Nota do Editor, 15 de dezembro de 2014: A seção "Finanças" deste post foi atualizada para refletir a informação mais atual.

Um dia após as conversas terminarem formalmente, os delegados selaram o acordo sobre duas das principais tarefas da COP 20:

  • decidiram sobre o projeto de texto que será usado como base para as negociações que antecedem a cúpula de Paris em dezembro de 2015;
  • chegaram a um acordo sobre quais informações os países devem compartilhar na medida em que preparam seus planos de ação climática nacional para o período pós 2020. Os países agora trabalham para descobrir quais metas e ações podem compartilhar até março.

A dinâmica de Lima foi significativa. Em setembro, centenas de milhares de pessoas foram às ruas em todo o mundo para exigir ação. As empresas e os investidores declararam seu compromisso para um mundo de baixo carbono, enquanto as cidades exibiram sua liderança climática no cenário mundial na Cúpula do Clima de Nova York. No mês passado, os Estados Unidos e a China - os dois maiores emissores do mundo - inovaram com um acordo sem precedentes para reduzir emissões. Isso se deu pouco depois de a União Europeia anunciar sua meta de redução de gases de efeito estufa (GEE) para pelo menos 40% abaixo dos níveis de 1990 até 2030. Dezenas de países prometeram um total de US$ 10 bilhões para o Fundo Verde Climático, destinado a auxiliar nações se prepararem para os impactos climáticos e realizarem a transição para uma economia de baixo carbono. Esses desenvolvimentos definem o cenário para importantes resultados dentro e fora das negociações das Nações Unidas em Lima.

Líderes da América Latina (Chile, Colômbia, México) desempenharam um papel particularmente importante, tanto no apoio à presidência peruana quanto por meio de anúncios específicos para tomar mais medidas.

Aqui está um resumo dos acontecimentos mais significativos na COP 20, a 20ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima - CQNUMC: destaques do projeto de texto da negociação; informação e avaliação das ações dos países; finanças; adaptação, perdas e danos; ambição pré 2020; florestas e restauração, cidades.

1. Destaques do projeto de texto da negociação

O desenvolvimento mais inspirador em Lima foi uma manifestação de apoio a um esforço de longo prazo para reduzir as emissões. Mais de 100 países defendem agora uma meta de mitigação de longo prazo. Este seria um forte sinal de que a economia de baixo carbono é inevitável. Cresceu o apoio para estabelecer ciclos regulares de revisão e reforço às ações dos países para reduzir as emissões, adaptação às alterações climáticas e apoiar o crescimento de baixo carbono. Tais ciclos de melhoria são fundamentais para garantir que o Acordo de Paris impulsione a ação climática por décadas.

2. Informação e apuração de contribuições

Em Varsóvia, no ano passado, foi decidido que cada país deve oferecer um INDC - Intended nationally determined contributions of Parties - até março de 2015, se estiverem em posição de fazê-lo. A questão-chave em Lima foi como as propostas de contribuições dos países serão apresentadas e avaliadas antes de Paris. O desfecho adotado é um passo muito importante que obriga os países a fornecer informações significativas quando apresentarem suas propostas de contribuições, como detalhes sobre os setores e gases que são cobertos, além de abordagens metodológicas e de contabilidade. Além disso, os países terão de descrever o quão justas e ambiciosas serão suas ações. O relatório Building Climate Equity, do WRI, fornece uma ferramenta para comparar diferentes formas de definição de equivalência patrimonial. Essa informação permitirá comparações entre as ações e a clareza sobre como os esforços coletivos dos países somam à consecução do objetivo de manter o aumento da temperatura média global abaixo de 2°C. Esse é um dos pontos mais importantes do acordo Lima, já que os países desenvolvem e apresentam suas INDCs em março de 2015. Embora os requisitos não sejam obrigatórios, eles estabelecem as bases para um pós 2020 transparente e ajudarão a exercer pressão dos pares entre os países que preparam suas contribuições nacionais. A decisão de Lima também inclui um mandato para o Secretariado da CQNUMC para publicar uma análise que agrega todas as contribuições - fornecendo uma referência de como se somam, ou não, para a meta de manter o aumento da temperatura média global abaixo de 2°C até 2100.

Infelizmente, o acordo não conseguiu criar um fórum de países para apresentar e discutir suas contribuições. Essa foi uma oportunidade perdida de uma discussão construtiva para fomentar a compreensão e a confiança. O WRI fornecerá uma análise sobre as contribuições dos países. A decisão também poderia ter incluído uma oportunidade para o público comentar sobre as contribuições nacionais, mas a proposta não sobreviveu às negociações. Essas questões poderiam ser incluídas no Acordo de Paris e provavelmente serão um tema-chave para a negociação em 2015. Será fundamental que haja uma fase de avaliação mais robusta para visualizar e aumentar a ambição.

