Transforming Transportation: a promessa e a realidade da Nova Mobilidade
Este post foi escrito por Schuyler Null, Talia Rubnitz e Hillary Smith e publicado originalmente no TheCityFix.
Quando o primeiro Transforming Transportation (TT) foi lançado 16 anos atrás, o cenário dos transportes era bem diferente. Serviços de viagem sob demanda (ride-hailing) eram desconhecidos. Sistemas de bicicletas compartilhadas eram restritos a apenas algumas cidades. Smartphones ainda eram uma realidade alguns anos distante. Ninguém havia ouvido falar em Facebook ou Twitter.
Hoje, o transporte se transforma em ritmo acelerado, impulsionado por novas tecnologias e negócios disruptivos, e o setor é reconhecido como fundamental para o desenvolvimento global e para as metas climáticas.
"Quando falamos em Nova Mobilidade, estamos na verdade falando sobre o principal objetivo do Banco Mundial, a erradicação da pobreza", disse Kristalina Georgieva, CEO do Banco Mundial, no primeiro dia do TT 2019, em Washington, nos Estados Unidos.
"A Nova Mobilidade está oferecendo a chance de remodelar não apenas a maneira como nos movemos do ponto A ao B, mas remodelar nossas cidades, nossas economias e até mesmo nossas sociedades", concordou Andrew Steer, presidente e CEO do WRI. "A capacidade de revolução da Nova Mobilidade é colossal."
Bicicletas sem estações, patinetes elétricos, companhias de serviços de viagem sob demanda em rede e veículos autônomos podem ajudar as cidades a substituírem espaço viário por espaço verde, habitações acessíveis e outros usos; reduzir as mais de 1,35 milhões de mortes anuais em estradas; expandir as oportunidades econômicas; reduzir a poluição tóxica do ar; e ajudar a conter o aquecimento global.
No entanto, esses resultados não estão garantidos, ressaltaram ministros, prefeitos e especialistas de transporte ao longo do evento coorganizado pelo Banco Mundial e pelo WRI.
Muito rápido ou ainda não o suficiente?
"Na maioria dos lugares, o transporte, como conhecemos, não está funcionando bem", disse Dan Sperling, diretor fundador do Institute of Transportation Studies e professor na universidade de California Davis.
Serviços da Nova Mobilidade prometem um novo caminho: viagens compartilhadas que reduzem drasticamente a necessidade de estacionamentos e carros individuais; conectividade da "última milha" para sistemas mais eficientes de transporte coletivo; e opções seguras e de acesso fácil de micromobilidade.
Mas muito desse potencial não é utilizado até hoje e – os palestrantes do TT demonstram bem isso – existem muitas divergências sobre como exatamente começar a destravar esse potencial, seja em países desenvolvidos ou em desenvolvimento.
"Tecnologia por si só não é suficiente", disse Makhtar Diop, vice-presidente para Infraestrutura do Banco Mundial. "Se você não une tecnologia com as políticas certas, você não está experimentando seu impacto completo. Precisamos pensar sobre transporte como um serviço que está ajudando os mais pobres e que é acessível."
Sperling incitou formuladores de políticas públicas a focar nas transformações graduais, em vez de "tiros na Lua" e no cenário futurista dos carros autônomos dominando as ruas das cidades, fato que não é iminente. "É bom ter visão, mas precisamos saber o que podemos fazer agora que faça sentido." Desafios tradicionais da mobilidade, como melhorar a capacidade dos transportes coletivos e ampliar o acesso a todos os cidadãos, devem ainda ser o foco dos governos e comunidades, afirmou ele.
"Até o final do ano, os Estados Unidos vão registrar mais usuários no Uber e no Lyft do que no sistema de ônibus", afirmou Daniel Sperling
Outros, no entanto, pediram por uma incorporação mais rápida dos serviços e tecnologias da Nova Mobilidade.
