O que Brasil, China, Indonésia e Guatemala têm em comum?

Florestas. Ou, mais especificamente, grandes remanescentes de paisagens florestais que não são apenas críticos para a manutenção de um ambiente saudável, mas também fornecem inúmeros serviços e produtos ecossistêmicos. A mudança do clima e a crescente pressão causada por atividades humanas estão ameaçando as florestas no mundo, bem como serviços críticos dos quais dependemos – como a garantia da qualidade do ar e da água.

O aumento de iniciativas internacionais e de compromissos de países em prol da restauração florestal junto a iniciativas como Aichi, Desafio de Bonn e Iniciativa 20x20 cria a necessidade de cooperação internacional e troca de conhecimento e experiências sobre o tema da restauração florestal.

E o que poderiam representantes desses quatro países com realidades tão diferentes, com seus conjuntos únicos de desafios e oportunidades, aprender uns com os outros? Muito. E isso ficou claro durante o intercâmbio de aprendizado e experiência na Mata Atlântica Brasileira.

Os benefícios socioeconômicos e ambientais da restauração florestal – como a melhoria do abastecimento de água, a proteção da biodiversidade, o aumento do sequestro de carbono e a geração de postos de trabalho e renda – são necessários nas diferentes partes do planeta. Projetos de restauração florestal, mesmo que realizados em lados opostos do mundo, apresentam desafios, barreiras e elementos de sucesso semelhantes em aspectos de implementação, engajamento das comunidades e produtores, custo, monitoramento, tecnologias adequadas, acesso aos mercados etc. Compartilhar essa infinidade de conhecimento e experiência melhora as iniciativas de restauração e promove a colaboração para cumprimento de metas e compromissos nacionais e globais pela restauração.

Em setembro de 2015, o Ministério do Meio Ambiente, o Imazon, a União Internacional pela Conservação da Natureza (UICN) e o WRI Brasil estabeleceram uma parceria para promover o intercâmbio de profissionais e especialistas de diferentes países a fim de identificar oportunidades de cooperação de curto, médio e longo prazo para compartilhamento de conhecimento e experiência. Entre os dias 17 e 25, especialistas do Brasil, China Indonésia e Guatemala viajaram por quatro estados brasileiros - Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e Espírito Santo – para compartilhar conhecimento e experiências, estabelecer conexões e aprender como a restauração florestal pode ajudar a promover uma economia verde, de baixo carbono e uma sociedade justa e saudável.

Engajando a sociedade e o setor privado

Iniciando pelo Rio de Janeiro, o grupo visitou o programa de restauração mais antigo do Brasil. Criado no final do século XIX pelo então imperador Pedro II para garantir o fornecimento de água para a cidade, a área restaurada tornou-se o Parque Nacional da Tijuca, um dos maiores parques urbanos restaurados no mundo.

Nos dias de hoje, entretanto, o abastecimento de água da capital fluminense é proveniente da Bacia do Guandú, também visitada pelo grupo. Lá, foram recebidos pelo Instituto Terra de Preservação Ambiental (ITPA), organização da sociedade civil que tem como meta restaurar 18 mil hectares de áreas degradadas e criar um corredor de biodiversidade entre várias áreas protegidas.

Viajando pelo Vale da Paraíba, a próxima parada foi o Parque das Neblinas, uma reserva particular localizada no estado de São Paulo, entre os municípios de Bertioga e Mogi das Cruzes. Sob responsabilidade do Instituto Ecofuturo, com apoio do grupo Suzano Papel e Celulose, a meta é restaurar 4,5 mil hectares de Mata Atlântica no local onde antes havia propriedade de produção florestal.

Compartilhando experiências

No meio da viagem, o grupo participou do Seminário Internacional “Ligando Cidades e Bacias para Segurança Hídrica e Economia Verde”, organizado pela Secretaria do Meio Ambiente do estado de São Paulo. O evento reuniu alguns dos principais líderes e especialistas em meio ambiente de agências governamentais, do setor privado, organizações não governamentais e institutos de pesquisa, e teve como principal objetivo o compartilhamento de experiências bem-sucedidas, conhecimento e ferramentas. Foi uma oportunidade para o estabelecimento de novas parcerias e colaborações, com o intuito de aumentar apoios e investimentos em infraestrutura natural para proteger e restaurar bacias hidrográficas que fornecem água a milhões de pessoas.

