Em 2019, a Índia ultrapassou a União Europeia (UE) no total anual de emissões de gases de efeito estufa (GEE), tornando-se o terceiro maior emissor, depois da China e dos Estados Unidos. Mas essa estatística conta apenas uma parte da história.

A população da Índia é quase três vezes maior do que a estadunidense – ou seja, tomando por base as emissões por pessoa, a Índia ocupa uma posição muito mais abaixo no ranking dos países emissores. 

Essa é apenas uma das muitas formas de comparar a responsabilidade de um país pelas mudanças climáticas. Existem muitas outras dimensões relacionadas à equidade climática, como a vulnerabilidade ou capacidade de agir de cada país. Em se tratando de emissões, é importante considerar a diferença entre as populações e as contribuições históricas do país, além do total de emissões. É por isso que avaliar as emissões de GEE de um país em relação à sua população – ou medir as emissões per capita – fornece uma perspectiva útil. 

A partir de dados do Climate Watch – uma plataforma online de dados abertos administrada pelo WRI, com visualizações e análises sobre os avanços climáticos dos países –, fizemos uma comparação entre o histórico e o cenário atual das emissões per capita dos países:

Entre os 10 maiores emissores, a Índia tem a menor taxa de emissões per capita

China, Estados Unidos, Índia e União Europeia possuem os totais de emissões mais altos do mundo. No entanto, entre os 10 maiores emissores, EUA e Rússia são os que possuem as emissões per capita mais altas, com 17,6 toneladas de dióxido de carbono equivalente (tCO2e) por pessoa e 13,3 tCO2e/pessoa respectivamente. As emissões per capita da Índia, em paralelo, estão entre as mais baixas, com apenas 2,5 tCO2e/pessoa.

Dos 10 maiores emissores, EUA, Rússia, Japão e União Europeia reduziram suas emissões per capita

 

Quando considerados os 10 maiores emissores de GEE, a União Europeia reduziu suas emissões per capita em 29% desde 1990 e atualmente ocupa a 8ª posição do ranking (7,04 tCO2e/pessoa), abaixo da China (8,6 tCO2e/pessoa) e da Indonésia (7,2 tCO2e/pessoa). Os Estados Unidos (17,6 tCO2e/pessoa) reduziram suas emissões per capita em 19% desde 1990. No entanto, a tendência de redução tanto do total de emissões quanto das emissões per capita é um fenômeno recente na UE e nos EUA.

A Rússia e o Brasil também reduziram suas emissões per capita de GEE, enquanto as do Japão sofreram poucas as alterações – mas nos três países as taxas continuam mais altas do que a média global.

 

As emissões per capita são uma resultante de fatores econômicos e tecnológicos e seu declínio, em geral, é consequência da implementação de tecnologias de baixo carbono ou de uma crise econômica que diminui o consumo de combustíveis fósseis.

No caso de EUA, União Europeia, Japão e outras economias avançadas, a redução das emissões per capita foi possível a partir da implementação de tecnologias como energia solar e eólica e da transição de combustíveis altamente emissores como o carbono para alternativas menos intensivas em carbono, como o gás natural. Já a redução das emissões per capita da Rússia começou com a dissolução da União Soviética e a diminuição da demanda por combustíveis fósseis por conta de uma economia em declínio.

No caso do Brasil, em contraste, a redução foi resultante do aumento da parcela de fontes renováveis na matriz energética do país (principalmente a partir de usinas hidrelétricas e eólicas) e de uma diminuição significativa das taxas de desmatamento, com a implementação de políticas para proteger a Amazônia, um importante sumidouro de carbono.

As emissões per capita têm aumentado em regiões emergentes, mas globalmente estão estáveis

 

Em escala regional, observa-se uma tendência de declínio nas emissões per capita das economias mais industrializadas, como as da América do Norte e da Europa. Essa redução pode ser atribuída a uma maior adoção de fontes renováveis, ao uso de combustíveis menos intensivos em carbono e a melhorias de eficiência energética, entre outros fatores.

Embora as taxas de emissões per capita das economias emergentes sejam mais baixas, elas têm aumentado continuamente – com exceção da África Subsaariana, onde caiu de 2,63 tCO2e/pessoa para 2,17 tCO2e/pessoa entre 1960 e 2019. As principais causas para o aumento das emissões per capita na maioria das economias emergentes são o crescimento econômico e a dependência de combustíveis intensivos em carbono.

