À medida que os países se preparam para a COP27 em Sharm el-Sheik, no Egito, para dar continuidade aos avanços no Acordo de Paris, a atenção mais uma vez se volta às peças necessárias para que isso aconteça: os compromissos climáticos dos países para 2030, também chamados de contribuições nacionalmente determinadas (NDCs, na sigla em inglês).

O Acordo de Paris estabeleceu três metas globais – manter o aumento da temperatura do planeta abaixo de 2°C e, idealmente, abaixo de 1,5°C; promover a adaptação e a resiliência; e alinhar os fluxos financeiros com o desenvolvimento resiliente e de baixa emissão. Os compromissos nacionais são os alicerces desses objetivos. Em sua NDC, cada um dos 194 signatários do Acordo de Paris deve estipular suas próprias metas para reduzir as emissões. Muitos também incluem planos para se adaptar aos impactos climáticos e os requisitos financeiros necessários para implementação.

Os países precisam fortalecer suas NDCs a cada cinco anos. A maioria submeteu seus compromissos iniciais em 2015, atualizando-os em 2021. Uma nova rodada de NDCs mais robustas deve acontecer em 2025.

A plataforma Climate Watch, desenvolvida pelo WRI, acompanha mais de 200 indicadores em todas as NDCs. Nosso novo estudo, State of NDCs, analisa esses dados para traçar tendências e avaliar a situação das NDCs no cenário atual. A principal conclusão? Os países estão fazendo alguns progressos ao fortalecer seus compromissos, mas o que realmente precisamos para atingir as metas do Acordo de Paris é uma mudança transformadora e urgente.

A seguir, confira o que sabemos e o que os países precisam ter em mente quando formularem suas novas NDCs em 2025:

1) Apesar dos avanços, os países precisam reduzir as emissões pelo menos 6 vezes mais do que nas promessas atuais.

O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês) mostra que as emissões globais precisam cair pelo menos 43% até 2030, em relação aos níveis de 2019, para estarmos alinhados ao limite de 1,5°C de aquecimento. As NDCs atuais, contudo, só alcançam uma redução de 7% em relação aos níveis de 2019. Embora isso represente 5,5 GtCO2e a menos do que nas NDCs iniciais – quase o equivalente a eliminar as emissões anuais dos Estados Unidos –, os países precisarão de uma redução 6 vezes maior para estar em linha com o Acordo de Paris.

Embora hoje sejam mais países com metas de redução de GEE do que nas NDCs iniciais, e embora alguns países também tenham expandido suas metas para cobrir novos setores e outros tipos de gases de efeito estufa, o impacto dessas mudanças foi modesto. A maior parte do avanço (85%) vem do aumento do rigor das metas dos maiores países, mais do que da inclusão de novos objetivos, setores ou gases poluentes. Encontrar maneiras de acelerar a ambição é fundamental para o sucesso do Acordo de Paris.

gráfico mostra mapa ambição das NDCs

 

2) Os países estão fortalecendo seus planos de adaptação, mas precisam avançar mais rápido e ampliar suas ações.

Nas atuais NDCs, os países quase duplicaram o número de ações prioritárias para adaptação em comparação às NDCs iniciais. Essas ações apresentam uma cobertura mais ampla de setores e sistemas, com mais atenção para segurança alimentar e nutricional, água e soluções baseadas na natureza. Os planos atuais de adaptação também colocam mais ênfase na equidade do que os anteriores, reforçando a preocupação com questões de gênero e inclusão de povos indígenas.

Ainda assim, é preciso fazer mais para implementar medidas de adaptação na velocidade e escala que a crise climática exige. Poucas NDCs incluem indicadores e cronogramas para a implementação dos planos e menos de metade mencionam o monitoramento, avaliação e aprendizagem com a adaptação – elementos fundamentais para garantir que as intervenções planejadas se tornem ações concretas.

gráfico de barras sobre adaptação nas NDCs

 

3) Os níveis atuais de financiamento climático são insuficientes para implementar mesmo uma pequena parte das NDCs.

