Há no Brasil uma grande quantidade de áreas degradadas, pouco produtivas e que não estão exercendo sua função ecológica, que podem ser melhoradas por meio de um trabalho de restauração florestal. A restauração dessas áreas pode melhorar o solo, a qualidade da água, e ainda gerar emprego e renda para os produtores rurais. Porém, ainda há poucos estudos sobre onde estão essas áreas. Mais importante, sabe-se pouco sobre as motivações e oportunidades para a população que vive em áreas que podem se beneficiar da restauração florestal. Felizmente, já existe uma metodologia criada para mostrar aptidões das regiões e necessidades e oportunidades para a população local: a ROAM – sigla em inglês para Metodologia de Avaliação de Oportunidades de Restauração.

A ROAM foi desenvolvida pelo WRI e pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) e é aplicada para avaliar quais são as necessidades, interesses e oportunidades de restauração em uma determinada paisagem, ajustando as necessidades ecológicas de uma região com a participação social e o engajamento com produtores e demais atores envolvidos na agenda da restauração. Ela ajuda tomadores de decisão a definir onde restaurar, quais técnicas utilizar, como incluir a população nas decisões e ainda mostra os benefícios econômicos e ecológicos de se plantar florestas para cada paisagem.

A ROAM já foi aplicada em várias paisagens no Brasil e no mundo. Confira abaixo quatro exemplos dos resultados da metodologia para Espírito Santo, Pará, Pernambuco e São Paulo.

Melhorando a qualidade da água no Espírito Santo

A crise hídrica de 2014-15 atingiu fortemente o estado do Espírito Santo. Não por acaso, a ROAM identificou que a principal motivação para se restaurar florestas no estado é a possível contribuição para recursos hídricos.

A ROAM identificou que as melhores oportunidades de restauração para a questão hídrica no Espírito Santo estão no norte do Estado, nas bacias hidrográficas de São Mateus e Itaúnas. São áreas mais desmatadas, onde a restauração florestal pode ajudar a recuperar nascentes, proteger o solo e evitar o aporte de sedimentos nos corpos d’água, tornando a água mais limpa nas propriedades.

Além de atender a demanda por melhoria da qualidade da água, a restauração no Espírito Santo pode ter um importante impacto positivo na economia. O estudo identificou que a demanda por implantação e manutenção de florestas com espécies nativas pode resultar na geração de 18 mil postos de trabalho nos próximos 20 anos. Com todos esses benefícios, as bacias de Itaúnas e São Mateus foram escolhidas por outro projeto do WRI Brasil, o Pro-Restaura , que tem como objetivo atrair recursos e ajudar na implementação de estratégias de restauração no Estado.

Grande oportunidade para restaurar a Amazônia

Também na Amazônia a metodologia mostrou resultados. Aplicada no estado do Pará por Imazon, Conserve Brasil e Terra Nativa, com o apoio do WRI Brasil, a ROAM identificou oportunidades para a restauração de Reservas Legais (RLs) e Áreas de Preservação Permanente (APPs). O estudo mostra que o Pará poderia, apenas recompondo essas áreas, restaurar 3 milhões de hectares – 25% da meta brasileira de restauração, que é de 12 milhões de hectares até 2030.

Os autores identificaram grandes possibilidades para o modelo de sistemas agroflorestais no Pará. Esse modelo é mais adequado para pequenos produtores, e pode gerar uma renda adicional de R$ 2 mil por hectare, um valor significativo para a composição da renda da agricultura familiar. Entre as recomendações, a ROAM indica a necessidade de fomentar o mercado florestal de madeira legal por meio de uma política de economia sustentável e de baixo carbono.

Floresta amazônica em Juruti, Pará. Amazônia paraense tem boas oportunidades para a restauração. Foto: Preta Terra/WRI Brasil.

Foco de restauração de APPs e RLs em Pernambuco

A ROAM foi aplicada em Pernambuco com foco na restauração para a adequação legal – as áreas desmatadas no passado que precisam ser recompostas por fazerem parte de RLs ou APPs. O estudo, desenvolvido pela Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Estado de Pernambuco, IUCN e Centro de Pesquisas Ambientais do Nordeste, identificou necessidade de restauração de mais de 1 milhão de hectares, sendo cerca de 270 mil hectares de APP e 840 mil de RL.

Essa restauração significaria redução de sedimentos nos rios e corpos d’água, resultando numa estimativa de economia de R$ 35 mil por ano em tratamento de água. Além disso, a ROAM estimou um potencial de receita de mais de R$ 2 bilhões em 20 anos com créditos de carbono. Mas ainda há muitos gargalos, em especial o alto custo da restauração e o pouco conhecimento sobre sistemas agroflorestais nas áreas inseridas no bioma Caatinga, que abrange parte do Estado.

Em SP, chance de aumentar o PIB agropecuário

A Secretaria de Meio Ambiente de São Paulo aplicou a metodologia ROAM no Vale do Paraíba Paulista com o apoio do WRI Brasil. Os resultados são animadores. O estudo mostrou que a região tem uma grande vocação para uma economia agroflorestal. Metade da área do Vale do Paraíba tem as condições climáticas e ambientais ideias para implantação de modelos de restauração, reflorestamento e sistemas agroflorestais. Sem considerar as áreas que poderiam atender a produção agropecuária, foram identificados 450 mil hectares de áreas degradadas com aptidão agroflorestal.

Foram identificadas três motivações principais que podem levar os agricultores a plantar florestas. A primeira é a redução da perda e erosão do solo, uma questão importante na região, que viu seu solo se degradar por atividades econômicas não sustentáveis do passado. A segunda motivação é a melhoria da qualidade da água e da quantidade de água nas propriedades. Esse fator é crucial se considerarmos a forte crise hídrica que a região enfrentou em 2015. Por fim, a terceira motivação é gerar emprego e renda. E a restauração pode gerar resultados econômicos no Vale do Paraíba? A análise do ROAM mostra que sim.

Se todas as áreas identificadas forem restauradas, o Produto Interno Bruto (PIB) agropecuário da região pode aumentar em cerca de 32%. Também há efeitos positivos para ouras motivações identificadas. Para o solo, por exemplo, a restauração reduziria em 19% a erosão e perda do solo. Com a redução da perda do solo, há efeito positivo para a qualidade da água, por reduzir a quantidade de sedimentos.

Conexão com a agenda global de restauração

Uma das grandes vantagens da ROAM é padronizar informações sobre paisagens para que possam ser compartilhadas tanto em escalas nacionais como internacional. Isso permite ajudar a saber qual pode ser a contribuição do Vale do Paraíba, do Espírito Santo, de Pernambuco e do Pará – e de muitas outras paisagens – nas metas nacionais de restauração do Brasil, por exemplo.

Além disso, conecta o local e a restauração que já está acontecendo no Brasil com a agenda global de restauração. Afinal, o Brasil se comprometeu com a restauração de paisagens e florestas em esforços internacionais como a Iniciativa 20x20, o Desafio de Bonn e o Acordo de Paris.

O próximo passo é expandir a aplicação da metodologia a outras paisagens. Nesse sentido, WRI Brasil e Fundação Renova estão trabalhando na aplicação da ROAM em mais uma paisagem, desta vez focada em Minas Gerais. A expectativa é que o estudo mostre grandes oportunidades para que produtores rurais de Minas Gerais plantem florestas e adotem práticas agropecuárias mais sustentáveis.