As empresas de saneamento e abastecimento de água podem ser grandes aliadas na construção de uma nova economia florestal, sustentável e de baixo carbono. A importância delas para a população e para as áreas urbanas é bem conhecida, afinal as cidades dependem de água potável e tratamento de esgoto. Porém, para além disso, elas podem desempenhar também um papel-chave na restauração de paisagens e florestas.

As empresas de abastecimento têm muito a ganhar com a restauração. As florestas atuam como filtro de sujeira e sedimentos, tornando os rios e reservatórios mais limpos e reduzindo custos no tratamento de água. Além disso, há evidências de que recuperam nascentes e ajudam na própria produção de água no meio rural.

Em Minas Gerais, o WRI Brasil identificou, durante a aplicação da metodologia ROAM no Vale do rio Doce mineiro – uma metodologia que mapeia atores da restauração e identifica oportunidades e motivações para se restaurar uma paisagem – que a COPASA MG é um ator importante para a restauração na região.

A COPASA MG é a empresa que abastece 640 municípios de Minas Gerais, incluindo a capital Belo Horizonte. Em parceria com a Agência Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e de Esgotamento Sanitário do Estado de Minas Gerais (Arsae-MG), foi criado o Programa Pró-Mananciais, que destina recursos para a restauração, além de ter um compromisso com a mobilização social e o engajamento das comunidades locais. Isso faz da empresa uma das que lideram a agenda da restauração na paisagem.

Organizando os atores locais em “colmeias”

A COPASA MG é uma empresa de economia mista de saneamento atuando majoritariamente no abastecimento de água e coleta e tratamento de esgoto. A partir do Pró-Mananciais, passou a ser incluído na tarifa de água paga pelos consumidores de todos os municípios atendidos pela empresa um percentual específico para ações socioambientais de proteção de mananciais. O Pró-Mananciais tem como objetivo proteger e recuperar as microbacias hidrográficas e as áreas de recarga dos aquíferos dos mananciais utilizados para a captação de água para abastecimento público das cidades operadas pela empresa. Para alcançar os objetivos, o programa tem orçamento anual de 0,5% da receita operacional da empresa – cerca de R$ 27 milhões – para implementar ações.

Ainda mais interessante é a forma como esse recurso é aplicado na ponta: a partir de uma estrutura diferenciada de gestão que privilegia a participação local. Essa estrutura é chamada de Colmeias (Coletivos Locais de Meio Ambiente).

A criação da Colmeia é a primeira ação do programa quando chega em um município. A ideia é partir de mobilização social, responsabilidade compartilhada, solidariedade, criatividade e protagonismo para nortear uma boa gestão. Assim, os coletivos são compostos pela equipe da COPASA MG, mas também por instituições locais interessadas em contribuir com a recuperação e preservação das bacias hidrográficas e áreas de recarga dos mananciais de abastecimento de água dos municípios inseridos no programa.

Os atores relevantes de um município participam dessa rede e tomam a decisão de como o recurso será utilizado – sempre relacionado à melhoria da água e à sustentabilidade ambiental. Dessa forma, é a população local que decide qual a melhor estratégia a ser aplicada, que pode ser desde a restauração ou recuperação de uma área nativa até a construção de barraginhas ou recuperação de solo erodido, entre outras.

Capacitar para dar escala

Com recursos e uma estrutura local organizada, o elemento seguinte para ajudar a dar escala na restauração de paisagens e florestas em Minas Gerais foi o da capacitação e conhecimento. Fortalecer as capacidades locais e trazer conhecimento para essas Colmeias é fundamental. Com apoio, capacitação e conhecimento, a organização disponibiliza as ferramentas que cada colmeia pode utilizar para promover a restauração de paisagens e florestas em cada município.

O WRI Brasil apoiou a realização de capacitações sobre as ferramentas ROAM para técnicos da COPASA MG que trabalham com as Colmeias no município. Com a capacitação, a empresa espera fortalecer ainda mais as Colmeias com a visão integrada dos atores sociais que compõem ou podem ser atores-chave para compor o coletivo, utilizando para isso o mapeamento da paisagem social. Outra ferramenta importante para apoiar as estratégias do programa é o mapeamento de oportunidades de restauração, que também foi alvo da capacitação.

Uma vez feitas as capacitações, a aplicação da metodologia ROAM se dará inicialmente a partir de três projetos pilotos, em três municípios mineiros diferentes: Santa Maria do Suaçuí, Vargem Alegre e Ipaba, que integram a bacia do Rio Doce. O objetivo é atender as motivações de cada município – que pode ser em mapeamento de atores, na aplicação de toda a metodologia, ou na utilização de outras ferramentas.

O programa já restaurou através de técnicas ativas e passivas, aproximadamente 1,2 mil hectares de Área de Preservação Permanente em todo o estado e tem potencial para muito mais. Parcerias com instituições de pesquisa, assistência técnica e extensão rural, aliadas a uma governança bem articulada, com engajamento da comunidade local, têm sido o diferencial desse programa que pode contribuir muito com as metas de restauração assumidas pelo Brasil.

Restauração e agenda da água

Apesar da crise hídrica de 2020 não ter sido forte em Minas Gerais – ela foi particularmente forte em outros 5 estados – nenhuma região está imune. Minas já enfrentou crises hídricas no passado, e pode se fortalecer para evitar problemas no abastecimento.

A restauração florestal tem aparecido como uma solução baseada na natureza que, junto com medidas de infraestrutura tradicional (como barragens e represas), pode trazer grandes benefícios para a sociedade.

O WRI Brasil e parceiros, por meio de uma série de estudos, vêm demonstrando que a restauração florestal não apenas melhora a qualidade da água nos reservatórios, como é um investimento economicamente viável, trazendo retorno financeiro para as empresas de abastecimento por meio da redução de custos com produtos químicos para o tratamento de água e operações de dragagens nos reservatórios.

Esses estudos identificaram os seguintes retornos:

  • Em São Paulo, a restauração de 4 mil hectares de florestas resulta na economia de R$ 338 milhões;
  • No Rio de Janeiro, a restauração de 3 mil hectares de florestas resulta na economia de R$ 259 milhões;
  • Na Grande Vitória, a restauração de 2,5 mil hectares de florestas resulta na economia de R$ 93 milhões.

Em Minas, a COPASA MG pode desempenhar um importante papel na restauração, garantindo bons resultados econômicos, a recuperação de nossas paisagens e água de qualidade e em quantidade para a população mineira.

* Maíra Fares Leite é coordenadora do Programa Pró-Mananciais.