Embora não seja exigido dos países que reportem as necessidades de financiamento climático nas NDCs, 53% deles (89 países representando metade da população global), todos em desenvolvimento, incluíram uma estimativa da quantia necessária para implementar seus planos. Esses países afirmam que precisarão de US$ 4,3 trilhões: US$ 2,7 trilhões para mitigação; US$ 1,1 trilhão para adaptação; e US$ 475 bilhões para outros fins não especificados.

É importante ressaltar que as necessidades declaradas de 51 países somam um total de US$ 1,5 trilhão para cumprir suas promessas “condicionais” – aquelas que dependem de financiamento internacional para planos de mitigação e adaptação. Esse número supera a promessa das nações desenvolvidas de fornecer US$ 100 bilhões por ano aos países em desenvolvimento até 2020 para apoiar suas ações climáticas – uma meta que eles ainda precisam cumprir. Uma nova meta coletiva de financiamento que deve entrar em vigor depois de 2025 está atualmente em negociação. Estimativas financeiras dos 89 países que precisam de apoio ressaltam a necessidade de mobilizar uma quantidade de recursos substancialmente maior para implementar as NDCs.

gráfico de barra mostra financiamento nas NDCS

 

4) Cerca de 50% dos países em desenvolvimento incluíram perdas e danos em suas NDCs.

O número de países que mencionam custos atuais ou futuros com perdas e danos – as consequências das mudanças climáticas para as quais já não é possível implementar medidas de adaptação – nas NDCs atuais é aproximadamente o mesmo que na rodada inicial. No entanto, mais países têm incluído informações sobre tópicos relacionados, como eventos de início lento, migração induzida pelo clima e oferta de financiamento e capacitação para lidar com perdas e danos. Isso sugere que os países podem priorizar aspectos relacionados a perdas e danos mesmo que não incluam valores específicos na NDC.

Em paralelo, os Pequenos Estados Insulares em desenvolvimento cada vez mais incluem os custos com perdas e danos e tópicos relacionados em suas NDCs, um indicativo de que os países climaticamente mais vulneráveis têm priorizado esse tipo de informação. Apoio adicional para que os países analisem tendências de perdas e danos – incluindo o uso de cenários climáticos – e abordagens para lidar com o problema, como uma gestão de risco mais abrangente, podem tornar essas informações mais precisas na próxima rodada de NDCs.

gráfico de barra mostra perdas e danos nas NDCs

 

5) 81% das NDCs buscam aumentar as fontes de energia renovável, mas poucas visam de forma explícita à redução do consumo de combustíveis fósseis.

Além de metas econômicas gerais para reduzir as emissões de gases do efeito estufa, a maioria das NDCs contêm medidas específicas por setor. As mais populares são as que promovem a energia renovável – 136 NDCs apresentam medidas para impulsionar a geração de eletricidade a partir de fontes renováveis e, dessas, mais de metade traz metas quantitativas.

Mas manter o aquecimento global abaixo de 1,5°C também exige reduzir drasticamente o consumo de combustíveis fósseis – e bem menos NDCs tratam dessa questão de forma explícita. Somente 51 apresentam medidas referentes ao consumo de fósseis, e apenas oito incluem medidas específicas para gradativamente reduzir ou eliminar o uso desses combustíveis.

gráfico de barra mostra energia renovável nas NDCs

 

6) A maior parte das NDCs inclui medidas para florestas e uso da terra, mas a qualidade das ações varia.

Mais de 140 NDCs contêm medidas de proteção de ecossistemas, manejo de terras agrícolas para redução de emissões e restauração de ecossistemas degradados. E setenta e oito apresentam medidas nessas três categorias.

