Sozinho, um homem pode até plantar uma árvore. Mas não consegue restaurar a natureza. Para que o Brasil e o mundo possam atingir as metas de restauração, recuperando milhões de hectares de vegetação nativa, é preciso “trabalho em equipe”: cada ator envolvido cumprindo o seu papel.

Não por acaso, um dos campos mais promissores de estudos para a recuperação de nossas florestas e vegetação nativa em geral é o dos estudos sobre a governança da restauração – a maneira como instituições e atores sociais se relacionam para restaurar uma área. Estudo recente de pesquisadores da USP com apoio do WRI Brasil mostrou alguns casos existentes de governança da restauração.

Como sair do estudo teórico e entender na prática os papeis de uma boa governança da restauração? Um projeto-piloto de restauração na zona da mata mineira pode ajudar a exemplificar isso. O projeto só foi possível graças à parceria entre as organizações envolvidas, que contribuíram para fortalecer a conexão entre os diversos atores locais.

Todos juntos pela restauração

Trata-se de uma Unidade Demonstrativa de restauração que foi implementada em Rio Pomba, Minas Gerais, como parte de um arranjo de instituições públicas, privadas, da sociedade civil e de atores locais. O resultado é um projeto-piloto de restauração em uma área de preservação permanente (APP) do Instituto Federal Sudeste de Minas Gerais, utilizando três técnicas diferentes: regeneração natural assistida, plantio direto de mudas e sistema agroflorestal.

Como foi a governança desse projeto-piloto? Como indicado no estudo de governança, não foi uma única organização que o implementou. Ele contou com a participação de todos esses atores:

  • Poder público: prefeituras, governos estaduais e federais e demais órgãos públicos têm papel fundamental em definir leis, reduzir barreiras e taxas e fazer a gestão de políticas que possam incentivar a recuperação da vegetação nativa. Neste caso específico, a prefeitura de Rio Pomba esteve presente, criando um programa de Pagamento por Serviços Ambientais municipal, estratégia fundamental para direcionar recursos para a restauração.
  • Órgão de assistência técnica: empresas como a Emater, empresa pública de assistência técnica e extensão rural, fazem a ponte entre a política pública e o agricultor. São os técnicos que vão levar aos produtores as tecnologias, apoio e conhecimento necessários para que eles desenvolvam projetos consistentes de restauração.
  • Academia: também com papel importante de difundir ciência e conhecimento, as organizações de pesquisa e academia podem estar juntas do processo de restauração, aplicando técnicas, monitorando resultados e aprimorando a ciência da restauração. O envolvimento do Instituto Federal Sudeste de Minas Gerais e da Universidade Federal de Viçosa foram cruciais para que a unidade demonstrativa fosse implantada.
  • Organizações da Sociedade Civil: espaços de governança que agregam diversas iniciativas de restauração, como o Plano Conservador da Mantiqueira, do qual o WRI Brasil faz parte, contribuem com o intercâmbio de conhecimentos para a estruturação de projetos, criação das políticas públicas, atração de recursos e apoio à capacitação dos produtores rurais.
  • Produtores e produtoras rurais: sem eles, nada acontece. Produtores e produtoras rurais são o elo mais importante da restauração. Através da execução dos projetos que geram benefícios para toda a sociedade, também agregam valor à propriedade e geram benefícios para a unidade familiar através do acesso a mecanismos como os de Pagamentos por Serviços Ambientais (PSA) e da comercialização de produtos florestais madeireiros ou não madeireiros.

As cidades pelas florestas

Além da participação de cada ator local, uma boa governança mostra que a restauração vai além do meio rural. As cidades se beneficiam das florestas e desempenham papel importante em conservá-las e restaurá-las.

O movimento global Cities4Forests busca catalisar apoio político, social e econômico entre governos municipais e habitantes das cidades para gerenciar florestas de forma mais sustentável. O projeto trabalha com o conceito de três escalas de florestas: internas, próximas e distantes.

A unidade demonstrativa implantada em Rio Pomba é um exemplo do que seria uma floresta próxima: áreas próximas dos centros urbanos que desempenham um importante papel para a segurança hídrica, pois estão nas áreas de influência de reservatórios, nascentes e mananciais, e também para a segurança alimentar, pois propriedades nessas regiões costumam abastecer as cidades com produtos agrícolas.

Uma unidade demonstrativa hídrica

No projeto-piloto de restauração implantado em Rio Pomba, uma visita de campo em maio reuniu mais de 60 pessoas para conhecerem a governança local, as técnicas de restauração e entenderam esse importante papel das florestas próximas.

O local é um bom exemplo de restauração de florestas para melhoria da qualidade da água. O projeto está em uma APP hídrica, então não só há a necessidade legal, via Código Florestal, de ser restaurada, como pode contribuir para melhoria da qualidade e quantidade da água na região. Além disso, se encontra em uma dessas zonas de transição entre o rural e o urbano, área em que restauração para fins de produção de alimento – como os sistemas agroflorestais – são muito importantes.

Com uma boa governança, participação e inclusão de todos os atores locais, e uma motivação sólida – seja a restauração pela água, neste caso, sejam outras motivações – podemos incentivar a implantação de milhares de projetos de restauração no país, ajudando a acelerar e dar escala a tão necessária recuperação de nossas paisagens e florestas.