Após 4 anos adotando Sistemas Seguros, Buenos Aires reduz em 33% as mortes no trânsito
Buenos Aires tem se destacado entre as cidades latino-americanas na promoção da segurança viária e da mobilidade ativa. Quatro anos após o início da implementação de seu Plano de Segurança Viária, a capital argentina cumpriu a meta de reduzir em 30% as mortes no trânsito. É um exemplo em andamento de uma estratégia de Sistemas Seguros – que parte da premissa de que nenhuma morte no trânsito é aceitável. A cidade agora quer identificar quais ações mais contribuíram para a redução e assim salvar mais vidas.
Foram 103 vidas perdidas no trânsito em 2019. Em relação às 153 mortes de 2015, o ano tomado como base pelo Plano, a redução foi de 33%. Buenos Aires tem desafios pela frente, e ao adotar a estratégia de Sistemas Seguros, reconhece a responsabilidade do governo em proteger seus cidadãos e projetar um sistema viário de tal forma que o erro humano não leve a um resultado grave nem fatal.
Os motociclistas ainda correspondem a 47% dos mortos no trânsito e devem ser um ponto de atenção nos próximos anos, bem como o aprofundamento de medidas para coibir as mortes em acidentes envolvendo veículos pesados. O WRI Brasil vai trabalhar com a cidade nesta e em outras frentes da segurança viária, como parte da Iniciativa Bloomberg para Segurança Global no Trânsito.
Prioridade para salvar pedestres
Cidade qualificou infraestrutura que conecta diferentes opções de transporte (foto: Lucas Desimone/B. Aires Ciudad)
Em 2019, a principal causa de morte de pedestres no trânsito era o atropelamento por ônibus. Ao longo do ano, a cidade intensificou medidas para mudar esse cenário. Reduziu a velocidade máxima dos ônibus para 30 km/h, reuniu-se com mais de 20 operadores de 50 linhas para atividades de conscientização de 1200 motoristas, implantando fiscalização eletrônica de velocidade para o transporte coletivo e melhorias de sinalização, além do aumento dos tempos semafóricos.
Como resultado, a cidade conseguiu zerar as mortes nos pontos em que realizou intervenções. Em 2019, acidentes envolvendo ônibus e pedestres ficaram em quarto lugar entre as causas de morte no trânsito. Embora ainda representem um dos problemas mais críticos, houve uma queda de 38% em relação à média de 2016 a 2018.
Incentivo à mobilidade ativa
O Plano de Segurança Viária lançado em 2016 incorporou os princípios de Sistemas Seguros e Visão Zero: o poder público adotou a premissa de que nenhuma morte no trânsito é aceitável, assume a corresponsabilidade pelas fatalidades e detalha medidas para reduzi-las.
Daí, deve partir para a ação. O plano da capital portenha prioriza a mobilidade ativa, e cumpriu a meta de construir 250 quilômetros de ciclovias e ciclofaixas. A cidade já havia voltado sua atenção para a mobilidade em 2012, quando iniciou um trabalho que identificou problemas como interseções críticas, com travessias de pedestres muito extensas e sinalização deficiente.
Passou a realizar intervenções de Urbanismo Tático, de baixo custo e rápida implementação. Extensões de calçadas feitas com tinta reflexiva tornaram as travessias mais curtas e seguras. Os novos espaços foram equipados com cadeiras, mesas e floreiras, criando zonas de permanência para que os pedestres desfrutem e se apropriem do espaço público. Pesquisas com a população embasaram as intervenções de desenho viário, respeitando as "linhas de desejo" dos pedestres. Intervenções para acalmar o tráfego como chicanas, rótulas e ilhas de refúgio somaram-se às calçadas mais largas e inibiram o excesso de velocidade dos carros.
Partes da região central foram pedestrializadas para estimular a mobilidade ativa (foto: Buenos Aires Ciudad)
A cidade também cumpriu o compromisso firmado de criar cinco áreas de prioridade para pedestres e ciclistas. São áreas com velocidades máximas mais baixas e intervenções para estimular a mobilidade ativa, com nivelação e alargamento de calçadas, melhorias na iluminação e na arborização, instalação de paraciclos, novos canteiros e mobiliário como bancos e luminárias.
