Pode ser um parklet, uma mini praça, uma pintura no chão para mudar o desenho de uma rua. Cidades em diversas partes do mundo – e, também, aqui no Brasil – estão partindo de intervenções temporárias para catalisar projetos de longo prazo que melhorem a segurança viária e ajudem a criar espaços públicos de qualidade. A técnica, chamada de “urbanismo tático” (do inglês tactical urbanism), promove a reapropriação do espaço urbano por seus principais usuários: as pessoas.

O movimento ganha força em um contexto de crise nas áreas urbanas, no qual os governos enfrentam dificuldades para entregar a uma população crescente serviços urbanos básicos, como habitação e transporte de qualidade. Ao conferir novos sentidos para os lugares a partir de mudanças rápidas, reversíveis e de baixo custo, o urbanismo tático cria cidades mais amigáveis aos moradores e, muitas vezes, motiva as pessoas a repensarem seus hábitos por meio dos diferentes encontros e trocas que esses espaços possibilitam.

Os projetos em geral têm como objetivo a readequação do espaço viário e/ou a valorização dos espaços públicos, mas mudam conforme as necessidades de cada local. Em determinada rua, por exemplo, a principal necessidade pode ser calçadas mais amplas. Em outra área, o ponto crítico pode ser um cruzamento no qual os pedestres necessitam de mais segurança para fazer a travessia.

De forma semelhante, os agentes liderando uma iniciativa de urbanismo tático também variam. Os projetos podem partir do poder público, de organizações da sociedade civil, da iniciativa privada ou da própria população. Independentemente de quem coordena a ação, contudo, estamos falando obrigatoriamente de um processo que deve dialogar com a comunidade afetada pela mudança.

Por que utilizar o urbanismo tático

A abordagem do urbanismo tático pode ser aplicada na fase de avaliação e coleta de dados que irá embasar o desenvolvimento de um projeto, como ferramenta de participação popular em ações lideradas pelo setor público ou, ainda, como forma de expressão cívica no espaço urbano, no caso de iniciativas lideradas por grupos comunitários ou organizações não governamentais.

Também chamada de “urbanismo faça-você-mesmo” e “acupuntura urbana”, a técnica traz benefícios que abrangem ao mesmo tempo as cidades e as pessoas:

  • Inspirar ações e estimular a implementação de novos projetos.
  • Chamar a atenção para lacunas políticas ou de desenho urbano e permitir que as pessoas experimentem fisicamente uma rua diferente.
  • Ampliar a participação social, uma vez que projetos de urbanismo tático possibilitam que as pessoas expressem suas visões e preferências a partir da vivência prática.
  • Aprofundar a compreensão das necessidades locais, seja na escala do bairro, de uma quadra ou apenas de um edifício.
  • Coletar dados a partir da experiência real de uso das vias e espaços públicos.
  • Estimular as pessoas a trabalharem juntas de novas maneiras, fortalecendo laços entre vizinhos, organizações, comércio local e poder público.
  • Testar elementos de um projeto ou plano antes de fazer investimentos políticos ou financeiros em intervenções permanentes.

Onde já deu certo

Nova York, nos Estados Unidos, é uma das referências de implementação bem-sucedida de um projeto de urbanismo tático. A cidade transformou a área da Times Square, aumentando o espaço dedicado aos pedestres.

 

<p>Times Square antes e depois das intervenções (Fotos: NYC DOT/Flickr)</p>
Times Square antes e depois das intervenções (Fotos: NYC DOT/Flickr)

O projeto teve início em 2009, com a instalação de cadeiras de praia durante três dias, formando uma praça efêmera. No ano seguinte, a praça foi remodelada com tintas e materiais temporários, e durante dois anos, até 2012, foram avaliados os impactos e realizados os ajustes para o projeto final, implementado em 2014. Elementos cruciais para o sucesso do projeto foram o trabalho em conjunto com a comunidade, a formação de parcerias e inclusão de diferentes atores, a estratégia de comunicação e a avaliação dos impactos da mudança (tráfego, acidentes, novos negócios).

A transformação não ficou só na Times Square. De 2009 para cá, diversas ruas e avenidas da cidade também foram reformuladas, ganhando novas ciclovias e espaços públicos: Kent Avenue, Madison Square, Sands Street, Herald Square, Queensboro Bridge e 9th Avenue, entre outras.

Felizmente, nem só de exemplos internacionais vive o urbanismo tático. Em solo brasileiro, Fortaleza e São Paulo são duas cidades que já conhecem os benefícios de intervenções desse tipo. Em 2017, os bairros Cidade 2000, na capital cearense, e Santana, na Zona Norte da capital paulista, receberam mudanças para requalificar o espaço das vias e oferecer mais segurança às pessoas.

<p>Pinturas e mobiliário urbano mudaram a Avenida Central da Cidade 2000, em Fortaleza (Foto: Rodrigo Capote/WRI Brasil)</p>
Pinturas e mobiliário urbano mudaram a Avenida Central da Cidade 2000, em Fortaleza (Foto: Rodrigo Capote/WRI Brasil)
<p>Em Santana, Zona Norte de São Paulo, pinturas ajudaram a melhorar a segurança de cruzamentos e vias do bairro (Foto: Victor Moriyama/WRI Brasil)</p>
Em Santana, Zona Norte de São Paulo, pinturas ajudaram a melhorar a segurança de cruzamentos e vias do bairro (Foto: Victor Moriyama/WRI Brasil)

Também em São Paulo, a iniciativa A Batata Precisa de Você promove a ocupação do Largo da Batata de forma ativa e saudável. O movimento é organizado por moradores e frequentadores do largo, com o objetivo de fazer do local o “ambiente de estar e não apenas de passagem”.

Os projetos do Centro Aberto são outro exemplo de urbanismo tático, aproveitando estruturas já existentes através de novos usos e, com isso, conferindo novos sentidos aos lugares.

<p>(Foto: Prefeitura de São Paulo)</p>
(Foto: Prefeitura de São Paulo)

Na Rua Galvão Bueno, a proposta foi transformar um trecho em calçadão, ampliando as calçadas e os espaços de convivência:

<p>(Foto: Prefeitura de São Paulo)</p>
(Foto: Prefeitura de São Paulo)

Esses são apenas alguns exemplos do impacto que intervenções de urbanismo tático podem ter nas cidades e no dia a dia das pessoas. Mais segurança, novos espaços de convívio, novos usos do espaço público – cidades mais vibrantes e humanas.