O Brasil precisa restaurar paisagens e florestas. O país tem em suas políticas públicas e compromissos internacionais o desafio de recuperar 22 milhões de hectares entre florestas, pastagens e sistemas agrícolas sustentáveis, com benefícios ambientais importantes dessas práticas.

Porém, essa restauração ainda não tem acontecido na velocidade e na escala necessária para que o país consiga fazer uma transição para uma economia de baixo carbono. Como convencer produtores e produtoras rurais, empresários e governos a apostar na restauração?

Pesquisas recentes, projetos-piloto e empresas inovadoras têm mostrado um caminho. É possível incluir as árvores e florestas nos sistemas produtivos, por meio de modelos sustentáveis de produção, possibilitando gerar emprego e renda ao mesmo tempo em que se aplica a cobertura florestal do país e se recupera paisagens degradadas.

Uma nova análise produzida pela Força Tarefa Silvicultura de Nativas da Coalizão Brasil, Clima, Florestas e Agricultura foi atrás desses casos inovadores. Em um novo relatório, ela mostra quem são as pessoas e empresas que estão fazendo o reflorestamento de nativas acontecer no Brasil – e ganhando dinheiro com isso. Juntos, esses arranjos mostram que modelos econômicos que cultivam árvores (restauração e reflorestamento) são viáveis economicamente.

Reflorestamento com nativas

O estudo “Reflorestamento com espécies nativas: estudo de casos, viabilidade econômica e benefícios ambientais”, publicado pela Coalizão com o apoio do WRI Brasil, apresenta 40 arranjos produtivos envolvendo reflorestamento, restauração ou conservação, de 30 organizações diferentes (entre projetos de empresas, governos e terceiro setor). Além disso, analisa projeções financeiras a partir de dados reais e mostra que a taxa de retorno de investimentos fica em um intervalo entre 9,5% e 28,4%, a depender do arranjo, mostrando resultado positivo para o reflorestamento com nativas.

Mas que arranjos e modelos são esses? Não existe uma única forma de se produzir com árvores no Brasil. Os arranjos e modelos diferem conforme diversidade de espécies, características regionais e perfil de investidor. Para fazer a análise, a Força Tarefa agrupou os arranjos em três grandes tipos modelos de restauração com fins econômicos: os Sistemas Agroflorestais, a Silvicultura de Nativas e a integração Lavoura-Pecuária-Floresta.


ícone representando SAFs ícone representando silvicultura ícone representando ILPF

  • Sistemas agroflorestais (SAFs): Um sistema agroflorestal é uma forma de uso e ocupação do solo em que árvores são plantadas ou manejadas em associação com culturas agrícolas ou forrageiras. Em outras palavras, é um sistema em que o produtor planta e cultiva árvores e produtos agrícolas em uma mesma área, garantindo a melhora de aspectos ambientais e a produção de alimentos e madeira.
  • Silvicultura de espécies nativas: Silvicultura de nativas é o plantio e cultivo de árvores de espécies nativas brasileiras para uso econômico. São plantios planejados para colheita e comercialização de madeira ou produtos florestais não madeireiros, gerando emprego e renda no campo.
  • Integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF): também conhecida como sistemas silvipastoris, a iLPF é uma estratégia de produção sustentável que integra atividades agrícolas e florestais com a pecuária, buscando efeitos sinérgicos entre os componentes e otimizando aumentos da produtividade com a conservação de recursos naturais.

Essa variedade de modelos mostra que há diversidade na restauração e reflorestamento no Brasil. Produtores e produtoras rurais, empresas e governos podem decidir a melhor forma de se avançar no plantio de nativas para fins econômicos a depender das necessidades locais, produtos a ser comercializados, espécies de maior interesse econômico, e assim por diante.

Exemplo de casos

O relatório parte de casos de estudo anteriores, como o relatório do projeto Verena, do WRI Brasil. O relatório do Verena já havia levantado 12 casos de silvicultura de nativas no Brasil com retorno econômico. São exemplos como a Symbiosis, empresas no sul da Bahia que produz madeira nativa de reflorestamento apostando no melhoramento genético, a Amata, que produz paricá na Amazônia, ou a Futuro Florestal, com plantios diversos e sistemas agroflorestais no interior de São Paulo.

O trabalho da Força Tarefa amplia de 12 para 40 casos de sucesso de reflorestamento, expandindo o escopo, os biomas e regiões do país. São muitos os arranjos interessantes, como o arranjo de silvicultura do Instituto Ipê, em Lindóia, no interior de São Paulo; o sistema agroflorestal da Fazenda Coruputuba, no Vale do Paraíba Paulista; ou o sistema ILPF do projeto Pasto Vivo, no Mato Grosso.


<p>imagem mostra plantio agroflorestal em São Paulo</p>

Um dos casos de Sistema Agroflorestal descritos no estudo, da Fazenda Coruputuba, no interior de São Paulo (foto: Patrick Assumpção/Fazenda Coruputuba)



<p>Imagem mostra o gado em meio a um sistema que inclui árvores</p>

Um dos casos de Sistema ILPF descritos no estudo, o Pasto Vivo, no Mato Grosso (foto: Pasto Vivo)


Benefícios ambientais

Comprovados os benefícios econômicos, o relatório também se debruça sobre alguns dos benefícios ambientais que o reflorestamento com espécies nativas pode trazer. O relatório analisa dois importantes benefícios: o sequestro de carbono e a melhoria dos recursos hídricos.

Florestas plantadas capturam o carbono da atmosfera, que fica retido na madeira, ajudando a mitigar efeitos das emissões de gases de efeito estufa. Usando a ferramenta GHG Protocol Agropecuário aplicada a dois modelos, o estudo mostra que há um bom potencial de mitigação. O modelo de silvicultura de nativas tem potencial para retirar 12,5 toneladas de dióxido de carbono equivalente da atmosfera por hectare ao ano (tCO2eq/ha/ano), e o modelo de SAF tem potencial de remover 6,7 tCO2eq/ha/ano.

Já o potencial para recursos hídricos está relacionado com a erosão do solo. Áreas florestais, mesmo que plantações para fins econômicos, melhoram a qualidade do solo, reduzindo a erosão e o aporte de sedimentos (como areia e argila, por exemplo) para rios e nascentes. Aplicando um modelo de redução de sedimentos em uma área de pasto degradado no sul da Bahia, a análise mostra que substituir uma área degradada por um modelo de reflorestamento com fins econômicos pode reduzir em até 80% a quantidade de sedimentos que poluem corpos hídricos.

Construindo uma nova economia florestal

Os resultados do trabalho da Força Tarefa da Coalizão são animadores e mostram que o reflorestamento com nativas para fins econômicos já é uma realidade. Porém, para ganhar escala e promover uma economia florestal pujante e sustentável, ainda há gargalos a serem superados.

O WRI Brasil vem apoiando a Coalizão na criação de programas e projetos para superar esses gargalos. O Programa de Pesquisa e Desenvolvimento em Espécies Nativas, o Observatório da Restauração e Reflorestamento e o Polo de Silvicultura de Nativas do Espírito Santo são alguns desses exemplos. Enfrentar esses gargalos e incentivar o reflorestamento com fins econômicos é uma forma de impulsionar uma economia florestal no Brasil, gerando emprego e renda ao mesmo tempo em que permite que o país faça uma transição para uma economia de baixo carbono.