A realização da COP21, a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2015, na qual foi discutido o Acordo de Paris, marcou o momento em que líderes globais reconheceram que as mudanças climáticas são reais e que grandes atitudes precisam começar a serem colocadas em prática imediatamente. As ações climáticas que os países se comprometeram a cumprir têm impacto direto na promoção da saúde e do bem-estar das pessoas, já que tratam de mitigar as emissões de gases poluentes responsáveis por afetar a qualidade do ar e por inúmeras doenças crônicas e mortes prematuras. Centenas de pesquisas revelam que alterações no clima do planeta irão causar impactos na saúde humana. A revista científica PLOS Medicine publicou recentemente uma série de artigos consolidando as últimas pesquisas sobre os riscos à saúde causados pelas mudanças climáticas.

A série tem o objetivo de levar conhecimento aos tomadores de decisão sobre as consequências específicas de cenários com clima mais quente e mais extremo. Dessa forma, eles ganham instrumentos para desenvolver estratégias com foco também na adaptação climática, além da mitigação. Conheça algumas das descobertas contidas nos artigos da revista:

Reduzir emissões pode ser mais eficiente para a equidade alimentar do que estratégias tradicionais de saúde pública

Sabe-se que a concentração do CO2 (dióxido de carbono) estimula o crescimento das plantas e sua fotossíntese. Porém, o artigo "Aumento do dióxido de carbono atmosférico: efeitos negativos previstos sobre a qualidade dos alimentos" reúne dados que demonstram como concentrações mais altas do gás podem reduzir a qualidade nutricional de produtos agrícolas básicos, como batata, cevada, arroz e trigo. O artigo questiona, então, como essas alterações em plantas e em produtos agrícolas irão influenciar nas deficiências nutricionais globais e ainda como as mudanças previstas em desigualdade nutricional podem ser evitadas.

"Entender e descrever a natureza desses impactos específicos é um aspecto importante das mudanças climáticas e da segurança alimentar, com implicações óbvias para a primeira infância e o desenvolvimento humano", dizem os autores.

O pesquisador Christopher Weyant e colegas da Universidade de Stanford apontam que implementar estratégias para reduzir as emissões de gases de efeito estufa, como as manifestadas no Acordo de Paris, poderia prevenir até 48,2% da desigualdade nutricional se comparado com intervenções tradicionais de saúde pública, como suplementação de nutrientes e programas de controle de doenças, que podem evitar até 26,6%.

O artigo ressalta que a pesquisa leva em consideração apenas as consequências das concentrações de CO2 e não modelam como as mudanças climáticas resultantes dessas emissões poderiam afetar todos os aspectos da segurança alimentar, incluindo o acesso a alimentos, sua utilização e a estabilidade dos preços, com consequências para a desnutrição.

Mulheres sofrem mais com as consequências das mudanças climáticas

Como reconhecido pela Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC), as mulheres, especialmente as mais pobres, sofrem riscos mais altos e passam por experiências ainda mais difíceis sob os efeitos das mudanças climáticas. Para citar algumas das principais ameaças, a insegurança alimentar causada pelo clima afeta as mulheres mais fortemente, já que as taxas de anemia e desnutrição são maiores em mulheres e elas também são expostas a maiores perigos em desastres naturais e processos migratórios. Além disso, o artigo "Mudanças climáticas e saúde da mulher: Impactos e orientações políticas" afirma que a maior parte das pequenas propriedades agrícolas pertencem a mulheres e, portanto, o seu sustento estaria sob risco devido às perdas de colheitas ocasionadas pelas alterações do clima.

O artigo destaca a necessidade de inclusão das mulheres em todas as metas climáticas e em todos os níveis das ações climáticas, desde garantir sua participação nos processos, quanto promover a educação e pesquisas sobre gênero, entre outros. "Os distintos papeis sociais das mulheres e o potencial para a ação proporcionam oportunidades para promover soluções eficazes para a sustentabilidade, redução do risco de desastres e soluções para ameaças à saúde", diz o texto.

<p>Capacitar mulheres na ação climática</p>

Capacitar as mulheres como educadores e agentes da mudança social é importante em políticas climáticas (Foto: Linda Shaffer/World Resources Institute)

Sem medidas de adaptação, Colômbia, Filipinas e Brasil podem ser os primeiros países atingidos por fortes ondas de calor

Uma análise de dados de 412 comunidades de 20 países/regiões buscou projetar o número de fatalidades ligadas a ondas de calor nas próximas décadas. O estudo, presente no artigo "Quantificando o excedente de mortes relacionadas às ondas de calor em cenários da mudança climática" cobre nove regiões caracterizadas por diferentes condições climáticas – América do Norte, América Central e América do Sul, norte, centro e sudeste da Europa, leste e sudeste da Ásia, e Oceania – e afirma que a maior parte das mortes ocorrerá em regiões tropicais do planeta, especialmente nos países de baixa renda. Já os países europeus e os Estados Unidos vivenciariam um pequeno aumento no excedente de mortalidade relacionado a ondas de calor. Este é um dos maiores estudos internacionais já realizados sobre o assunto. Os autores salientam que seus resultados destacam a importância da implementação de políticas climáticas eficazes para minimizar o aumento da temperatura ambiente e prevenir os impactos negativos associados à saúde humana.

“As incertezas das mudanças climáticas e das hipóteses de adaptação não são consideradas como probabilidades, mas como possíveis cenários futuros, que dependem do desenvolvimento demográfico, tecnológico, político, social e econômico”, esclarece o artigo. Os pesquisadores acreditam que suas descobertas podem oferecer sugestões para práticas de mitigação e adaptação às mudanças climáticas.

A primeira recomendação é a aplicação mais rigorosa de políticas de mitigação de emissões de gases de efeito estufa, já que níveis mais baixos de emissões estão associados a menos mortes decorrentes de ondas de calor. Depois, o planejamento de intervenções de adaptação deve ser realizado para reduzir os impactos das ondas de calor em todos os países, especialmente países em desenvolvimento em regiões tropicais e subtropicais. Seis níveis de intervenções são recomendados – individual, interpessoal, comunitário, institucional, ambiental e via políticas públicas – assim como seus métodos, mecanismos e resultados.

Adaptação com foco em benefícios para a saúde deveria estar concentrada em países pobres

A preocupação pública com questões de mudanças climáticas é maior em países desenvolvidos, assim como os benefícios econômicos da mitigação e adaptação são mais facilmente quantificados e os recursos necessários para mudar comportamentos são mais acessíveis. O Fundo Verde do Clima (GEF), criado especificamente para atender países de baixa e média renda, recebeu poucas inscrições bem-sucedidas que enfocam a saúde, de acordo com o artigo "Mudanças climáticas e saúde: movendo da teoria à prática". Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), menos de 1,5% do financiamento internacional para adaptação climática é alocado em projetos com o objetivo de garantir a preservação da saúde.

Hoje, as populações de baixa renda têm menos espaços verdes, menos moradias com eficiência energética e menos recursos comunitários necessários para escapar e mitigar o impacto do calor. O artigo "Mudanças climáticas, saúde urbana, e a promoção da equidade na saúde" destaca que saúde, meio ambiente e equidade estão intimamente interligados e essa relação é essencial especialmente em áreas urbanas em crescimento. "Projetar, gerir e governar áreas urbanas para que sejam ao mesmo tempo mais saudáveis, ambientalmente sustentáveis e mais equitativas é uma necessidade fundamental e uma oportunidade para o futuro da saúde da população e do nosso planeta", diz o texto.