Melhores indicadores, intervenções mais assertivas
O trânsito de Buenos Aires tem uma taxa de mortalidade de 3,6 a cada 100 mil habitantes. É baixa em comparação a cidades brasileiras como São Paulo (6,4/100 mil habitantes) e Rio de Janeiro (9,6/100 mil habitantes), mas alta em relação a cidades que são referência em segurança viária, precursoras da adoção de estratégias abrangentes para reduzir mortes no trânsito desde os anos 1990, como Amsterdam (1,34/100 mil habitantes em 2015) e Copenhague (0,9/100 mil habitantes em 2018). Agora, a cidade quer aperfeiçoar sua ação, e o WRI Brasil é um dos parceiros no processo.
Aperfeiçoamento de indicadores do Plano de Segurança Viária: para continuar a reduzir mortes e lesões graves, a cidade busca aperfeiçoar os indicadores de suas ações. Isso ajuda a priorizar medidas com maior potencial de proteger os usuários mais vulneráveis. Os indicadores também terão metas distribuídas ao longo dos quatro anos de horizonte do plano de ação, tornando mais palpáveis e urgentes as ações. A nova fase do plano incluirá uma articulação com o governo nacional na coleta de dados e fiscalização.
Gestão de velocidade: a cidade conta com dados de várias fontes, incluindo seus equipamentos de fiscalização eletrônica e dados de apps como Waze e Google Maps. O WRI Brasil vai auxiliar a cidade na análise dos dados, para determinar em quais avenidas priorizar medidas de redução de velocidade e quais medidas usar – como, por exemplo, fiscalização e restruturação do desenho da rua.
Segurança viária para motos: pessoas em motocicletas foram as que mais morreram no trânsito portenho em 2019: corresponderam a 47% dos acidentes fatais. O WRI Brasil fará uma análise dos dados de que Buenos Aires dispõe sobre acidentes envolvendo motocicletas. De um lado, buscaremos identificar os locais e as circunstâncias dos acidentes para indicar as melhores medidas para esse público específico. De outro, avaliaremos a qualidade dos dados de modo a orientar melhorias nos bancos de informações.
Infraestrutura para bicicletas: depois de construir 250 km de infraestrutura cicloviária permanente, a cidade tem apostado na bicicleta como meio de transporte mais seguro para o retorno à vida urbana pós-pandemia da Covid-19. Novas ciclovias, unidirecionais e largas para acomodar o distanciamento, ocupam uma faixa de rolamento das principais avenidas da cidade, complementando a malha cicloviária abrangente da cidade, que está concentrada em vias locais. O WRI Brasil está dando apoio técnico no projeto dos cruzamentos mais críticos da nova malha cicloviária, buscando promover segurança a todos os usuários por meio do desenho e da infraestrutura.
Referência em Visão Zero para a América Latina
Buenos Aires se encaminha para se tornar a primeira cidade da América Latina a incorporar integralmente a Visão Zero em seu planejamento urbano. É possível identificar ingredientes importantes para esse feito: a liderança de uma agência dentro da prefeitura – o Observatório de Seguridad Vial –, que alinha as atividades relacionadas à segurança viária de todas as secretarias da cidade; um plano de redução de mortes no trânsito com ações e metas claras; comprometimento com a qualidade dos dados, tanto na coleta quanto na análise, para basear a tomada de decisões; robustas ações de mudança na infraestrutura e desenho de ruas e a comunicação de ações para a população. Ações estratégicas como essas indicam sólido comprometimento com a segurança viária e devem ser replicadas por outras cidades, sempre atentas ao próprio contexto.
A capital argentina participa do Desafio Visão Zero junto a outras 23 cidades da América Latina e do Caribe. A iniciativa coordenada pelo WRI Ross Center for Sustainable Cities vai dar suporte e capacitação para que gestores e técnicos comprometidos em implementar planos que abracem os conceitos de Sistema Seguro e Visão Zero.