A silvicultura de nativas – plantio de espécies de árvores brasileiras para fins econômicos – pode ser uma importante ferramenta para dar escala à restauração, gerar emprego e renda e ajudar o Brasil a atingir sua meta de restaurar 12 milhões de hectares até 2030. Um webinar realizado pela Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura no começo de julho apresentou algumas experiências empresariais com a silvicultura de nativas, e mostrou caminhos para solucionar gargalos dessa atividade.

Bruno Mariani, CEO da Symbiosis, por exemplo, apresentou números mostrando como empreendimentos pioneiros e inovadores com espécies florestais nativas do Brasil são investimentos viáveis e competitivos. A Symbiosis trabalha com o plantio de espécies da Mata Atlântica e tem grande foco no melhoramento genético das espécies. Outro exemplo apresentado foi o da Amata, que trabalha com o plantio do paricá, uma espécie nativa da Amazônia. A CEO da Amata, Ana Bastos, destacou que apesar das muitas oportunidades envolvendo a silvicultura de nativas, as experiências atuais mostram que também há grandes desafios.

Há muito trabalho a ser feito para engajar os produtores rurais, destravar investimentos e dar escala à silvicultura de nativas. Durante o webinar, especialistas da Coalizão apresentaram quatro áreas temáticas que estão ajudando a consolidar a silvicultura de nativas e a restauração florestal como atividades não só lucrativas, mas que também geram importantes serviços ambientais para o país.

1. Pesquisa & Desenvolvimento (P&D)

Para que a silvicultura de nativas possa ganhar produtividade e ser competitiva, é preciso que as espécies brasileiras passem por um processo de Pesquisa & Desenvolvimento (P&D). O pontapé inicial desse processo começou em 2019, com o lançamento do estudo Prioridades e Lacunas de Pesquisa & Desenvolvimento em Silvicultura de Espécies Nativas no Brasil. O trabalho identificou lacunas, espécies e temas de pesquisa prioritários, custos e benefícios que servem de base para o desenvolvimento de um programa P&D nos próximos meses. O estudo sugere priorizar a pesquisa em áreas como produção de sementes e mudas, melhoramento genético, clonagem, manejo florestal, tecnologia, produtos e mercados, zoneamento e política e legislação.

A partir desse estudo, a Coalizão trabalhará em uma Plataforma de P&D, liderada pelos pesquisadores Daniel Piotto, professor e pesquisador da Universidade Federal do Sul da Bahia, e Samir Rolim, da Amplo Engenharia, com o apoio de outros especialistas. A ideia é desenvolver um programa que atraia recursos e desenvolva a pesquisa necessária para a silvicultura de nativas. Concomitantemente, pesquisas sobre tecnologia da madeira e seu uso estão sendo feitos em parcerias com a indústria, bem como a ampliação de estudos de crescimento e produtividade em áreas de plantio já estabelecidas.

2. Legislação florestal

Assim como o aumento do conhecimento sobre espécies nativas é fundamental, gargalos nas leis e normas da silvicultura de nativas precisam ser resolvidos para estimular produtores rurais a investir no plantio e manejo de espécies nativas. Segundo Raul do Valle, Diretor de Justiça Socioambiental da WWF, e Zezé Zakia, consultora em Recursos Renováveis e Meio Ambiente, a regulamentação do cadastro de plantio de florestas com espécies nativas, a adequação de regras do licenciamento ambiental e a simplificação da burocracia e de taxas são fundamentais para dar segurança jurídica aos produtores que plantam florestas com fins econômicos.

3. Mercado da madeira

Quem vai comprar a madeira de espécies nativas, e para qual uso? Tão importante quanto viabilizar o plantio é garantir que haja mercado para os produtos da floresta. A madeira das espécies nativas pode ter um uso final de maior valor agregado, como vigas, pilares, portas, entre outros. A definição de quais destes mercados serão supridos com os produtos da silvicultura de espécies nativas é essencial desde a concepção das atividades, para que a indústria se prepare e adapte o processamento destes novos produtos de espécies nativas e remunere adequadamente o produtor. Ana Bastos, CEO da Amata, Eduardo Ciriello, diretor da Futuro Florestal, e Jorge Ribeiro, da Braúna Investimentos, estão liderando estudos para superar os desafios na oferta e demanda de produtos madeireiros de florestas plantadas com espécies nativas.

4. Financiamento e investimentos

A quantidade de capital investido em florestas plantadas de espécies exóticas ou nativas e sistemas agroflorestais no Brasil está longe do potencial de captação de recursos para essas atividades. Há muitas iniciativas de sucesso com silvicultura de nativas e sistemas agroflorestais, tanto do ponto de vista ambiental como econômico. Porém, por serem atividades inovadoras, investidores ainda têm uma percepção de risco maior do que o real. O que, em conjunto com outros fatores, resulta numa fração muito pequena do portfólio de investidores dedicada a investimentos florestais em países em desenvolvimento, incluindo o Brasil.

Para resolver essa questão, é preciso buscar formas de aumentar o volume de recursos públicos e privados para empreendimentos com espécies nativas através do aumento do conhecimento sobre o portfólio de empreendimentos aptos a receberem recursos, a disseminação do conhecimento de risco e retorno das atividades com espécies nativas e o engajamento de instituições financeiras para facilitar linhas de crédito de investimentos em florestas e sistemas agroflorestais.

Uma Força-Tarefa para a silvicultura de nativas

O webinar e a apresentação são resultados dos trabalhos da Força-Tarefa para Silvicultura de Nativas, um grupo de trabalho criado pela Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura para fortalecer uma nova economia baseada em silvicultura de espécies nativas.

A Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura é um movimento multisetorial, composto por entidades que lideram o agronegócio no Brasil, as principais organizações civis da área de meio ambiente e clima, representantes de peso do meio acadêmico, associações setoriais e companhias líderes nas áreas de madeira, cosméticos, siderurgia, papel e celulose, entre outras. Instituições e pessoas interessadas em participar e contribuir com o tema estão convidadas a fazerem parte da Força Tarefa Silvicultura de Nativas e da Coalizão. Com os trabalhos da Força-Tarefa, as organizações da Coalizão esperam poder tornar a restauração em larga escala possível no Brasil, garantindo desenvolvimento econômico, geração de emprego e renda e a recuperação dos serviços ambientais.