A qualidade dessas medidas, porém, varia de forma significativa. Pouco mais de metade das NDCs apenas inclui metas quantitativas referentes a silvicultura e uso da terra, e muito poucas incorporam medidas essenciais, como as necessidades financeiras e os direitos dos povos indígenas e comunidades locais.

gráfico de barras mostra medidas relacionadas a uso da terra nas NDCs

 

7) As NDCs priorizam a mobilidade elétrica, mas não incluem medidas essenciais para reduzir as emissões do setor de transportes.

Uma abordagem holística para reduzir as emissões do setor de transportes inclui evitar deslocamentos desnecessários, mudar para modos mais eficientes e melhorar a eficiência de veículos e combustíveis. As NDCs atuais incluem melhorias por meio de medidas para promover o transporte elétrico – tais compromissos mais do que dobraram em relação às NDCs iniciais.

O entusiasmo com a mobilidade elétrica, contudo, não veio acompanhado por outras medidas essenciais no setor de transportes. Menos de metade das NDCs apresenta medidas relacionadas ao transporte coletivo. E a mobilidade ativa, o transporte de carga de baixa emissão, transporte marítimo e aviação são mencionados em apenas algumas.

A próxima rodada de NDCs deve assegurar o equilíbrio entre medidas para evitar deslocamentos desnecessários, mudar para modos sustentáveis e melhorar a eficiência dos veículos, considerando tanto o transporte de carga quanto o de passageiros.

gráfico de barras mostra medidas de transportes nas NDCs

 

8) Apenas 15 dos 119 signatários do Pacto Global do Metano incluíram uma meta quantitativa específica para a redução de metano em suas NDCs.

Os países signatários do Pacto Global do Metano, lançado em 2012 na COP26, em Glasgow, se comprometeram a reduzir, coletivamente, as emissões de metano em 30% até 2030 (em relação aos níveis de 2020). Embora cerca de 80% dos signatários incluam o metano no guarda-chuva de suas metas de redução de emissões de GEE, bem menos (apenas 15) estabeleceram metas quantitativas específicas para o metano em suas NDCs. Dessa forma, fica difícil determinar como a meta conjunta do Pacto será cumprida.

A próxima rodada de NDCs é uma oportunidade para que os países membros do Pacto informem como vão contribuir para a redução coletiva de 30% nas emissões de metano até 2030.

gráfico de barras mostra menção a metano nas NDCs

 

9) Cada vez mais, as NDCs reconhecem a importância de promover uma transição justa.

À medida que o apoio a transições justas ganha espaço na agenda da UNFCCC, o mesmo acontece nas NDCs dos países. A ideia de uma “transição justa” é reduzir os impactos negativos que a transição para uma economia de zero carbono pode gerar para trabalhadores, comunidades e cadeias de valor e, ao mesmo tempo, garantir que os benefícios dessa transição sejam distribuídos de forma justa. Nas NDCs iniciais, menções explícitas ao tema eram quase inexistentes, aparecendo apenas no plano da África do Sul.

Entre as NDCs atuais, 32 incluem uma transição justa, embora com diferentes níveis de aprofundamento. Alguns países falam brevemente sobre o conceito – como Maurícia e Islândia – enquanto outros – como África do Sul, Antígua e Barbuda – incorporam o tema de forma mais completa, com parágrafos ou seções dedicadas à transição justa. A próxima rodada de NDCs, além das políticas nacionais, pode detalhar melhor esses esforços.

menções a transição justa nas NDCs

 

Próximos passos para as Contribuições Nacionalmente Determinadas

Conforme o acordo assinado na COP26, em Glasgow, os países devem continuar fortalecendo suas NDCs este ano. Mas, às vésperas da COP27, os avanços parecem ter estagnado.

À medida que os países desenvolvem novos planos para apresentar em 2025, é importante não pensar simplesmente em mais ambição, mas em uma escala de ambição inteiramente diferente, com uma concepção clara das transformações que os países precisam buscar.


Artigo publicado originalmente no Insights.