Este post foi publicado originalmente no WRI Insights.


No alto da estratosfera (segunda camada da atmosfera, entre 11 km e 50 km de altitude), a presença natural de ozônio reflete a radiação solar de volta ao espaço, protegendo as pessoas e o planeta dos raios ultravioleta nocivos. Porém, mais perto da superfície da Terra, na troposfera, níveis crescentes de ozônio – que se forma quando poluentes de diversas fontes reagem entre si – encobrem as cidades de poluição atmosférica. Hoje, a maioria da população global não respira um ar saudável, e a poluição por ozônio levou a quase 500 mil mortes precoces em todo o mundo somente em 2017. A exposição de curto prazo a esse gás de efeito estufa pode causar uma série de problemas respiratórios, desde doenças pulmonares obstrutivas crônicas até enfisemas. De forma semelhante ao que acontece com muitos outros desafios ambientais, à medida que a poluição do ozônio aumenta, crescem também as consequências desse problema para as pessoas nos países menos desenvolvidos.

A poluição por ozônio troposférico (em referência à camada mais baixa da atmosfera) também ameaça ecossistemas fundamentais para a vida no planeta, como as florestas, contribui para o aquecimento global e prejudica a produção agrícola, reduzindo a capacidade das plantas de transformar a luz solar em crescimento. De 2010 a 2012, por exemplo, o aumento da quantidade de ozônio reduziu a produção global de grãos básicos, como trigo, arroz e milho, em 227 milhões de toneladas. As mudanças climáticas apenas intensificam esses impactos, pois o aumento da temperatura e a mudança dos padrões climáticos aumentam o número de dias com altas concentrações de ozônio.

Como resolver esse problema? Reduzir a poluição por ozônio apresenta desafios complexos de governança.

Muitos países estabelecem padrões de qualidade do ar para proteger a saúde das pessoas. Mas essas regulamentações em geral são mais permissivas do que as diretrizes da Organização Mundial da Saúde para concentrações seguras de ozônio troposférico: 50 partes por bilhão (ppb) acima de uma média de oito horas. Os governos europeus, por exemplo, fixaram o limite em 60 ppb. Nos Estados Unidos, o padrão é de 70 ppb e, na China, de 75 ppb. Em muitos outros países, as autoridades lutam para conseguir aplicar regulamentações ainda mais permissivas.

É difícil aplicar essas normas porque, diferente de outros poluentes do ar, o ozônio não é emitido diretamente. Em vez disso, compostos orgânicos voláteis e óxidos nitrosos liberados por veículos, processos industriais e instalações como usinas de energia e aterros sanitários reagem com a luz solar para formar esse poluente secundário. Assim, os níveis de ozônio são determinados tanto pelas emissões quanto pelas condições atmosféricas. Podem atingir os picos mais altos durante os meses mais quentes e ensolarados, mesmo que as emissões permaneçam as mesmas, assim como podem aumentar durante ou após a hora do rush, dependendo do tipo de combustível usado. Os precursores do ozônio e o próprio ozônio também se movem com o vento, tornando praticamente impossível para cidades ou regiões reduzir a poluição por ozônio de forma isolada.

Medidas tecnológicas específicas em cada setor ajudam a controlar a poluição por ozônio, como combustíveis mais limpos, bicos de recuperação de vapor em bombas de gasolina, programas de inspeção veicular e limites de emissões mais rígidos para refinarias, indústrias e fontes de combustão. No entanto, enquanto os níveis de ozônio caíram em grande parte da América do Norte e da Europa, lugares como China, Índia e sul da Europa enfrentam atualmente os piores níveis de poluição do ar de todos os tempos, e muitas cidades que conseguiram reduzir os níveis de ozônio lutam para manter a redução.

Estamos diante de um desafio que exigirá estratégias de gerenciamento que melhorem a governança. Conheça três abordagens que podem ajudar.

