Habitações podem ser consideradas de baixo custo se não forem eficientes?
Cerca de três bilhões de pessoas, ou 40% da população mundial, precisarão de novas moradias até 2030. Isso exigirá a construção de aproximadamente 21 milhões de novas residências por ano em todo o mundo.
Vários dos países que mais crescem têm metas ambiciosas para atender a essa necessidade. O governo indiano pretende construir 20 milhões de habitações de baixo custo até 2022. A Nigéria tem como meta um milhão de casas construídas por ano para a próxima década. O presidente da Indonésia iniciou o programa Um Milhão de Casas para atender cidadãos de baixa renda.
Embora esses programas sejam muito promissores, uma questão crítica permanece: como serão essas casas?
As escolhas de onde e como essas casas de baixo custo serão construídas e mantidas podem fazer a diferença entre melhorar a qualidade de vida das famílias de baixa renda e vulneráveis ou sobrecarregá-las com custos e isolamento social. Uma escolha crítica é a eficiência da construção. Projetos de habitação com eficiência energética são mais baratos ao longo da sua vida útil do que os não eficientes. E quando os benefícios além dos custos diretos são contabilizados – como melhoria da saúde, aumento da produtividade, novos empregos e menos poluição – eles superam várias vezes os custos.
Qualquer construção, especialmente de habitação de baixo custo, que não inclua padrões de eficiência está negligenciando as necessidades das famílias daquelas residências. No entanto, a construção de habitações ineficientes ainda é muito comum, como mostra o fato de que quase dois terços dos países não exigem a adoção de padrões de energia para empreendimentos.
Quando você olha para as evidências, fica claro que há uma infinidade de razões para investir em moradias eficientes, e não há boas razões para não o fazer.
Dois tipos de eficiência energética para habitação
Os benefícios da eficiência energética na habitação são numerosos e reforçam-se mutuamente. Uma casa eficiente não é apenas mais acessível como pode aumentar as oportunidades sociais e econômicas para a família que mora lá.
Dois tipos importantes de eficiência produzem esses benefícios:
1. Localização
A localização tem um enorme impacto na qualidade de vida. Casas em comunidades compactas e conectadas com acesso a transporte público, calçadas de qualidade e ciclovias são mais habitáveis, acessíveis e sustentáveis. A eficiência da localização beneficia o acesso a empregos, educação, entretenimento e saúde. Também pode reduzir as emissões de gases de efeito estufa e os poluentes dos transportes e diminuir o custo da prestação de serviços. Estar conectado a uma comunidade mais ampla também facilita o envolvimento humano e a coesão social, dois fatores que comprovadamente fortalecem a resiliência familiar e comunitária em tempos de crise.
Inspirado por essas evidências e por um projeto piloto coordenado pelo WRI Brasil, o governo brasileiro promulgou uma nova lei em 2017, atualizando os padrões do Minha Casa, Minha Vida. A nova política desencoraja a construção de empreendimentos isolados dos centros urbanos. A lei visa promover o desenvolvimento compacto, conectado e coordenado para beneficiar as famílias de baixa renda, ao mesmo tempo em que cuida do meio ambiente e reduz custos.
2. Água e energia
Construções que fazem melhor uso dos recursos consumidos localmente – especialmente energia e água – aumentam a qualidade de vida dos moradores, melhorando a saúde e o bem-estar, ao mesmo tempo que reduzem as contas, que representam um ônus desproporcional para as famílias de baixa renda.
Alguns exemplos são tecnologias de iluminação, ventilação e economia de água. Melhorar o design e a orientação das janelas pode otimizar a iluminação. Isso reduz a necessidade de manter as luzes acesas enquanto maximiza a vista externa e a luz natural, que têm impactos positivos na saúde mental. A ventilação natural através do design pode evitar o calor ou o frio, melhorando o conforto e reduzindo a conta de energia.
Soluções de eficiência no uso de água, como hortas no telhado, podem coletar água, reduzir o escoamento, melhorar a biodiversidade e promover a equidade, porque as comunidades urbanas de baixa renda geralmente não têm acesso a espaços verdes. Essa solução também pode mitigar o efeito de ilha de calor urbana, um fenômeno que torna as cidades mais quentes que as áreas vizinhas. O efeito de ilha de calor é uma causa crescente de morte e doença entre populações vulneráveis.
No México, onde o setor residencial responde por 16% do uso total de energia, o programa ECOCASA está construindo 27 mil casas eficientes e acessíveis. Essas casas consomem pelo menos 20% menos energia que construções convencionais. Buscando acessibilidade e eficiência energética, a ECOCASA exemplifica como os países podem atender à crescente demanda por moradia evitando, a longo prazo, o aprisionamento de infraestrutura dispendiosa e que desperdiça recursos.
Oportunidades
Cada nova unidade habitacional feita sem eficiência na localização e na construção é uma oportunidade perdida. Felizmente, esse é um problema relativamente fácil de corrigir. Como os padrões de construção para programas habitacionais são normalmente definidos pelo governo federal, é possível introduzir um conjunto único de mudanças que terão impacto significativo em todas as cidades de um país.
Duas análises recentes mostram como os programas de habitação de baixa renda na Colômbia e no Brasil podem obter benefícios de eficiência energética e de água por meio de melhores padrões de construção.
Como parte do Building Efficiency Accelerator, a cidade de Bogotá, o Conselho de Construção Verde da Colômbia e outros parceiros produziram um relatório técnico para adaptar o código de construção local para cumprir os novos padrões nacionais de eficiência energética para construções. O relatório constatou que, se as metas nacionais de economia de água e energia fossem implementadas em projetos de habitação de interesse social, reduziria o consumo de energia e água em 17% e 19%, respectivamente, enquanto aumentaria os custos diretos de construção em apenas 0,2%. Essas casas acessíveis e eficientes gerariam um retorno sobre o investimento em apenas 73 dias.
Infelizmente, a habitação está atualmente isenta dos padrões nacionais de eficiência energética da Colômbia para edificações. Bogotá está trabalhando com os legisladores nacionais para mudar a lei e lidar com essa realidade perversa para permitir que as famílias em moradias populares de Bogotá e outras cidades colombianas também se beneficiem das políticas de eficiência.
No Brasil, embora o programa Minha Casa, Minha Vida esteja considerando a eficiência da localização, a eficiência da construção continua sendo uma oportunidade inexplorada. O WRI Brasil publicou um relatório que analisou custos e benefícios da integração de medidas de eficiência em moradias construídas através do programa. Descobrimos que a maioria das medidas de eficiência energética relacionadas aos projetos, como paredes externas de cores claras, são essencialmente de custo zero. Para medidas regionais que exigem fundos adicionais – como a energia solar fotovoltaica no norte do país ou aquecimento solar de água no sul – a análise mostrou períodos de retorno razoáveis de doze anos ou menos.
O Minha Casa, Minha Vida enfrenta um futuro incerto com cortes orçamentários propostos que podem resultar em menos unidades construídas. No entanto, pelo menos 600 mil novas casas ainda estão planejadas para os próximos dois anos, oferecendo uma enorme oportunidade para introduzir medidas de eficiência.
O baixo custo e a eficiência andam de mãos dadas, e os programas habitacionais para a população de baixa renda são um foco de atenção importante para ações de governo. Ao longo de sua vida útil, residências eficientes são mais acessíveis, saudáveis e oferecem melhores oportunidades para os moradores do que as convencionais. Um programa habitacional que não prioriza a eficiência não fica apenas aquém da sua missão e desperdiça dinheiro – é um equívoco.