No Brooklyn, um dos cinco distritos da cidade de Nova York, um novo pátio escolar com árvores nativas recém-plantadas oferece sombra e um playground vibrante ao lado de um campo de atletismo e grama sintética. A área é cercada por murais coloridos que celebram a diversidade do bairro Boreum Hill, onde está localizado o espaço. Idosos jogam xadrez enquanto as crianças correm. A área poderia facilmente ser confundida com um parque – não fosse pela sinalização da escola no prédio ao lado.

A Pacific School (PS 38K) é uma das mais de 220 escolas públicas da cidade de Nova York que transformaram pátios de concreto em espaços comunitários nas últimas duas décadas graças à iniciativa chamada Green Community Schoolyards (“Pátios Escolares Verdes e Comunitários”), da Trust for Public Land (TPL). O programa visa criar espaços verdes seguros e acessíveis onde os moradores de Nova York – em especial os que vivem nos bairros mais desfavorecidos – possam se reunir perto de casa para conviver e se conectar com a natureza.

“Eu cresci em Nova York e brincava em um playground asfaltado”, relembra Mary Alice Lee, diretora da TPL. “Era ao lado de um parque, e eu ficava olhando pela cerca de arame pensando que não era justo não podermos aproveitar as árvores, a sombra.”

brinquedos em pátio escolar bonito e novo
O programa Green Community Schoolyards, do Trust for Public Land, promove a transformação de espaços escolares públicos, como esse playground da Pacific School (PS 38K), para que tanto os alunos quanto a comunidade possam aproveitá-los. (Foto: WRI)

Desde então, Lee dedicou sua carreira a criar espaços abertos e acessíveis onde os nova-iorquinos possam aproveitar o ar livre. “Acho que toda criança merece um lugar para brincar”, diz ela.

Mas a iniciativa oferece muito mais do que oportunidades de lazer e construção de laços comunitários. Em uma paisagem urbana dominada pelo concreto, pátios escolares verdes também se tornam espaços essenciais para ajudar a amenizar o calor e as inundações cada vez mais intensos que afetam Nova York.

Pátios escolares verdes e comunitários são uma resposta às necessidades climáticas de Nova York

Nova York foi apelidada de “selva de pedra” em meados dos anos 1900. A paisagem urbana tomada por arranha-céus, as calçadas e ruas movimentadas são características marcantes da cidade. Com as temperaturas aumentando e o efeito de ilha de calor urbana agravando o calor extremo, Nova York se vê diante de uma necessidade crescente de espaços verdes, áreas mais frescas e com sombra onde todos possam se divertir, conhecer vizinhos e formar laços com suas comunidades.

Nova York conta com apenas 2,2 playgrounds públicos a cada 10 mil habitantes – uma taxa muito inferior à média de 3,1 playgrounds registrada nas 100 maiores cidades dos Estados Unidos. As centenas de pátios escolares comunitários criados pela TPL são um esforço para diminuir essa escassez. O programa já conseguiu tornar os playgrounds acessíveis a mais da metade da população de Nova York: atualmente, cinco milhões de pessoas vivem a no máximo 10 minutos de caminhada de um espaço verde. A TPL estima que 220 mil crianças e outros cidadãos sejam diretamente beneficiados pelos novos espaços.

vista aérea de pátio escolar verde
Uma vista aérea do novo pátio da escola PS 107X mostra áreas de lazer coloridas, quadras esportivas e locais para sentar à sombra. O espaço, transformado pelo programa Green Community Schoolyards, do Trust for Public Land, apresenta superfícies permeáveis para uma gestão eficaz da água. (Foto: WRI)

“Mais de 70% da superfície de Nova York é impermeável”, explica Melissa Enoch, comissária adjunta do Departamento de Planejamento Ambiental de Nova York. “Ou seja, pavimentamos a maior parte do nosso solo. E, com isso, estamos impedindo que as águas pluviais penetrem no solo como acontecia antes”, avalia.

Sem solos e terrenos naturais suficientes para absorver a água da chuva, as cidades correm mais risco de inundações durante chuvas extremas. Em 2012, por exemplo, o furacão Sandy devastou Nova York com inundações sem precedentes. Em apenas 48 horas, a tempestade danificou 69 mil unidades residenciais, deixou centenas de milhares de sem energia e limitou serviços essenciais como acesso a alimentos, água potável e assistência médica para pessoas em todos os cinco distritos. À medida que a cidade se recuperava, buscando se tornar mais resiliente diante de futuros eventos climáticos extremos, o Departamento de Proteção Ambiental estabeleceu uma parceria com a TPL para garantir que todos os novos pátios escolares construídos contassem com infraestrutura verde.

Esses locais agora servem como uma rede de infraestrutura física e social, aliviando os riscos de inundações e os efeitos das ilhas de calor urbanas e fornecendo acesso a espaços verdes a cinco milhões de moradores na cidade.