"Não estamos nos movendo rápido o suficiente", disse Regina Clewlow, CEO da Populus, uma companhia de dados. "Precisamos que três coisas aconteçam para termos sucesso: mobilidade compartilhada, automação e eletrificação. Nenhum desses é mais importante que o outro – precisamos de todos."
Pelo bem da sustentabilidade, precisamos nos mover "10 vezes mais rápido do que atualmente", afirmou Robin Chase, co-fundadora da Zipcar, que essa semana lançou a NUMO, uma aliança global para "criar cidades felizes em que a sustentabilidade e a mobilidade justa são o novo normal". Para alcançar a meta climática de 1.5°C, emissões de transporte devem ser reduzidas em 40% até 2050, ao mesmo tempo em que os serviços precisam expandir.
Transporte é também fundamental para cumprir diversos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, como a redução da pobreza e a melhoria da saúde. "Não podemos pensar em transporte como um setor singular, mas como ele é integrado a quase todas as soluções", disse Georgieva.
Nos últimos 25 anos, mais de um bilhão de pessoas foram tiradas da pobreza, mas ainda existem quase 800 milhões para resgatar, ressaltou ela. "Se você é uma dessas pessoas que encaram desafios inacreditáveis a cada dia, o fato de que estamos sendo bem-sucedidos em outros lugares não significa nada."
"Tudo tem que acontecer hoje"
Serviços da Nova Mobilidade estão aí, mas as incertezas que envolvem seus impactos foram destacadas por líderes de cidades da América Latina e África, que indicaram dificuldades para transformar suas promessas em realidade.
"Trabalhar no mundo em desenvolvimento dá oportunidades", disse Mauricio Esteban Rodas Espinel, prefeito de Quito. Ele observou que, diferente das cidades ocidentais onde o uso pessoal do carro é alto, 73% da população de Quito já utiliza o transporte coletivo. "Existe uma oportunidade gigante de fornecer serviços de alta qualidade para todos."
Mas Espinel também afirmou que quando Quito começou a pensar em adquirir ônibus elétricos, havia uma incerteza significativa sobre a tecnologia das baterias e como elas iriam interagir com a elevada altitude da cidade. Eles não obtiveram uma resposta clara.
"A África é onde tudo está acontecendo, tudo é urgente e tudo tem que acontecer hoje", destacou Alioune Badiane (Foto: WRI)
Solomon Kidane Zegeye, vice-prefeito de Addis Ababa, afirmou que ainda que o potencial da Nova Mobilidade seja frequentemente aclamado, a maioria das soluções são desenvolvidas primeiro para os países desenvolvidos. Isso faz com que seja difícil adaptá-las em contextos com menos infraestrutura existente ou conhecimento técnico. Ele observou, por exemplo, que o fornecimento de eletricidade em Addis Ababa é limitado e não muito confiável, e existem poucos eletricistas qualificados para serviços em veículos elétricos. Para Zergeye, sucesso é apenas aumentar o número de viagens por residente na cidade para além dos atuais 1,2 por dia, criando uma sociedade mais móvel.
"Antes de ir para a última milha, precisamos começar com a primeira", disse Alioune Badiane, presidente da Urban Think Tank Africa, com sede no Senegal. A África precisa de aproximadamente US$100 bilhões de investimento em infraestrutura a cada ano. Como os serviços de Nova Mobilidade podem complementar os sistemas de transporte de massa quando não existem opções públicas, ou quando são escassas ou nem existem redes viárias? O desafio, disse Badiane, é compensar esse atraso na infraestrutura – primeiramente através de subsídios do governo – em meio a um cenário onde "tudo precisa acontecer hoje".
Quando se trata do potencial das tecnologias da Nova Mobilidade, disse Jarrett Walker, autor do Human Transit, "precisamos ser céticos, mas não cínicos".
Transforming Transportation é uma conferência anual organizada pelo Banco Mundial e WRI Ross Center for Sustainable Cities em Washington. O tema deste ano foi "A Nova Mobilidade proporcionará transporte sustentável para todos?".