Em meio às comemorações do seu 432º aniversário, João Pessoa se prepara para inserir uma nova abordagem para basear o seu planejamento: a ideia de “humanizar” a cidade. Inserida na Rede Nacional para a Mobilidade de Baixo Carbono, a capital da Paraíba projeta uma Rua Completa no Centro Histórico. A cidade atualmente inicia o processo de revisão do Plano Diretor, estabelecido em 1992, e a construção do seu Plano Diretor de Mobilidade Urbana. É a partir da concepção de uma rua que João Pessoa pode estar assumindo uma nova forma de planejar a cidade.

João Pessoa é a terceira cidade mais antiga do Brasil e já passou por diversas alterações em seu território. Assim como grande parte das capitais, a cidade sofreu nos últimos anos um rápido aumento no número de habitantes. Segundo dados do IBGE, entre 2000 e 2010, João Pessoa teve o segundo maior crescimento populacional na região nordeste do Brasil. Como consequência dessa expansão, a capital paraibana viu diversos problemas relacionados ao transporte e à qualidade do ar aumentarem. Em 2010, 63% das emissões de CO2 eram advindas do transporte. Com a urbanização, o crescimento da frota de carros e motocicletas também contribuiu para o aumento das emissões do transporte. Porém, de acordo com o Plano de Ação João Pessoa Mais Sustentável, o saldo de emissões da Microrregião de João Pessoa ainda é bem abaixo da média mundial e, ainda assim, a cidade busca melhorar ainda mais a qualidade de vida da população.

O primeiro passo dado foi a escolha de uma rua para passar por um redesenho urbano. João Pessoa é a sexta cidade a receber o workshop que se insere nas atividades da Rede e é realizado pela equipe do programa de Cidades do WRI Brasil, em parceria com a Frente Nacional de Prefeitos (FNP) e apoio do Instituto Clima e Sociedade (ICS). O evento contou com a presença de gestores e técnicos da cidade e dos municípios paraibanos de Pombal, Patos, Campina Grande e Monteiro. O prefeito de João Pessoa, Luciano Cartaxo, participou da abertura do workshop e destacou a importância do projeto. “Nesse momento de tanta turbulência econômica no Brasil, é um desafio pautar as questões do dia a dia das cidades. Porém, mesmo dentro desse cenário é possível trabalharmos boas ideias e bons projetos com a ajuda de parceiros”, afirmou Cartaxo, ao agradecer o apoio da FNP.

“Sabemos dos problemas de mobilidade das capitais brasileiras e João Pessoa escolhe justamente uma rua muito importante em uma área que é um polo de desenvolvimento cultural e econômico da cidade. Daremos o nosso primeiro passo aí”, destacou Cartaxo.

A via escolhida por João Pessoa é a Avenida Visconde de Pelotas, localizada no centro da cidade. Com 603 metros de extensão, a Avenida é local de intenso comércio e fluxo de pedestres, que se misturam entre os carros que trafegam em duas faixas. Em ambos os lados da via é permitido o estacionamento de veículos, o que aumenta a dificuldade para a travessia dos pedestres. É também muito comum a presença de camelôs, que aproveitam o fluxo de pedestres para vender frutas, doces e outros produtos.

O que faz desse projeto particularmente desafiador é o fato de a Visconde de Pelotas estar inserida em uma área de tombamento do centro histórico de João Pessoa. Ela abriga ainda a Igreja de Nossa Senhora do Carmo, a Igreja de Santa Tereza e a Arquidiocese Paraibana, que fazem parte do acervo de construções históricas da capital. Localizada na Praça Dom Adauto, a Igreja de N. Sra. Do Carmo, um dos principais pontos turísticos da cidade, é construída em estilo barroco-rococó e data de meados do século XVII.

“A escolha da Avenida Visconde de Pelotas se deu por ela estar inserida dentro do centro histórico de João Pessoa, que tem um movimento muito grande de pedestres, um comércio pleno e prédios históricos. Ela passa por um processo de degradação e carece de uma nova proposta de definição do uso que se faz do local”, explicou o superintendente da Superintendência Executiva de Mobilidade Urbana (Semob), Carlos Batinga. Segundo ele, João Pessoa necessita de um programa de reestruturação e humanização dos seus projetos.

O Plano Diretor está sendo revisado e deve ser concluído em 2018, assim como o Plano de Mobilidade Urbana. “Acredito que esses debates estabeleçam um caminho muito importante, especialmente neste momento que vive João Pessoa. A escolha dessa grande avenida da cidade já é o início de um projeto focado na humanização, na reutilização principalmente voltada ao pedestre e ao transporte coletivo e também de valorização do comércio e dos serviços da região”, ressaltou Batinga.

De acordo com Daniel Roque, arquiteto e urbanista da SEMOB, os carros trafegam a uma velocidade média de 30 km/h devido ao grande fluxo de pessoas que atravessam na via. Essa relação conturbada entre os pedestres e os veículos é um fator comentado por diversas pessoas que frequentam a região. Júnior Soares da Silva, 32 anos, comerciante, destacou o grande número de crianças que circulam pela avenida devido à proximidade com uma escola de ensino infantil: “Muitas pessoas, mães com os filhos, arriscam se machucar andando entre tantos carros. Poderíamos mexer em todo esse espaço de estacionamento, que ocupa muito da rua. Os carros param na frente das lojas, mas é muito melhor mais pessoas passando na calçada do que usar esse espaço para os carros”.

A mesma opinião expressou o político Janduí Paulo, 66 anos: “Por mim não passava carro nessa rua, até por consideração a essa enorme igreja que temos aqui. Para o pedestre é muito difícil se locomover. Os carros poderiam ser desviados para outra rua”. O comerciante Edson da Silva, 48 anos, aponta que "O trânsito está atrapalhando muito. Ou tem espaço para as pessoas ou para passar carro”.

“Precisamos de mais sinalização aqui também, mais travessias. Além do melhoramento das calçadas. Como elas estão não é possível caminhar sem precisar ir para a rua”, contou Francisco Leite, 62 anos, advogado. A melhoria da iluminação e a reabilitação especialmente da praça Dom Adauto, são ideias destacadas pela aposentada Beti Fernandes, 79 anos. Frequentadora diária da Igreja de Nossa Senhora do Carmo, Beti quer mais árvores, mais bancos e mais fiscalização na praça que abriga a igreja.

Segundo os frequentadores, à noite a avenida fica vazia. “Depois das 18h, todas as lojas fecham as portas e as grades e ninguém mais transita”, conta Edson. A Avenida conta com cerca de 55 casas comerciais, mas não possui atualmente nenhum estabelecimento que permaneça aberto durante a noite. Dessa forma, a via se torna um local vazio e sem atrações.

Durante o workshop, os participantes foram divididos em quatro grupos para pensar nas possíveis intervenções a serem feitas na Visconde de Pelotas. As ideias servirão de insumo para a elaboração do projeto da Rua Completa que será debatido também em encontros com a população.