6 maneiras de tornar as ruas mais seguras para pedestres
Um futuro mais seguro e sustentável para a mobilidade urbana não inclui a dependência dos carros, como deixam claro a tendência global crescente de mortes de pedestres, os congestionamentos e a desconexão das áreas urbanas, a poluição do ar e as emissões.
Cerca de 1,2 milhão de pessoas morrem todos os anos em decorrência de sinistros de trânsito, e mais de metade das mortes é de pedestres, ciclistas e motociclistas. No Brasil, morreram 5.387 pedestres no trânsito em 2022. Nos Estados Unidos, desde 2010, as mortes de pedestres aumentaram em 77%, enquanto o aumento das demais mortes no trânsito foi de 22%.
A pandemia de Covid-19 impulsionou a inauguração de ciclovias e a abertura de mais espaço para pedestres. O que começou como solução para manter o distanciamento social também na mobilidade se tornou uma visão permanente para algumas cidades, que perceberam os benefícios de ruas que comportam uma gama mais ampla de usuários. Porém, sem um bom planejamento e a integração dos princípios de Ruas Completas, as mudanças podem criar condições menos seguras e intervenções mal integradas ao ambiente urbano.
A seguir, confira seis maneiras pelas quais as cidades podem criar ruas mais amigáveis aos pedestres e que contribuem para um ambiente urbano mais seguro, limpo e produtivo.
1. Oferecer uma rede de calçadas contínua e acessível
Conforto, continuidade e segurança são determinantes para a qualidade de uma calçada. Calçadas bem planejadas são contínuas – não terminam abruptamente no meio da quadra ou nos cruzamentos – e dispõem de espaço para que os pedestres possam caminhar, descansar, fazer compras, comer, conviver e socializar. A largura recomendada é de 1,5m a 1,8m pelo menos para áreas de baixo volume de circulação e de 2,5m para áreas de alto volume. O distanciamento social pode exigir ainda mais espaço em áreas de alto volume.
Uma calçada deve ser dividida em três seções: uma faixa de transição para portas, mobiliário e outros elementos dos estabelecimentos comerciais; uma faixa livre para facilitar a circulação; e uma faixa de serviço, que inclui árvores, placas de sinalização, lixeiras, mobiliário público e drenagem. Uma calçada segura e acessível também deve ter rampas de acesso para garantir a acessibilidade, usar pavimento antiderrapante para reduzir o risco de escorregões e quedas em dias de chuva e superfícies táteis para pedestres com deficiência visual.
Evidências dos Estados Unidos mostram que a probabilidade de sinistros de trânsito envolvendo pedestres é duas vezes maior em locais sem calçadas, enquanto as vias com passeios de ambos os lados têm o menor número de sinistros.
2. Converter áreas subutilizadas em espaços públicos de permanência
Espaços públicos de permanênci podem transformar, com baixo custo, áreas subutilizadas em espaços ativos da comunidade. Áreas subutilizadas, pouco ocupadas ou carentes de estrutura podem ser reformadas com a ajuda de tintas, vasos de plantas, manifestações artísticas e mobiliário urbano, além de iluminação e elementos paisagísticos resistentes e de baixa manutenção.
Essas transformações têm um impacto significativo na segurança dos pedestres. A cidade de Nova York registrou uma redução de 16% nas altas velocidade e de 26% nos sinistros de trânsito nas ruas que contam com praças de pedestres. Espaços assim também contribuem para os negócios locais e fortalecem a interação da comunidade no bairro.
O bairro residencial Cidade 2000, em Fortaleza, foi diversas vezes ocupado pelos carros e convertido em estacionamento ilegal até 2017, quando se tornou o cenário da primeira experiência da cidade com medidas de moderação de tráfego – um projeto chamado Cidade da Gente. Com apoio do WRI Brasil, a intervenção transformou 1.200 metros quadrados de estacionamento e faixas de tráfego em uma praça funcional para pedestres. A mudança incluiu a remoção de uma faixa de trânsito, redução do limite de velocidade para 30 km/h, alargamento das calçadas e implementação de extensões de meio-fio e cinco novas travessias para pedestres. Arte de rua, mobiliários e infraestrutura verde também foram usados para criar um espaço delimitado e acolhedor para as pessoas. Devido ao sucesso do projeto, Fortaleza tornou a intervenção permanente. A experiência é hoje um exemplo em toda a cidade de como design inteligente e urbanismo tático podem melhorar as ruas para todos.
3. Criar zonas seguras para crianças e adolescentes
As crianças são mais vulneráveis a colisões do que os adultos devido ao seu tamanho, controle limitado dos impulsos e menor tempo de reação. Em Hyderabad, Índia, 25% dos meninos e 11% das meninas de 11 a 14 anos relatam ter sofrido alguma lesão no trânsito no período de um ano durante os trajetos para a escola.
