticos em sua abordagem.

  • Geleiras de água da maré estão perdendo massa muito mais rapidamente do que se pensava: os cientistas descobriram que os modelos estão subestimando significativamente o derretimento das geleiras que terminam no mar. Estudando uma geleira de água da maré do Alasca, eles perceberam que os dados observacionais indicam uma taxa de degelo até 100 vezes mais rápida do que os modelos existentes prevêem.

  • Gelo marinho antártico declinando vertiginosamente: ao compilar quatro décadas de observações por satélite, um cientista descobriu que, embora a extensão do gelo marinho antártico aumentasse gradualmente desde o final da década de 1970, a partir de 2014, ela reverteu o curso. As taxas de declínio entre 2014 e 2017 excederam em muito as taxas no Ártico.

Emissões

  • A infraestrutura de energia afetará o orçamento de carbono: um estudo estimou que as emissões de infraestruturas de energia de combustíveis fósseis de oito setores irão exceder o orçamento de carbono ligado a limitação do aquecimento em 1.5°C. Os autores concluíram que a infraestrutura existente pode precisar ser reformada antecipadamente ou adaptada com captura e armazenamento de carbono para manter a elevação da temperatura a níveis seguros. Eles também observam que as emissões de dióxido de carbono relacionadas à extração e transporte de combustíveis fósseis, bem como as emissões de dióxido de carbono não energéticas, como as relacionadas ao desmatamento, não estão incluídas. Se estes fossem incluídos nas estimativas, o orçamento de carbono seria ainda mais reduzido.

  • Resolvendo o problema climático através da restauração florestal: usando medições da cobertura florestal, os cientistas descobriram que o mundo poderia restaurar florestas em 900 milhões de hectares, uma área de terra do tamanho dos Estados Unidos. Isso poderia armazenar 205 gigatoneladas de carbono, o que constitui dois terços das emissões totais da atividade humana desde a Revolução Industrial. Por outro lado, eles também descobriram que os impactos climáticos podem reduzir o potencial de restauração em 223 milhões de hectares e que restaurar uma área tão grande não deixa de ter desafios e compensações significativas. Os esforços de restauração precisariam ser realizados com cuidado para levar em consideração a escolha de espécies, implicações socioeconômicas, impactos à segurança alimentar e territorial e efeitos nos ecossistemas.

  • Os elefantes indiretamente ajudam no sequestro de carbono: a presença de elefantes altera as florestas, levando a menores quantidades de árvores e a presença de árvores maiores com alta densidade de madeira e potencial de armazenamento de carbono. Os modeladores projetaram que, se os elefantes fossem extintos, a biomassa acima do solo nas florestas tropicais da África Central diminuiria em 7%, causando um declínio nos estoques de carbono.