<p>Monitoramento do ozônio em estação meteorológica no Ushuaia, na Argentina (foto: World Meteorological Organization)</p>

Monitoramento do ozônio em estação meteorológica no Ushuaia, na Argentina (foto: World Meteorological Organization)

Monitoramento mais eficiente dos níveis de ozônio

Enquanto a maioria dos países desenvolvidos possui recursos para monitorar a qualidade do ar, os países em desenvolvimento enfrentam uma série de dificuldades: redes de monitoramento de baixa qualidade, poucas estações, dados incompletos devido à limitação de estações e falta de pessoal qualificado para manter os equipamentos. Iniciativas de monitoramento inovadoras incluem o uso de observações baseadas em satélite aliadas a modelos de computador para medir as emissões dos gases que contribuem para a formação do ozônio. O projeto Tropospheric Ozone Assessment Report, por exemplo, combina dados de mais de 4,8 mil estações de monitoramento em todo o mundo para manter um banco de dados aberto, permitindo que tomadores de decisão analisem as tendências do ozônio nas áreas urbanas e rurais no Hemisfério Norte. Estender a cobertura dessas estações aos países em desenvolvimento poderia fornecer mais dados necessários para reduzir as concentrações de ozônio.

Estratégias coordenadas que ultrapassam fronteiras

Como o ozônio se move com o vento, atravessando fronteiras, a cooperação entre diferentes países, em escala nacional ou subnacional, ajuda a garantir que as práticas de gestão realmente melhorem a qualidade do ar e a saúde pública. A Comissão de Transporte de Ozônio é um bom exemplo. Estabelecida pela Agência de Proteção Ambiental dos EUA, a entidade ajuda a combater a poluição regional em 37 estados do leste daquele país. Da mesma forma, em seu Acordo de Qualidade do Ar de 2000, os governos do Canadá e dos Estados Unidos se comprometeram a combater o ozônio de forma conjunta, reduzindo as emissões de óxidos nitrosos e compostos orgânicos voláteis em uma área que inclui partes de Ontário e Quebec, no Canadá, e 18 estados e o Distrito de Columbia, nos EUA. No México, a Região Metropolitana da Cidade do México possui programas para reduzir o ozônio desde 1995.

Em todo o mundo, existem redes regionais semelhantes criadas para ajudar a gerenciar a qualidade do ar nas cidades, embora a maioria não seja focada especificamente no ozônio troposférico. A Iniciativa Ar Limpo para Cidades Asiáticas visa melhorar a qualidade do ar urbano por meio da conscientização da população, apoiando o desenvolvimento de padrões de qualidade do ar e fortalecendo a capacidade de implementar essas políticas. Nas Américas, a Rede Intergovernamental de Poluição do Ar para a América Latina e o Caribe troca informações técnicas e políticas entre ministros do meio ambiente, harmoniza estratégias de gestão e monitoramento e apoia a implementação de um plano de ação regional.

Em todos os casos, os instrumentos legais, financeiros, sociais e estruturais disponíveis variam. O estabelecimento de estratégias de cooperação que ultrapassam fronteiras é essencial para adequar os planos de ação às condições locais e mobilizar agências para trabalharem em conjunto para reduzir a poluição por ozônio.

Engajamento da sociedade civil e ação cidadã

A sociedade civil pode desempenhar um papel vital para estimular uma mudança de comportamento e reivindicar novas políticas que priorizem o desenvolvimento de infraestrutura verde, incentivem o uso do transporte coletivo e aumentem os investimentos em infraestrutura cicloviária, para citar alguns exemplos.

Aumentar a conscientização da população é fundamental. Por exemplo, jardins com plantas que desenvolvem manchas amarelas, marrons e pretas quando expostas ao ozônio por longos períodos de tempo permitem que as pessoas vejam os efeitos da poluição. Esse é um exemplo de ação que ajuda a tornar visível um problema normalmente imperceptível aos olhos.

Acompanhe o debate

Reduzir a poluição por ozônio exige ações integradas considerando diferentes regiões geográficas, outros poluentes atmosféricos e um plano abrangente e inclusivo de governança da poluição. Monitoramento mais eficiente, gestão conjunta em diferentes níveis jurídicos, estratégias de controle específicas em cada setor e participação da sociedade civil e das comunidades locais fazem parte dessa abordagem. Para estimular o debate sobre o assunto, o WRI organizou uma série de seminários; assista ao primeiro (em inglês).


Errata: até o dia 13/11/2019 este artigo informou que "De 2010 a 2012, por exemplo, o aumento da quantidade de ozônio reduziu a produção global de grãos básicos, como trigo, arroz e milho, em 227 toneladas". O número correto é 227 milhões de toneladas. O texto foi corrigido.