Estudantes e vizinhos se apropriam dos pátios das escolas

Um componente diferencial da iniciativa é que as crianças são envolvidas no processo de planejamento. A TPL introduziu aulas sobre ciência climática e gestão de águas pluviais no currículo escolar para educar os alunos sobre a importância da absorção de água, sombra, espécies nativas e jardinagem, componentes essenciais em um pátio escolar verde. Depois disso, os alunos participam do planejamento do pátio de suas escolas, contando com a facilitação da TPL e da empresa de arquitetura responsável, o Studio HIP.

mulher apresenta projeto de pátio escolar para crianças
Depois de aprender sobre gestão de águas pluviais, fluxo de água, espaços verdes e o efeito de ilha de calor urbana, os alunos da escola IS 52M apresentaram seus próprios projetos para o pátio da escola. Cada pátio é único e dá aos alunos um senso de orgulho e pertencimento. (Foto: WRI)

“Tínhamos muitas poças no quintal quando chovia”, diz Pascale Pradel, diretora da PS 38K The Pacific School, no Brooklyn. “[Quando] nossos filhos viram o processo de construção do pátio, entenderam a importância de desviar a água das ruas – e sentiram que estavam fazendo a diferença no ambiente da nossa escola”, acrescenta

Participar do processo de planejamento desafia as crianças a pensar sobre outras necessidades além das suas, como equipamentos de playground para as crianças mais novas e espaços à sombra para os cuidadores. “É um sentimento muito reconfortante”, reflete Alex, agora um aluno da oitava série. “Comecei esse projeto quando estava na sexta série. E saber que, quando eu for adulto, ainda haverá crianças que poderão brincar aqui é uma ideia muito legal.”

crianças brincando em pátio escolar
Os alunos podem balançar, escalar e brincar no novo pátio da escola PS 107X, transformado pelo programa Green Community Schoolyards em um espaço vibrante e colorido para atividades ao ar livre. (Foto: WRI)

Para garantir que os pátios atendam às diversas necessidades da comunidade do bairro fora dos turnos escolares, o programa também conta com a colaboração de grupos locais de idosos, clubes esportivos, centros culturais e outras entidades locais. Envolvendo as crianças e a comunidade no planejamento dos espaços por meio de ações de participação popular, o programa cria um senso de pertencimento e incentiva o zelo pelo espaço a longo prazo.

Para continuar avançando

Diante do impacto dos pátios verdes nos alunos e comunidades, além dos benefícios oferecidos pelos espaços em termos de resiliência climática, não é de se admirar que Nova York continue promovendo o projeto. Vários departamentos municipais contribuem com a iniciativa, e a cidade até incluiu o projeto em seus planos formais de infraestrutura verde e mitigação de enchentes.

A TPL estabeleceu uma parceria público-privada para garantir a continuidade do programa. Nesse modelo, diferentes fontes públicas de recursos, como o Gabinete do Prefeito e o Departamento de Proteção Ambiental, fornecem financiamento; doadores privados cobrem os custos programáticos; e a TPL realiza a implementação do projeto junto às comunidades. A TPL também trabalha junto à Autoridade de Construção Escolar da Cidade de Nova York para garantir que os projetos sejam concluídos dentro do período que um aluno passa na escola.

jovens plantando mudas de árvores
Alunos da Lab School 333 cultivam plantas e aprendem sobre a produção de alimentos como parte do programa Green Community Schoolyards. (Foto: WRI)

A relativa simplicidade do programa – transformar lotes vazios de asfalto em espaços comunitários verdes e vibrantes – torna esse tipo de intervenção altamente replicável e facilita a implementação em escala. Até o momento, projetos semelhantes foram concluídos em outras 15 cidades dos Estados Unidos, incluindo Filadélfia, Tacoma, Washington e Oakland, todas com formas, densidades urbanas, estruturas de governança e clima diferentes (incluindo até mesmo climas desérticos). Atualmente, a TPL também trabalha em um programa federal para reservar US$ 150 milhões por ano para renovações de pátios escolares de todo o país a partir do modelo utilizado pela organização, que abrange design verde, envolvimento dos alunos e gestão comunitária.

Para Lee, não há recompensa maior do que ver os parques movimentados com diversas atividades. “Adoro poder fazer parte desse projeto. É muito importante para mim que estejamos criando esses espaços verdes para a população... Para pessoas que talvez não tenham acesso a espaços assim. Elas podem sentar na sombra, sentir o cheiro das flores, se divertir e relaxar. Também podem correr na pista ou jogar futebol. É realmente maravilhoso dar esse presente às pessoas da cidade”, celebra.

O ciclo de 2023-2024 do WRI Ross Center Prize for Cities celebra projetos e iniciativas que incentivam a construção de comunidades preparadas para os desafios climáticos. O vencedor do prêmio principal será anunciado entre cinco finalistas no dia 25 de setembro.

Este blog foi publicado originalmente no Insights.