A boa notícia é que, globalmente, as emissões per capita não aumentam desde 2010, um indicativo de que, aos poucos, o mundo começa a se afastar de sua trajetória de desenvolvimento anterior, intensiva em carbono.

Os países com as taxas de emissões per capita mais altas são aqueles com altas emissões nos setores de energia e uso solo

 

Entre 1990 e 2019, as taxas de emissões per capita mais altas eram as de países com populações pequenas mas setores intensivos em emissões bem desenvolvidos, com exceção de Estados Unidos, Canadá e Austrália. Se observarmos para além do total, investigando a origem das emissões per capita nesses países, veremos diferenças significativas entre as nações que lideram o ranking. Tomando como base o último ano com dados disponíveis (2019), dividimos os principais emissores per capita de acordo com suas emissões por setor para identificar qual setor ou atividade tem gerado a maior parte das emissões.

 

Em 2019, os países com as taxas mais altas de emissões per capita eram principalmente os com populações relativamente pequenas e indústrias altamente emissoras ou países com emissões mais concentradas em mudanças de uso do solo, como a conversão de terras para agricultura.

Qatar, Bahrein, Kuwait, Turcomenistão e os Emirados Árabes Unidos, por exemplo, têm menos de 10 milhões de habitantes, mas possuem indústrias intensivas em emissões, como a produção de petróleo e gasolina, produtos de petróleo refinado, petroquímicos e fertilizantes. As Ilhas Salomão, Guiana, Suriname e Botsuana, por outro lado, também têm menos de dez milhões de habitantes, mas altos níveis de emissões originadas pelos setores de florestas e uso do solo, a partir de atividades como desmatamento e incêndios florestais.

A Austrália foi o oitavo país em emissões per capita em 2019 e se destaca nesse sentido. Isso se deve principalmente à alta dependência do país em relação ao carvão e aos combustíveis fósseis (os quais representaram 90% do total de consumo de energia do país em 2020), além das altas emissões do setor de transportes e do alto consumo energético (as casas australianas, em geral grandes, possuem uma alta demanda de energia para resfriamento, aquecimento e iluminação).

As taxas de emissões per capita mais baixas são de países em desenvolvimento

 


Os países com as taxas mais baixas de emissões per capita são as nações em desenvolvimento com economias menores e níveis mais baixos de consumo. Quarenta e cinco dos 50 menores emissores são países de renda mais baixa com uma média de emissões per capita equivalente a um quarto da média mundial. Para colocar esse dado em perspectiva: se os 10 maiores e os 10 menores emissores  fossem apenas dois países, as emissões dos 10 maiores seriam 39 vezes mais altas do que a dos 10 menores. 

Notavelmente, as emissões per capita do arquipélago de Fiji são negativas porque os setores de florestas e uso do solo absorvem mais emissões do que todos os demais juntos.  

Historicamente, a União Europeia e os Estados Unidos possuem os acumulados de emissões mais altos

 

Historicamente, os Estados Unidos e a União Europeia são os principais emissores, responsáveis juntos por 37% do acumulado global de emissões. Se considerarmos o histórico de emissões per capita, essa responsabilidade é ainda maior: EUA e UE teriam respectivamente 20 e 11 vezes o histórico de emissões per capita da Índia, por exemplo.

Tendências de emissões e o rumo a seguir

Há uma relação histórica entre renda e emissões. Em geral, à medida que aumentam o crescimento e a industrialização, o mesmo acontece com o consumo e estilos de vida intensivos em energia e, consequentemente, mais alta a taxa de emissões per capita. No entanto, esse padrão vem mudando em muitos países que têm crescido economicamente sem aumentar suas emissões. Com isso, vemos mudanças de paradigma como 90% da geração de eletricidade implementada em 2022 vindo de fontes renováveis.

É fundamental acelerar o processo de desassociar o desenvolvimento econômico das emissões. Países desenvolvidos precisam reduzir suas emissões em um ritmo mais rápido e auxiliar os países em desenvolvimento a evitar uma trajetória de emissões intensivas, fornecendo o apoio financeiro e tecnológico de que precisam para fazer a transição para uma economia de baixa emissão.


Artigo publicado originalmente no Insights