Áreas no entorno de playgrounds, parques, escolas e centros comunitários exigem atenção especial e zonas seguras. As zonas seguras devem estar equipadas com boas condições para caminhar e andar de bicicleta, bem como áreas designadas para veículos buscando ou deixando as crianças. Sinalização de trânsito e marcações nas vias devem alertar os motoristas de que estão entrando em uma zona especial. Pavimentos antiderrapantes, faixas de pedestres visíveis e calçadas largas e acessíveis devem facilitar a circulação de pessoas a pé. Infraestruturas de moderação do tráfego devem ser implementadas para reduzir a velocidade dos veículos.
A SARSAI, vencedora de 2018-2019 do Prize for Cities do WRI Ross Center, ajudou a reduzir em 26% as lesões decorrentes de sinistros de trânsito entre crianças em idade escolar em Dar Es Salaam, Tanzânia, e outras cidades africanas por meio de intervenções em áreas escolares.
4. Implementar espaços viários compartilhados
Em áreas de alta densidade e com baixos volumes de tráfego de veículos, abrir ruas para permitir que carros, pedestres, ciclistas e outros usuários compartilhem o mesmo espaço pode melhorar a segurança em condições normais.
As ruas compartilhadas não possuem alguns elementos típicos de outras ruas, como meio-fio vertical, sinalização, diferença de nível, marcações de calçada ou cores que delimitam o espaço para diferentes modos de transporte. Elas em geral incluem elementos que promovem a prioridade dos pedestres e estimulam trocas sociais, culturais e econômicas, como mobiliário urbano, paisagismo e espaços de convivência. O resultado desses atributos é que todos os usuários da via têm mais cautela ao circular, e os veículos tendem a trafegar a velocidades mais baixas.
Dados da Holanda indicam que a criação de ruas compartilhadas pode reduzir a incidência de colisões em até 50%.
5. Pedestrianizar ruas
As cidades devem considerar a proibição total do tráfego de veículos para permitir que as pessoas se movam livremente e com segurança. As ruas exclusivas para pedestres não apenas melhoram a segurança das pessoas, como reduzem os níveis de ruído e contribuem para a qualidade do ar, a valorização dos imóveis, as vendas do comércio local e a saúde em geral. Um estudo de 2016 com mais de 100 cidades no mundo que mantinham diversas ruas exclusivas para pedestres mostrou que as vendas no comércio aumentaram 49%. Cidades na Áustria, Alemanha e países escandinavos registraram um aumento de mais de 60% nas vendas.
Ruas exclusivas para pedestres devem ser estrategicamente localizadas e facilmente acessíveis a partir de áreas residenciais e comerciais. Devem ser bem conectadas ao sistema de transporte público, ciclovias, estacionamentos e outros pontos de acesso.
6. Promover dias sem carro
Os dias sem carro, quando as cidades fecham uma ou mais ruas para o tráfego de veículos, incentivam as pessoas a explorar a cidade de bicicleta ou a pé e ajudam a mudar a perspectiva sobre a rua e o espaço público. A capital colombiana, Bogotá, realiza o maior evento do tipo no mundo, La Ciclovía, que acontece todos os domingos das 7h às 14h, cobrindo a maior parte da cidade. A iniciativa oferece mais de 120 quilômetros de espaço livre de carros para mais de 1,5 milhão de pessoas.
Dias sem carro são oportunidades para reviver, animar e transformar os bairros. Áreas de estacionamento e esquinas vazias são convertidas em parklets e espaços para jogos, atividades de lazer, esportes e manifestações artísticas, e as ruas são ocupadas por pedestres e ciclistas de todas as idades.
Promover dias sem carro com regularidade pode contribuir para aumentar a prática de atividade física, diminuir os níveis de poluição, promover inclusão social e a construção da comunidade, proporcionar oportunidades de revitalização econômica e estimular a caminhada e o uso da bicicleta em um ambiente mais seguro. Quando Paris realizou seu primeiro dia sem carro, em 2015, houve redução de 40% nas emissões de escape de veículos e de 50% no nível de ruído no centro da cidade.
Imagine uma cidade planejada para priorizar os pedestres. Essa é uma cidade mais conectada, ativa, segura e saudável. As pessoas sabem como usar uma boa rua quando veem uma; cria-las é a responsabilidade dos planejadores urbanos.
Este artigo foi escrito originalmente por Nikita Luke em 2020 e publicado no TheCityFix. O texto foi atualizado em agosto de 2024 para incluir dados mais atualizados.