Reflorestamento com espécies nativas

Depois do evento em São Paulo, o grupo visitou um dos maiores viveiros de produção de mudas de espécies nativas do Brasil, o Bioflora, localizado no município de Itu. Na oportunidade, aprenderam sobre restauração ecológica de áreas de proteção permanente (APP) e sobre reservas florestais dentro de propriedades privadas, como parte da implementação da lei florestal no Brasil. Outros esforços também estão sendo feitos como parte deste projeto, como a caracterização de remanescentes florestais, o reflorestamento com espécies nativas para fins econômicos e a produção de mudas com alta diversidade florística e diversidade genética.

Pagamento por Serviços Ecossistêmicos (PSE)

Em 2015, o programa Conservador das Água de Extrema (MG), o primeiro PSE municipal do Brasil, completou 10 anos. Visitando o programa, o grupo teve contato com a experiência de uma união inédita entre fundos do orçamento municipal e investimento de parceiros da sociedade civil, comitê de bacias e setor privado para restaurar a cobertura florestal para melhorar a segurança hídrica, implementar corredores ecológicos para conservação da biodiversidade e mitigar as mudanças climáticas. A visita também reuniu líderes de cidades próximas que estão interessados em replicar a experiência do projeto de PES de Extrema em outros municípios da Serra da Mantiqueira.

Ecologia na indústria do papel

Na sequência, o grupo voou para o estado do Espírito Santo, onde visitou a Fibria, líder global na produção de papel e celulose. Conheceram experimentos e modelos para demonstrar a viabilidade ecológica e econômica de espécies nativas em consórcio com eucalipto. Esses experimentos resultam de uma parceria entre o Pacto pela Restauração da Mata Atlântica, o Laboratório para Restauração de Florestas e Ecossistemas e o Laboratório de Florestas Tropicais da Universidade de São Paulo, focado em auxiliar produtores rurais no cumprimento da lei florestal brasileira e, ao mesmo tempo, oferecer novas alternativas de ganhos econômicos.

Empregos e a restauração

O intercâmbio foi finalizado com uma apresentação sobre o programa Reflorestar, liderado pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente em Vitória, capital do estado do Espírito Santo. Trabalhando para aumentar a saúde e resiliência das principais bacias hidrográficas que fornecem água para Vitória, o programa tem sido bem-sucedido na geração de postos de trabalho e aumento da renda dos proprietários rurais e suas famílias através do pagamento por serviços ambientais e financiamento da restauração.

Lições aprendidas

Os principais pontos discutidos pelos participantes durante o intercâmbio foram (i) a importância do planejamento e da definição de metas e áreas prioritárias antes do início do projeto; (ii) o engajamento das partes interessadas; (iii) a necessidade de incentivos e políticas públicas; (iv) a redução do custos e incremento dos benefícios; e (v) considerar a restauração como uma alternativa para produção de alimentos.

A importância do intercâmbio sobre restauração

Ao final do intercâmbio, os participantes tiveram a oportunidade de interagir com mais de 100 especialistas de 14 instituições, ativamente engajados com os esforços de restauração no Brasil -  incluindo o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio) e a The Nature Conservancy (TNC). Muitas oportunidades de futuras colaborações foram identificadas durante a visita, incluindo as áreas de infraestrutura natural, sistemas agroflorestais, reflorestamento para fins econômicos, microbiologia do solo, entre outras.

O intercâmbio de 2015 no Brasil é o segundo na série de intercâmbios sobre restauração florestal de cooperação sul-sul; o primeiro aconteceu na China, em 2014, quando 14 especialistas brasileiros visitaram aquele país. Ambas experiências provaram que a colaboração sul-sul é crucial para dar escala à restauração florestal e atingir as ambiciosas metas estabelecidas por compromissos de restauração nacionais e internacionais. Intercâmbios como esses apoiam e inspiram profissionais da restauração. Uma terceira viagem está planejada para a Indonésia em 2016.