3. Finanças

As conversas de Lima foram estimuladas desde o início por grandes contribuições para o Fundo Verde Climático nas semanas que antecederam a COP 20. Com contribuições adicionais na segunda semana de negociações, o fundo cruzou a marca de US$ 10 bilhões. Este foi um marco importante para demonstrar a confiança dos países doadores do Fundo e construí-la com os países em desenvolvimento que receberão os valores. No total, 27 países prometeram contribuir, incluindo cinco em desenvolvimento: Peru, Colômbia, México, Coreia do Sul e Mongólia. Esses recursos oferecem uma base sólida para o Fundo Verde Climático, que direciona verbas para prioridades urgentes, desde a construção de resiliência climática até ajudar as economias e tecnologias de baixo carbono.

Dentro das negociações, o progresso foi lento sobre a forma de financiar adequadamente a ação climática, mas houve um acordo em torno dos elementos de um texto de negociação que formará a base do acordo do ano que vem em Paris, incluindo a elaboração de um regime pós 2020 sobre as finanças. Embora a Decisão de Lima inste os países desenvolvidos a fornecer suporte, as finanças não foram explicitamente incluídas como uma exigência de INDC dos países. Os negociadores terão, portanto, de encontrar um outro ponto de ancoragem para os compromissos nacionais em matéria de finanças no Acordo de Paris.

A decisão sobre o financiamento climático em longo prazo não elaborou um roteiro sobre como os países desenvolvidos podem cumprir seu compromisso de mobilizar, conjuntamente, US$ 100 bilhões por ano no financiamento climático até 2020. No entanto, a COP pediu que os países desenvolvidos usem suas apresentações bienais sobre a intensificação do financiamento climático para "realçar os elementos quantitativos e qualitativos disponíveis." O trabalho do WRI com a OCDE sobre a estimativa de mobilização de financiamento privado por meio de intervenções públicas pode ser útil para esses requisitos de reporte, além de ajudar a proporcionar mais clareza sobre como a meta dos US$ 100 bilhões será atingida.

Novos progressos no financiamento são necessários para garantir um acordo global em Paris. Embora os elementos básicos de um projeto de texto de negociação estejam em vigor, os negociadores terão de trabalhar duro durante o próximo ano para decidir sobre o que o Acordo de Paris especificará sobre fontes, canais, alocação e níveis de financiamento climático no mundo pós 2020. Os negociadores terão que encontrar um equilíbrio entre o que desejam e o que é viável. A colaboração e o compromisso serão essenciais para mobilizar mais financiamento climático e incitar uma mudança de trilhões de dólares de alto carbono para o crescimento econômico de baixo carbono.

4. Adaptação aos impactos climáticos

A conferência de Lima destaca-se em relação a outras CQNUMC pela especial atenção que prestou à questão da adaptação. Os países em desenvolvimento pressionaram para que a adaptação obtenha receita equivalente à de mitigação no Acordo de Paris. O forte interesse na adaptação em Lima - onde as sessões de negociação foram lotadas - relaciona-se à necessidade urgente de responder aos severos impactos climáticos que os países já enfrentam, desde grandes ondas de calor e inundações recorde para um aumento constante do nível do mar.

Uma decisão árdua em Lima foi a de incluir ou não a adaptação e mitigação nas contribuições nacionais dos países. Alguns países desenvolvidos queriam limitar as contribuições nacionais apenas para mitigação, mas os países em desenvolvimento argumentaram que seus esforços para construir capacidade de resistência aos impactos do clima devem ser reconhecidos. No final, a decisão foi de que a adaptação pode ser incluída, mas as orientações sobre quais informações devem ser fornecidas foram limitadas. Ainda não está claro como essas contribuições poderão ser avaliadas.

No entanto, os negociadores alcançaram clareza em duas áreas: concordaram em melhorar o processo de como o planejamento nacional de adaptação é relatado e firmaram um plano de trabalho para se concentrar nas questões de perda e danos - como lidar com as consequências das alterações climáticas que não podem ser totalmente solucionadas com medidas de adaptação (ou seja, a submersão de ilhas na água do mar, a perda de variedades de culturas em uma região etc.). Ao longo dos próximos dois anos, os países mapearão atividades e necessidades de perdas e danos, desenvolverão ferramentas analíticas e compartilharão as melhores práticas.

Entre agora e a Cúpula de Paris, os negociadores terão como objetivo acelerar os esforços de adaptação e de perdas e danos, determinando como:

  • alcançar um objetivo global de adaptação no Acordo de Paris;
  • estruturar um ciclo de melhoria contínua para a adaptação construída sobre o planejamento e as contribuições nacionais de adaptação;
  • assegurar as bases para enfrentar as perda e danos que ocorrem quando a adaptação e mitigação não conseguem evitar os impactos das mudanças climáticas;
  • garantir que os países em desenvolvimento tenham recursos suficientes para construir capacidade de resistência aos impactos climáticos.

A questão de perdas e danos é fundamental para muitas delegações, e numa intervenção final, Tuvalu defendeu firmemente que a questão seja incluída diretamente no Acordo de Paris.

5. Ambição pré 2020

Além da questão do acordo pós 2020, houve um grande foco em Lima sobre que ações adicionais os países poderiam desempenhar agora para aproveitar as oportunidades para reduzir as emissões ainda mais e mais rapidamente. Uma rodada inteira de negociações foi dedicada ao avanço dessa questão.

