Pactos abrem caminho para produzir, proteger e incluir na Caatinga
Com uma população de mais de 25 milhões de pessoas e um habitat extremamente vulnerável às mudanças climáticas, a Caatinga enfrenta nos tempos atuais um momento de decisão. É preciso fazer a virada para uma produção sustentável de alimentos, com restauração e inclusão social. A urgência é cada vez mais evidente. Dados do MapBiomas entre 2020 e 2021 mostram um cenário de aumento de desmatamento e degradação do bioma.
Mas o que pode ser feito nessa região? Uma série de estudos mostram que as ações de sustentabilidade numa paisagem precisam estar alinhadas com as motivações da população e oportunidades locais. Ferramentas como a metodologia ROAM, por exemplo, ajudam a identificar quais são essas motivações, e análises de redes de atores nos permitem conhecer melhor quem são as pessoas e comunidades que precisam ser incluídas para garantir uma transição justa em cada região.
É pensando em ações que realmente atendam as demandas da comunidade que o WRI Brasil participa do programa Raízes da Caatinga, conduzido pela IDH e que também conta com a participação da Diaconia. Esse programa busca articular e mobilizar as populações locais em três paisagens da Caatinga. Neste final de 2023, o programa atingiu um importante marco inicial: a assinatura de memorando de entendimento e acordos com prefeituras que dão o primeiro passo na criação dos Pactos PPI na Caatinga.
O que são os Pactos PPI: produzir, proteger e incluir
Os Pactos Produzir, Proteger e Inclui (PPI) são compromissos territoriais firmados por atores dos setores privado, público e da sociedade civil organizada, pelos quais estabeleceram-se metas nos eixos da produção sustentável, proteção da vegetação nativa e inclusão social.
Os Pactos são articulados pelo IDH, que traz a experiência de um pacto similar, porém chamado PCI – Produzir, Conservar e Incluir –, firmado junto com o estado do Mato Grosso em 2015, durante a Conferência da ONU de Mudanças Climáticas (COP21). No Mato Grosso, a inciativa prevê aumentar a produção e a eficiência agrícola, conservar a vegetação natural remanescente e melhorar a inclusão socioeconômica de pequenos agricultores e comunidades locais.
O que os Pactos trazem de novo para a Caatinga
Na Caatinga, esses pactos começaram a ser construídos entre junho e agosto, com a assinatura de cartas de intenção com o setor público, privado e sociedade civil nas regiões do Pajeú, em Pernambuco, Sertão do Apodi, no Rio Grande do Norte, e Cariri Ocidental, na Paraíba. Essas cartas de intenção resultaram nos memorandos de entendimento que foram assinados em dezembro de 2023 nas três paisagens, formalizando oficialmente os pactos PPI nessas três regiões.
O WRI Brasil é uma das organizações que apoia os pactos, atuando especificamente nas ações direcionadas ao pilar Proteger. Ao longo de todo ano de 2023, o WRI Brasil teve um importante papel na condução do processo de criação, priorização, quantificação e validação das metas pactuadas, e conduziu por meio de oficinas a aplicação da metodologia ROAM para identificar oportunidades para a restauração e promoção da conservação do bioma, considerando o contexto sociocultural e econômico dos territórios.
Os pactos têm como objetivo promover a proteção ambiental, a produção sustentável e a melhoria da qualidade de vida das pessoas, a partir de um esforço conjunto entre os setores público e privado, e a sociedade. Abaixo, confira com um pouco mais de detalhes o que cada uma das três paisagens definiu como prioridades para seus pactos.
- Pacto Cariri Sustentável: Para o pilar Produzir, o pacto vai apoiar o desenvolvimento das cadeias de caprinos e ovinos, fomentar a produção de leite e a avicultura, aproveitando as estruturas já existentes para a criação de animais na paisagem. Além disso, vai apoiar as agroindústrias da região nos setores de mel, polpa de frutas e farinha, buscando certificação, e estimular a cadeia do algodão ecológico. Para o pilar Proteger, o pacto deve apoiar produtores no Cadastro Ambiental Rural (CAR), combater o desmatamento da Caatinga e incentivar a restauração. O foco é na regularização fundiária e ambiental, especialmente nas Áreas de Preservação Permanente (APPs). Também vai fomentar a energia solar e o reuso de água. No pilar Incluir, o trabalho se concentrará em estratégias de inclusão de mulheres e jovens, inclusão da agricultura familiar local em convênios nacionais e na estruturação do turismo rural sustentável.
- Pacto Pajeú Sustentável: Para o pilar Produzir, as prioridades identificadas foram a certificação de produtos e o incentivo a agroindústrias, especialmente de mel, polpa de frutas, caju e mandioca. Também haverá ações voltadas para a criação de animais e algodão ecológico. No pilar Proteger, foco na restauração da Caatinga e implementação de um programa de Pagamentos por Serviços Ambientais (PSA), regularização ambiental e fundiária, e estruturação de um programa de créditos de carbono e redução de emissões. Por fim, no pilar Incluir, a paisagem busca apoio em Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER), inclusão de gênero, apoio à agricultura familiar por meio do programa Farmácia Viva e no turismo rural sustentável.
- Pacto Apodi Sustentável: para o pilar Produzir, o foco na região do Apodi está na cadeia do arroz vermelho e do algodão ecológico. Além disso, busca fortalecer a fruticultura, apicultura e horticultura e estruturar a cadeia da pecuária. No pilar Proteger, as prioridades do pacto estarão no incentivo à agroecologia, na criação de corredores de isolamento entre áreas de plantio de grande escala e as comunidades e na ampliação da participação da sociedade nas políticas de gestão da água, além da recuperação de florestas degradadas. No pilar Incluir, o pacto se propõe a garantir o envolvimento de 50% de mulheres, em fortalecer redes, cooperativas e organizações da agricultura familiar, na certificação de produtos da agricultura familiar e fomentar uso de novas tecnologias. Também busca facilitar acesso a crédito a mulheres e jovens e fomentar turismo rural.
Construindo um futuro sustentável para a Caatinga
Apesar de ser um bioma vulnerável, a Caatinga acaba ocupando um papel de baixa representatividade nas políticas nacionais e no discurso público. O WRI Brasil tem trabalhado para reverter essa tendência. Em parcerias com organizações como o MapBiomas, por exemplo, apoia o monitoramento da cobertura e uso do solo para trazer mais inteligência nas decisões tomadas na região, e junto com a organizações locais, articula uma rede de restauração na Caatinga com representatividade nas políticas públicas. As formalizações dos Pactos PPIs é mais um passo para construir, junto com a população local, os caminhos para produzir alimentos, proteger a vegetação nativa e incluir as pessoas no desenvolvimento sustentável da Caatinga.