Treinamento e capacitações são chave para restaurar as florestas e paisagens brasileiras
A restauração de paisagens e florestas é uma estratégia urgente para enfrentarmos a crise climática. As florestas absorvem carbono da atmosfera, ajudando a limitar o aumento da temperatura. Restaurar também é uma importante ferramenta para gerar emprego e renda no campo e tornar a produção agrícola mais resiliente.
Para se ter sucesso na restauração, porém, é preciso compreender as motivações e oportunidades em cada paisagem. A metodologia ROAM (sigla para Metodologia de Avaliação de Oportunidades de Restauração, em inglês), criada pelo WRI Brasil e pela IUCN, atua nessa identificação das motivações. Ao ser aplicada em duas paisagens brasileiras – o Vale do Paraíba Paulista e o norte do Espírito Santo – ela identificou uma estratégia-chave para destravar a restauração em muitas regiões do Brasil: capacitar e treinar produtores rurais.
Capacitar atores locais que já atuam no tema, seja em coletivos e espaços de tomada de decisão sobre como captar recursos para a restauração ou realizando ações executivas de restauração, é uma ação crucial para acelerar e dar escala à recuperação de nossos ecossistemas. Espaços de capacitação permitem, além do fortalecimento de organizações locais com conhecimento e informações para apoiar a implementação de estratégias para alavancar a restauração, trocas de experiências e engajamento nas instâncias de governança presentes nas paisagens.
Preparando organizações para atrair novos recursos para restauração
O WRI Brasil, em parceria com Centro de Pesquisas Ambientais do Nordeste (Cepan), The Nature Conservancy (TNC), Universidade Federal de Viçosa (UFV) e comitês de bacias hidrográficas, promoveu capacitações com organizações locais em três paisagens: Vale do Paraíba Paulista, Norte do Espírito Santo e Zona da Mata Mineira. O objetivo foi apresentar para os atores locais quais são os elementos mais importantes para elaborar projetos de restauração e quais os caminhos existentes para captar recursos de instituições financeiras ou outras fontes.
As capacitações partiram de uma estrutura similar para as três regiões, mas um detalhe que as tornou mais produtivas e interessantes para o público foi trazer elementos específicos de cada paisagem. Isso permite manter a adesão da população local, personaliza os treinamentos e abre frentes de discussão ricas em propostas para solucionar os problemas de cada comunidade.
Por exemplo, no Espírito Santo as condições locais indicam um baixo potencial para a regeneração natural, as áreas degradadas são vastamente ocupadas por pastagens de baixa produtividade e há comunidades quilombolas e de agricultura familiar contracenando com grandes extensões de monoculturas de eucalipto. Para que projetos de restauração sejam bem-sucedidos nesse cenário, os participantes das capacitações apresentaram ideias de novos arranjos institucionais que combinam a produção de alimentos, a manutenção das comunidades tradicionais e a geração de renda. São soluções que permitem não só a restauração, mas garantem também equidade social e de gênero e novas oportunidades de atuação na cadeia produtiva da restauração em longo prazo.
No Vale do Paraíba Paulista, a capacitação foi promovida com apoio da Câmara Técnica de Restauração Florestal do Comitê de Bacia Hidrográfica do Paraíba do Sul e da Rede de Atores da Restauração. A abordagem nessa paisagem focou nas diferentes possibilidades de elaboração de projetos de acordo com a legislação e também apresentando uma diversidade de fontes de recursos que podem ser acessadas de acordo com os perfis das organizações. Como já há uma quantidade grande de organizações presentes na paisagem, alguns temas se mostraram importantes para a agenda da restauração na região, como quais são os possíveis arranjos para projetos de restauração, quais as especificidades necessárias para alavancar novos recursos, e como fortalecer tecnicamente os projetos já existentes.
Na Zona da Mata mineira a capacitação aconteceu por meio do programa Conservador da Mantiqueira. O objetivo foi apoiar gestores municipais na elaboração de projetos vinculados a programas de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA). A capacitação apresentou conceitos e informações sobre PSA para os gestores, indicando como os municípios podem usar diferentes estratégias para captar e direcionar recursos para a restauração florestal e como avançar em políticas municipais de incentivo à restauração.
Promovendo a diversidade e inclusão
Um elemento muito importante nesses três exemplos foi a decisão de organizar as capacitações considerando critérios de paridade de gênero e a diversidade étnico-racial.
Durante a organização de todas as capacitações, a seleção de participantes e palestrantes considerou critérios de inclusão e diversidade, para garantir representatividade de gênero e setores. Fomentar iniciativas com essa abordagem apoia caminhos para o desenvolvimento de soluções mais efetivas na direção de uma sociedade mais justa e sustentável.
Em todos os casos estudados, observou-se que o movimento de inclusão e diversidade de atores foi capaz de enriquecer os encontros realizados, agregando um conjunto de narrativas, conhecimentos e experiências aos momentos de discussão durante as atividades práticas realizadas. As capacitações se tornaram espaços mais plurais e representativos, valorizando os saberes de participantes, trazendo maior robustez nas discussões e reforçando a importância do tema, considerando o caráter transversal da restauração.
A Década da Restauração de Ecossistemas
Desenvolver capacidades é uma das estratégias da Década das Nações Unidas da Restauração de Ecossistemas. Portanto, os exemplos acima são passos para seguir trilhando rumo ao ganho de escala da restauração de paisagens e florestas.
Conectar as ações e fortalecer parcerias entre as instituições que atuam nessa agenda resultará em melhores estratégias e ações de restauração. Trazem ainda maior robustez para que os projetos consigam atrair mais recursos para apoiar organizações locais. O conhecimento compartilhado é uma ferramenta primordial para engajar pessoas e garantir que os diferentes grupos de atores que estão conectados de alguma forma com a agenda da restauração possam efetivamente participar de espaços de tomada de decisão e planejamento.
*Fabiane Santos é coordenadora técnica do Cepan; Valéria de Fatima Silva é doutoranda em engenharia florestal; e Marina Campos é especialista em restauração da TNC.