Durante o ano passado, uma série de reuniões de peritos técnicos trouxe à luz formas promissoras dos países mudarem para economias de baixo carbono. Em Lima, a CQNUMC estabeleceu um processo para usar o que aprenderam para estimular uma ação climática de curto prazo mais ambiciosa. Os países decidiram continuar compartilhando experiências para reduzir emissões, identificar as melhores opções políticas para alcançar o mais alto potencial de mitigação e realizar novos encontros técnicos de peritos sobre ação até 2020. A Reunião de Alto Nível de Ação Climática em Lima destacou as ações do setor privado, fundos de pensão, as cidades e os povos indígenas e começou a tradição de ter um fórum de alto nível a cada ano. Com este novo fórum, o progresso em campo alimentará as discussões sobre o clima para os próximos anos.

6. Florestas e restauração

No ano passado, o REDD+ obteve tantos progressos - em financiamento, transparência, salvaguardas, monitoramento e verificação - que não havia muito a fazer nesta reunião climática. Um dos poucos temas REDD+ discutidos em Lima foi um melhor esclarecimento das salvaguardas. Em última instância, os países decidiram não elaborar mais sobre este ponto. Enquanto alguns países consideraram a decisão decepcionante, outros interpretaram que isso significa que os países podem decidir por si mesmos como reportar as salvaguardas.

Além disso, o Brasil, seguido por Indonésia, Colômbia, Guiana, Malásia e México, deu o próximo passo de informar os seus níveis de referência para aferir suas emissões de desmatamento, abrindo o caminho para começar a receber pagamentos baseados no desempenho para a conservação e restauração florestal.

Também notáveis foram as inovações exibidas fora da COP oficial, no Global Landscapes Forum. O maior desenvolvimento foi o lançamento da Iniciativa 20x20, uma iniciativa liderada pelos países da América Latina para restaurar 20 milhões de hectares de terras degradadas - uma área maior do que o Uruguai. México, Peru, Guatemala, Colômbia, Equador, Chile, Costa Rica e dois programas regionais anunciaram planos ambiciosos de reflorestamento para capturar carbono, melhorar a biodiversidade, melhorar os meios de subsistência e tornar as terras agrícolas mais produtivas. Cinco empresas de investimento de impacto uniram esforços ao prometer 365 milhões de dólares em atividades para recuperar florestas nubladas, evitar o desmatamento, impulsionar a agricultura sustentável resistente ao clima e muito mais.

Novos avanços em monitoramento de florestas via satélite e mapeamento de carbono foram revelados em Lima, junto a uma nova parceria entre o Global Forest Watch coma Agência Peruana de Supervisão dos Recursos Florestais e Faunísticos (OSINFOR) para compartilhar dados e monitoramento expandido das extensas florestas do Peru.

7. Cidades

Em 8 de dezembro, prefeitos e especialistas encontraram-se na histórica Prefeitura de Lima para compartilhar experiências e fazer a ação climática local avançar. Ao longo do dia, as cidades participantes - incluindo Rio de Janeiro, Tóquio, Paris e Cidade do México, entre outras - destacaram as melhores práticas, prometendo intensificar os esforços para reduzir as emissões e apelando para uma maior ambição em nível internacional.

O resultado mais significativo para as cidades em Lima foi o lançamento do GPC (Protocolo Global de Emissões de GEE de Dimensão Comunitária), desenvolvido em parceria pelo WRI, C40 e ICLEI. O primeiro passo para tomar medidas sobre as emissões de cidades é identificar e medir de onde elas vêm, mas isso se revelou um desafio em decorrência da falta de uma metodologia consistente para medir as emissões de cada cidade. O GPC resolve esse problema, oferecendo o primeiro padrão global de emissões para as cidades acompanharem seus desempenhos de forma consistente e estabelecerem metas viáveis de redução de emissões.

Um acordo climático global

Apesar de ainda restar muito trabalho, a cúpula do clima de Lima leva um acordo climático global para Paris que pode ser formalizado.

Conforme os delegados e as partes interessadas voltam para casa e começam a imaginar um resultado positivo para Paris, nós os incentivamos a analisar bem esta proposta abrangente: Elementos e Ideias para o Acordo de 2015 de Paris. Publicado em Lima pela ACT 2015, um consórcio global de think tanks, o Acordo 2015 sobre a Transformação do Clima (ACT2015) recomenda metas de longo prazo de mitigação e adaptação e ciclos de cinco anos para avaliar as ações dos países. Alimentada por centenas de negociadores, representantes de governos e partes interessadas em todo o mundo, a proposta oferece um caminho realista para garantir um acordo que pode resistir ao tempo e ajudar a fazer a transição para uma baixa emissão de carbono e um futuro resistente ao clima. Acreditamos que este trabalho possa ajudar os negociadores e toda a comunidade internacional a navegar através das várias opções disponíveis no projeto de texto de negociação em curso e a não perder de vista quais funções críticas o acordo de Paris deve cumprir.